Dino abre inquérito contra Bolsonaro e filhos com base em relatório da CPI da Covid
Ministro do STF afirmou em petição que há indícios de crimes contra a administração pública em contratos, fraudes em licitações e desvio de recursos públicos
Emanuelle Menezes
O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta quarta-feira (17) a abertura de um inquérito contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), seus filhos Carlos, Eduardo e Flávio, além de diversos aliados políticos. A decisão foi tomada após pedido da Polícia Federal, que citou indícios de crimes apontados no relatório final da CPI da Covid, realizada em 2021.
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Dino considerou que há "presença dos requisitos legais necessários para a instauração de Inquérito Policial, a fim de que os fatos tratados nos autos tenham apuração".
Segundo a petição, a investigação parlamentar identificou fraudes em licitações, contratos superfaturados, desvio de recursos públicos e uso de empresas de fachada para serviços fictícios durante a pandemia.
Em quase seis meses de trabalho, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) apurou "as ações e omissões do Governo Federal no enfrentamento da pandemia da covid-19 no Brasil e, em especial, no agravamento da crise sanitária no Amazonas com a ausência de oxigênio para os pacientes internados".
O relatório final listou mais de 20 crimes que teriam ocorrido durante o enfrentamento à pandemia da covid-19 e concluiu que Bolsonaro contribuiu para que o Brasil alcançasse a marca de 700 mil mortos pela doença. O ex-presidente foi acusado de nove crimes:
- epidemia com resultado morte
- infração de medida sanitária preventiva
- charlatanismo
- incitação ao crime
- falsificação de documento particular
- emprego irregular de recursos públicos
- prevaricação
- crime de responsabilidade
- crimes contra a humanidade nas modalidades extermínio, perseguição e outros atos desumanos
A partir de agora, a Polícia Federal terá 60 dias para conduzir diligências, colher depoimentos e reunir provas sobre a atuação dos investigados. A Procuradoria-Geral da República também foi notificada.
Quem são os investigados
Além do ex-presidente Jair Bolsonaro e de seus três filhos mais velhos – o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), o vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ) e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), o inquérito inclui aliados, ex-ministros, parlamentares e empresários. Veja a lista completa:
- Jair Messias Bolsonaro
- Flávio Nantes Bolsonaro
- Eduardo Nantes Bolsonaro
- Carlos Nantes Bolsonaro
- Ricardo José Magalhães Barros
- Osmar Gasparini Terra
- Beatriz Kicis Torrents de Sordi
- Carla Zambelli Salgado
- Onyx Dornelles Lorenzoni
- Carlos Roberto Coelho de Mattos Júnior
- Allan Lopes dos Santos
- Hélcio Bruno de Almeida
- Oswaldo Eustáquio Filho
- Hélio Angotti Neto
- Bernardo Pires Kuster
- Paulo de Oliveira Enéas
- Richards Dyer Pozzer
- Leandro Panazzolo Ruschel
- Carlos Roberto Wizard Martins
- Luciano Hang
- Otávio Oscar Fakhoury
- Filipe Garcia Martins Pereira
- Tércio Arnaud Tomaz
- Ernesto Araújo
Procedimento chegou ao STF em 2021
O pedido de abertura de inquérito feito por Dino foi tomado em um procedimento preliminar que chegou ao STF em novembro de 2021, após o fim da CPI. Ele apurava a suspeita de "incitação ao crime". Jair Bolsonaro e os outros 23 investigados teriam incitado a população a adotar comportamentos inadequados durante a pandemia.
O procedimento passou por três mudanças de relator no Supremo antes de chegar às mãos do ministro Flávio Dino. Inicialmente, em 26 de novembro de 2021, o caso foi distribuído ao ministro Luís Roberto Barroso. Com a posse de Barroso na presidência da Corte, em 28 de setembro de 2023, a relatoria foi automaticamente transferida para a ministra Rosa Weber, já que o regimento interno prevê redistribuição de processos nesses casos.
Dois dias depois, em 30 de setembro, Rosa se aposentou. Flávio Dino tomou posse no STF em 22 de fevereiro de 2024 e herdou os processos de Rosa Weber, passando a relatar o procedimento.
Veja o passo a passo:
- 25/11/2021 – Petição originada a partir do relatório final da CPI da Covid é recebida no STF.
- 26/11/2021 – Procedimento é distribuído ao ministro Luís Roberto Barroso. A partir da distribuição, a Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu que o material produzido pela CPI (cerca de 10 terabytes) fosse remetido à Polícia Federal (PF) para sistematização e para análise se haveria base para uma acusação formal.
- 20/04/2022 – Barroso autoriza remessa à Polícia Federal. Essa decisão permite que a PF acesse integralmente o acervo físico e virtual para investigação preliminar.
- 13/07/2022 – A Polícia Federal solicita mais prazo por dificuldades de acesso e análise do material da CPI; a PGR se manifesta favoravelmente e Barroso concede mais 60 dias.
- 07/11/2022 – A vice-procuradora-geral Lindôra Araújo encaminha pedido ao STF para arquivar a apuração preliminar contra Jair Bolsonaro, alegando ausência de documentos que comprovem partes do relatório da CPI.
- 01/12/2022 – PF informa que ainda não conseguiu acesso integral às mídias da CPI e pede mais prazo. Barroso novamente defere a prorrogação por 60 dias e posterga decisão sobre o pedido de arquivamento da PGR até a chegada do relatório final da PF.
- 04/05/2023 – Barroso autoriza acesso integral ao acervo digital da CPI em despacho, ressaltando a necessidade de preservar cadeia de custódia e contextualizar provas. Também decreta sigilo sobre documentos, petições e atos posteriores à decisão.
- 28/09/2023 – Roberto Barroso assume a presidência do STF e o relator do caso é substituído, conforme art. 38 do Regimento Interno do STF. O processo é redistribuído para a ministra Rosa Weber.
- 30/09/2023 – Rosa Weber se aposenta e o processo fica novamente sem relator.
- 22/02/2024 – Flávio Dino toma posse no STF e herda os processos anteriormente atribuídos a Rosa Weber. A partir dessa data, Dino passa a ser o relator do caso.
- 02/09/2024 – Dino encaminha à PGR e à PF para que se manifestem e apresentem requerimentos que entenderem cabíveis.
- 17/09/2025 – Flávio Dino determina abertura de inquérito, atendendo pedido da Polícia Federal.








