Se negociações não avançarem, tarifa de 50% de Trump contra produtos do Brasil entra em vigor nesta semana
Nova alíquota sobre importações brasileiras foi anunciada em carta do ex-presidente dos EUA a Lula e está prevista para começar a valer em 1º de agosto

Jésus Mosquéra
A crise diplomática e comercial entre Brasil e Estados Unidos deve se intensificar nesta semana. Na próxima sexta-feira (1º), entra em vigor a tarifa de 50% sobre produtos brasileiros anunciada pelo presidente dos EUA, Donald Trump. A medida foi comunicada diretamente ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por meio de uma carta com ataques e referências ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
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O estopim foi em 9 de julho, quando Trump escreveu ao presidente Lula as justificativas para a decisão de sobretaxar em 50% os produtos importados do Brasil. No texto, Trump criticou o julgamento de Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal, classificando-o como “uma vergonha internacional”. O gesto, com fortes implicações políticas e comerciais, surpreendeu o governo brasileiro e elevou a temperatura nas relações bilaterais, mobilizando diferentes setores da diplomacia e da economia em busca de soluções, ainda que paliativas.
Comitiva de senadores
Uma comitiva de senadores brasileiros embarcou na última sexta-feira (25) para os Estados Unidos na tentativa de sensibilizar parlamentares norte-americanos e reforçar a posição do Brasil como parceiro estratégico.
O grupo, presidido por Nelsinho Trad (PSD-MS) espera pelo menos adiar a implementação das tarifas anunciadas por Donald Trump contra produtos brasileiros.
Antes de embarcar, Renan Calheiros (MDB-AL), que integra a missão, afirmou que “é inaceitável que uma disputa política no Brasil seja usada como pretexto para prejudicar a nossa economia”. A comitiva articula, além de reuniões no Congresso dos EUA, encontros com membros do Departamento de Estado.
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Governo federal
O setor diplomático brasileiro intensificou contatos com a embaixada dos EUA e acionou canais multilaterais para alertar sobre os impactos da decisão unilateral anunciada por Trump. O secretário de Assuntos Econômicos e Financeiros do Itamaraty, embaixador Philip Gough, criticou os Estados Unidos pelo uso de tarifas como ferramenta para interferir em assuntos internos de países. O embaixador classificou as tarifas como "arbitrárias". A manifestação foi feita durante reunião do Conselho Geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), em Genebra, na Suíça.
Em paralelo, o Ministério da Fazenda elabora um pacote de medidas voltadas à proteção de setores exportadores e à manutenção da confiança de investidores internacionais. O ministro Fernando Haddad tem conduzido conversas com representantes da indústria e do agronegócio para estruturar incentivos fiscais, linhas de crédito emergenciais e ações de estímulo à diversificação de mercados.
“Nosso papel é garantir que a economia brasileira continue sólida e competitiva, independentemente do cenário externo”, afirmou Haddad, que também articula, junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), mecanismos de compensação a possíveis perdas no curto prazo.
O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Geraldo Alckmin, também entrou em campo para reforçar a mensagem de estabilidade política e econômica do Brasil. Além de entrevistas e declarações públicas, Alckmin tem promovido reuniões com entidades da indústria e do agronegócio para alinhar uma resposta coordenada às barreiras impostas pelos Estados Unidos. Ele tem articulado com lideranças da Confederação Nacional da Indústria (CNI), da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e de outras entidades representativas, com foco na elaboração de um dossiê técnico e institucional a ser entregue a interlocutores americanos.
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“O Brasil é maior que qualquer episódio. Seguimos sendo um parceiro confiável, respeitado e aberto ao diálogo”, afirmou recentemente Alckmin, ressaltando que a prioridade agora é preservar empregos, exportações e a imagem internacional do país.
Setor produtivo
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) está organizando uma missão empresarial aos Estados Unidos para tratar da ameaça de tarifas de 50% sobre produtos brasileiros, que devem entrar em vigor em 1º de agosto. O presidente da CNI, Ricardo Alban, destacou que a mobilização busca sensibilizar empresas brasileiras e norte-americanas sobre os impactos da medida, visando facilitar negociações entre os governos.
Alban afirmou: "Estamos a uma semana da possível entrada das novas tarifas de 50%, a qual eu acredito e espero que não aconteça, ou que seja suspensa. Ou que tenhamos um sucesso do que nós tanto solicitamos, que é a prorrogação mínima de 90 dias."
O agronegócio brasileiro também está em alerta. A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) destacou que, em 2024, o Brasil exportou US$ 12 bilhões em produtos agropecuários para os EUA. Com as novas tarifas, os exportadores temem um aumento de até 50% no preço final dos produtos, o que poderia tirar a competitividade do país no mercado norte-americano.
Posição de Lula
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou, na sexta-feira (25), que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, foi levado a acreditar em uma "mentira" ao afirmar que o ex-presidente Jair Bolsonaro está sendo alvo de perseguição no Brasil. "O Bolsonaro não é um problema meu, é uma questão da Justiça brasileira", afirmou Lula durante um evento em Osasco (SP).
Lula ainda destacou: "Bolsonaro não está sendo perseguido, ele está sendo julgado com o pleno direito de defesa. Ele tentou dar um golpe no país, não queria que eu e o [vice-presidente, Geraldo] Alckmin tomássemos posse, chegando a montar uma equipe para assassinar eu, o Alckmin e o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre Moraes. Isso já foi comprovado por meio de delações dos próprios envolvidos."
Sobre Eduardo Bolsonaro, que teria influenciado Trump a adotar o tarifaço, Lula comparou o deputado federal ao traidor de Tiradentes, Joaquim Silvério dos Reis, no movimento da Inconfidência Mineira. "Esses mesmos cidadãos ou cidadãs que utilizavam camisa da Seleção Brasileira e bandeira nacional, se dizendo patriotas, agora estão agarrados nas botas do presidente dos Estados Unidos, pedindo para fazer intervenção no Brasil", falou.
"Junta a falta de patriotismo com sem-vergonhice, traição. Estão pedindo para o presidente dos Estados Unidos aumentar taxas de coisas que vendemos para eles para eles libertarem o pai. Trocando o Brasil pelo pai. Que patriota é esse? E isso é pior que Silvério dos Reis. Porque Silvério traiu Tiradentes, mas esse cara [Eduardo] tá traindo a nação. Tá traindo o povo brasileiro", acrescentou o presidente.
O que disse Bolsonaro
O ex-presidente Jair Bolsonaro se pronunciou pela primeira vez sobre as tarifas de 50% impostas pelos Estados Unidos às exportações brasileiras e o apoio recebido de Donald Trump. Em nota divulgada nas redes sociais em 10 de julho, Bolsonaro voltou a falar sobre perseguição política no Brasil e pediu às instituições brasileiras que "ajam com urgência". Além disso, demonstrou respeito e admiração ao governo norte-americano. "Peço aos Poderes que ajam com urgência apresentando medidas para resgatar a normalidade institucional. Ainda é possível salvar o Brasil" declarou. "Deixo claro meu respeito e admiração pelo Governo dos Estados Unidos”, declarou.
Flavio Bolsonaro
Em entrevista exclusiva ao SBT nesta sexta-feira (25), o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) disse que o irmão Eduardo "não manipula o Trump". "O papel dele é levar as informações, levar o nosso ponto de vista. O Eduardo Bolsonaro não manipula o Trump. Beira infantilidade imaginar que o deputado pode simplesmente virar para o presidente Trump e falar o que ele tem que fazer ou não. Qualquer pessoa com dois neurônios sabe que isso não acontece", disse.
"O papel dele é levar informação real, levar o nosso ponto de vista, e o Trump forma o seu juízo de valor e toma as medidas que acha que são cabíveis, em defesa dos interesses dos Estados Unidos, ou dos cidadãos americanos", complementou Flávio. Flávio defendeu que os empresários brasileiros pressionem o governo, o STF (Supremo Tribunal Federal) e o Congresso para evitar o tarifaço.
Governadores de oposição
Neste sábado (26), governadores da oposição criticaram o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pela condução das negociações com o presidente norte-americano Donald Trump sobre o tarifaço. O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), fez críticas durante um painel no festival de investimento "Expert XP 2025". Segundo ele, simulações apontam que um aumento de 50% nas tarifas pode ter forte impacto na economia paulista. “A gente pode estar falando de 44 mil a 120 mil empregos a menos. Isso eu estou falando só do cenário de São Paulo.
A gente pode estar falando de uma perda de massa salarial de R$ 3 bilhões a R$ 7 bilhões por ano, então de fato é muito impactante”, afirmou o governador paulista. Sem citar diretamente o presidente Lula, Tarcísio também criticou a atuação do governo federal nas tratativas com Donald Trump. “A pior agressão à soberania é a divisão interna. Então, se a gente não colocar a bola no chão, não agir como adultos e não resolver o problema, quem vai perder é o Brasil”, disse.
A ministra Gleisi Hoffmann rebateu as críticas, dizendo que as falas de Tarcísio são um “oportunismo lamentável”. Segundo a ministra, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), aliado do governador paulista, é quem estaria bloqueando qualquer negociação ao exigir anistia e até o impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) como condição para suspender a “chantagem contra o Brasil”.
Além de Tarcísio, os governadores de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), e do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), também participaram do evento e criticaram o governo federal. “Hoje, temos um governo que demonstra que não sabe onde quer chegar. Sobre uma questão tão importante, que é o tarifaço do Trump, muitas vezes o Brasil se vitimiza demais”, afirmou Caiado.
Judiciário
A Advocacia-Geral da União (AGU) protocolou no dia 19 de julho uma petição no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo investigação sobre possíveis vínculos entre a participação de Eduardo Bolsonaro (PL) no Inquérito que apura a aplicação de tarifas dos Estados Unidos e a utilização de informações privilegiadas no mercado cambial brasileiro. A suspeita surgiu após transações de câmbio significativas antes e depois do anúncio das tarifas, no dia 9 de julho, sugerindo possível uso indevido de informações confidenciais por pessoas ou empresas com acesso antecipado a decisões econômicas relevantes.
A crise é acompanhada com atenção por integrantes da corte. Em carta divulgada em 13 de julho, o presidente STF, ministro Luís Roberto Barroso, afirmou que a tarifa de 50% imposta pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ao Brasil teve como fundamento uma “compreensão imprecisa dos fatos” e que “no Brasil de hoje, não se persegue ninguém”.