PF vê milícia digital bolsonarista reorganizada no Brasil e com ações intensificadas fora do país
Informação é de inquérito do STF que tem Elon Musk e a rede X como investigados; esquema teria permitido uso de perfis extremistas bloqueados
Ricardo Brandt
A Polícia Federal (PF) identificou que bolsonaristas intensificaram o uso da "milícia digital" em outros países, para fugir das ordens da Justiça e difundir falsas notícias (as fake news), e se reorganizaram no Brasil. Aproveitaram brechas nas regras de uso das redes sociais da internet para "ativar" canais de comunicação de influenciadores alvos de medidas judiciais brasileiras. O objetivo seria a busca por audiência e apoio da comunidade internacional extremista de direita, além de burlar decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), de bloqueio de perfis.
A informação da PF é parte do inquérito que investiga Elon Musk, o dono da rede social X (antigo Twitter), por supostos crimes de obstrução de Justiça, embaraço à investigação policial e incitação ao crime. Os bloqueios de perfis foram determinados nos inquéritos sob relatoria do ministro Alexandre de Moraes, do STF, que têm como principal alvo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
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"Nesse momento, vislumbra-se uma reorganização da Milícia Digital dentro dos limites da jurisdição brasileira, com a reativação dos perfis na plataforma X, por meio da disponibilização aos usuários brasileiros de links para acompanharem lives transmitidas fora do país pelos investigados", informa o documento, assinado pelo delegado Fábio Shor, da PF.
X na mira
Nas últimas semanas, Musk passou a atacar, em postagens na internet, as decisões de Moraes que derrubaram perfis do X, ligados a fake news. Além de acusar "censura" por parte do STF, falou em derrubar os bloqueios de perfis ordenados por Moraes. Em documento oficial da defesa do grupo, foi negado qualquer descumprimento de ordem judicial.
Em resposta ao STF, a empresa X e sua representante no Brasil listaram o número de perfis bloqueados e informaram que permanecem bloqueados aqueles que ainda têm ordens restritivas.
O X Brasil listou 161 contas bloqueadas por ordem do STF e 65 perfis alvos de ordens do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de 2019 a 2024. "Como informado anteriormente, assim que recebidas, essas ordens foram imediatamente encaminhadas pelo X Brasil às Operadoras da plataforma, únicas com capacidade de gestão da plataforma, as quais adotaram as medidas."
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A PF registra que "a empresa ressaltou que as operadoras do X relatou que todas as contas permanecem bloqueadas, com exceção das contas e perfis que foram objeto de ordens posteriores de desbloqueio".
Segundo a PF, "ao contrário da resposta encaminhada pela empresa X, identificou várias contas objeto de constrição judicial, que estão ativas no Brasil, permitindo que os usuários brasileiros da plataforma sigam os perfis bloqueados".
"A rede social X, apesar de bloquear as postagens feitas e recebidas pelos investigados em seus canais, ao autorizar a transmissão de conteúdo ao vivo permitiu o uso de sua plataforma", informa a PF.
Relatório de análise policial indica que "desde o dia 8 de abril de 2024", pelo menos seis canais bolsonaristas que tiveram ordem do STF de bloqueio foram usados.
PF listou "os seguintes perfis" que estão bloqueados, mas fizeram transmissões ao vivo:
- @RConstantino
- @realpfigueiredo
- @eustaquiojor
- @marcosdoval
- @allanldsantos
- @tercalivre
Burla
A PF informou que identificou que recurso usado para permitir que "usuários brasileiros da plataforma X possam interagir com pessoas que tiveram seus perfis bloqueados por decisão judicial".
"Apesar de não disponibilizar os tweets publicados, o provedor da rede social X está viabilizando que as referidas contas disponibilizem link para que os usuários da rede social no Brasil acessem o recurso de transmissão ao vivo 'live', para acompanharem o conteúdo publicado pelas pessoas investigadas que tiveram suas contas bloqueadas", registra a PF.
"As postagens realizadas fora do país, incitando seus seguidores e atacando os poderes constituídos (STF, TSE e Senado), demonstram que os investigados nunca cessaram suas condutas criminosas", informa a PF ao STF.
Ao determinar a abertura de inquérito para apurar responsabilidades de Musk e da X, Moraes registrou em seu despacho a existência de "real, evidente e perigosa instrumentalização criminosa dos provedores de redes sociais e de serviços de mensageria privada para a mais ampla prática de atividades criminosas nas redes sociais".
Segundo o ministro, as práticas são "atentatórias ao regime democrático brasileiro" e "poderia configurar responsabilidade civil e administrativas das empresas, além da responsabilidade penal de seus administradores por instigação e participação criminosa nas condutas investigadas".
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