Dino dá até 20h para Câmara esclarecer emendas de comissão que somam R$ 4,2 bilhões
Segundo o ministro, "lamentavelmente" não constam na petição protocolada pela Câmara nesta sexta-feira (27) "informações essenciais"
Guilherme Resck
O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu prazo até as 20h desta sexta-feira (27) para a Câmara dos Deputados responder "objetivamente" a questionamentos sobre as emendas de comissão que somam R$ 4,2 bilhões do Orçamento da União. O pagamento dessas emendas, que não identificam quem são os parlamentares autores, está suspenso por ordem de Dino desde segunda-feira (23).
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No novo despacho, o magistrado afirma que "lamentavelmente" não constam na petição protocolada pela Câmara nesta sexta-feira "informações essenciais" e as solicita em forma de questionário "para facilitar a resposta". Dino quer que a Casa responda às seguintes perguntas:
"1. Quando houve a aprovação das especificações ou indicações das "emendas de comissão" (RP 8) constantes do Ofício nº. 1.4335.458/2024? Todas as 5.449 especificações ou indicações das "emendas de comissão” constantes do Ofício foram aprovadas pelas Comissões? Existem especificações ou indicações de “emendas de comissão” que não foram aprovadas pelas Comissões? Se não foram aprovadas pelas Comissões, quem as aprovou?
2. O que consta na tabela de especificações ou indicações de "emendas de comissão" (RP 8) como "NOVA INDICAÇÃO" foi formulada por quem? Foi aprovada por qual instância? Os Senhores Líderes? O Presidente da Comissão? A Comissão?
3. Qual preceito da Resolução nº. 001/2006, do Congresso Nacional, embasa o referido Ofício nº. 1.4335.458/2024? Como o Ofício nº. 1.4335.458/2024 se compatibiliza com os artigos 43 e 44 da referida Resolução?
4. Há outro ato normativo que legitima o citado Ofício nº. 1.4335.458/2024? Se existir, qual, em qual artigo e quando publicado?"
Ele ressalta que, caso a Câmara deseje manter ou viabilizar os empenhos das emendas de comissão, deverá respondê-las objetivamente até o prazo estabelecido, "bem como juntar as atas comprobatórias da aprovação das indicações (ou especificações) das referidas emendas, caso existam".
Entenda o caso
Na segunda-feira (23), Dino suspendeu pagamento de R$ 4,2 bilhões em emendas de comissão e determinou que a Polícia Federal (PF) instaurasse um inquérito para apurar possíveis irregularidades na liberação dos recursos, entre outras medidas.
A decisão do ministro foi em resposta a um pedido apresentado pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). A sigla denunciou ao Supremo uma manobra irregular na indicação de emendas de comissão pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e por 17 líderes partidários.
Emendas parlamentares são uma parte do Orçamento da União que pode ser destinada por deputados e senadores a projetos nas bases eleitorais. De acordo com decisão do STF, as emendas de comissão deveriam ser distribuídas da seguinte forma:
1º - Uma comissão se reúne na Câmara;
2º - Um dos integrantes do colegiado decide enviar certo valor para uma obra de determinado município;
3º - O colegiado aprova a destinação;
4º - Por fim, a lista com o nome do parlamentar e o destinatário segue para um ministério, que pode barrar ou liberar a verba.
Na contramão da decisão do STF, na semana passada, Lira cancelou as sessões de comissões da Câmara e enviou um documento ao Palácio do Planalto assinado por 17 líderes de partidos pedindo a liberação de R$ 4,2 bilhões, sem informar os autores dos repasses.
Foi apenas depois que o governo federal acatou o ofício enviado por Lira que os deputados fizeram uma força-tarefa para votar pautas como a reforma tributária e o corte de gastos. Com a decisão de Dino na segunda-feira, porém, o dinheiro não deve mais chegar às bases eleitorais dos congressistas.
Nesta sexta-feira, a Câmara protocolou uma petição no STF em que pede "a reconsideração ou revogação de todas as medidas determinadas na decisão de 23 de dezembro". A peça diz que "não procedem os argumentos de que a deliberação das emendas de comissão é oculta ou fantasiosa".
No novo despacho, Dino diz que a Câmara faz o pedido "com base, em síntese, no argumento de que há distinção entre 'indicação' e 'aprovação' de emenda".
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O ministro reforça que não existem no ordenamento jurídico do Brasil "emendas de líderes". "A Constituição Federal trata exclusivamente sobre 'emendas individuais' e 'de bancada', enquanto que as 'emendas de comissão' são reguladas pela Resolução nº. 001/2006, do Congresso Nacional, e, mais recentemente, pela Lei Complementar nº. 210/2024", pontua.
Ainda de acordo com o ministro, não há menção pela Câmara nos autos "a preceito normativo que ampara o inusitado fato de a destinação de recursos por uma Comissão Permanente da Casa não ser aprovada em tal instância".
O ministro salienta que, desde agosto, "seguem-se persistentes tentativas do STF de viabilizar a plena execução orçamentária e financeira, com a 'efetiva entrega de bens e serviços à sociedade', nos termos da Constituição Federal e das leis nacionais".
Porém, acrescenta, "aproxima-se o final do exercício financeiro, sem que a Câmara dos Deputados forneça as informações imprescindíveis, insistindo em interpretações incompatíveis com os princípios constitucionais da transparência e da rastreabilidade". Conforme Dino, esses princípios são "imperativos para a regular aplicação de recursos públicos".