Seca no Brasil: 'Cientistas estão surpresos e muito preocupados', diz climatologista Carlos Nobre
Ao SBT News, professor Carlos Nobre afirmou que comunidade científica não esperava um cenário tão severo em 2024
O professor e cientista Carlos Nobre, referência mundial para assuntos climáticos, afirmou nesta quarta-feira (11) ao programa Poder Expresso, do SBT News, que a comunidade científica está “surpresa e muito preocupada” com a seca severa no Brasil e os “extremos climáticos” que o mundo enfrenta em 2024.
“Não é só o Brasil, o mundo inteiro está vivendo seus extremos climáticos, batendo recordes, seja em número de ondas de calor, seja com secas, como essas, chuvas intensas. Isso está acontecendo globalmente e a temperatura nunca chegou nesse nível desde o último período glacial, há 100 mil anos. Todos nós cientistas estamos surpresos e muito preocupados, porque, no começo de 2023, já tínhamos previsto que haveria um ano de El Niño - fenômeno de aquecimento -, o que gera secas na Amazônia, chuvas no sul do Brasil. Só que não esperávamos que chegasse a esse patamar. Hoje tem milhares de cientistas no mundo tentando explicar o que está acontecendo”, alertou ele.
+ Ibama reforça atuação na fronteira com a Bolívia para combater focos de incêndios
Carlos Nobre, que faz parte do grupo que ganhou o Nobel da Paz em 2007, pelo trabalho no Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), ainda comentou sobre as consequências imediatas e a longo prazo das queimadas e da seca severa.
“Os efeitos imediatos já estão sendo vistos. A quebra de safra na Amazônia bateu recorde, também no Cerrado, no Sul. E estamos batendo recorde também de poluição, pela queima de combustíveis fósseis, pela fuligem das queimadas. Isso tem um terrível impacto na saúde de todos, principalmente dos idosos, bebês e pessoas doentes. Talvez precisemos fazer o que fizemos na pandemia, que é usar máscaras de proteção facial. E, se esses extremos climáticos continuarem, aí sim teremos prejuízos gigantescos a longo prazo. Por exemplo: o Brasil é o quarto maior produtor de alimentos e segundo maior exportador de alimentos do mundo. Vamos perder essas colocações, porque esses eventos vão destruir a nossa produção. Além disso, teremos um problema de abastecimento de água, por causa da seca. Vamos ter que encontrar maneiras de armazenar muito mais água”, pontuou o climatologista.
+ Floresta Nacional de Brasília convoca voluntários para restaurar fauna e fona após queimadas
O professor ressaltou que os desafios para reverter esse cenário são grandes e que, mesmo com uma mudança global nas ações ambientais, o dano que está instaurado ainda vai reverberar por bastante tempo.
“O desafio é global e a primeira coisa é reduzir muito rapidamente as emissões. Ainda assim, não tem jeito de mudar o clima de um dia para o outro, então temos que tornar a sociedade brasileira mais resiliente às ondas de calor, às secas , fazer transição para a agropecuária regenerativa, zerar desmatamento e degradação, zerar o fogo. Mas também vamos ter que nos adaptar”, detalhou.
+ Governo federal antecipa Bolsa Família para afetados pela seca no Amazonas
Ainda na entrevista, Carlos Nobre defendeu um marco legal que proíba o uso do fogo na agropecuária brasileira, como já ocorre em outros lugares do mundo.
“Os incêndios não são naturais. Um número muito pequeno desses incêndios tem origem em descargas elétricas. Essa explosão de fogo é crime humano. São humanos pondo a vegetação em chamas e, como está muito seco e muito quente, a quantidade de vegetação que queima é gigantesca. O total de área queimada bate recorde, mas alguém colocou fogo ali. Por isso, o Brasil deveria passar pela criação de um marco legal proibindo o uso do fogo na agricultura e na pecuária. A maioria dos países desenvolvidos não usa mais o fogo”, afirmou ele.