Advogado expõe áudios e prints de conversas com Cid sobre delação
Eduardo Kuntz, advogado de defesa de Marcelo Câmara, ex-assessor de Bolsonaro, pediu anulação da colaboração premiada por "falta de voluntariedade"

Paola Cuenca
O advogado Eduardo Kuntz, responsável pela defesa do ex-assessor de Jair Bolsonaro (PL) e um dos réus da trama golpista, Marcelo Costa Câmara, enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) na noite dessa segunda-feira (16) uma serie de áudios e prints de conversas que teriam sido mantidas com o ex-ajudante de ordens do ex-presidente e delator do caso, tenente-coronel Mauro Cid. Os diálogos, segundo o advogado, comprovam a quebra do princípio de voluntariedade da colaboração premiada.
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As conversas teriam sido iniciadas por Cid no fim de 2023 por meio do perfil @Gabrielar702 no Instagram. Kuntz descreve que o militar enviou, em fevereiro de 2024, uma selfie por conta própria nas mensagens privadas para comprovar a identidade.

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Segundo o advogado, por já conhecer o tenente-coronel, ele deu continuidade à interação porque pensou que poderia se tratar de uma possível contratação de serviços. Porém, nos trechos enviados ao Supremo, as conversas giram em torno de "desabafos".
Mauro Cid reclama sobre a condução dos depoimentos junto à Polícia Federal (PF) e afirma ter suas falas distorcidas.

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"Várias vezes eles queriam colocar palavras na minha boca e eu pedia para trocar. Foram três dias seguidos. Um deles foi naquela grande depoimento sobre as joias. Acho que foram 5 anexos. Eles toda hora queriam jogar para o lado do golpe. E eu falava para trocar, porque não era aquilo que tinha dito", disse o tenente-coronel.
"E eu fui bem claro lá… O PR [Presidente da República] não iria dar golpe nenhum, ele estava mal, ele queria encontrar uma fraude nas urna de forma oficial pelo partido. Muita gente estava tentando ajudar a encontrar uma fraude. Queriam sempre me conduzir a falar a palavra golpe. Tanto que tive o cuidado de não usar essa palavra", continuou.

Nos históricos, Cid também fala sobre o andamento da investigação, que naquele momento era sigilosa. O advogado questiona se o ex-ajudante de ordens havia sido chamado para novos depoimentos pela PF e ele responde: "Só uma vez, para identificar o tal do Saad. Lembra que te falei".
Cid se refere ao advogado Amauri Feres Saad, indiciado pela PF por participação na trama golpista. Para os investigadores, o jurista estaria envolvido na redação da minuta golpista.
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Em outro momento o ex-ajudante de ordens relata o foco dos investigadores sobre um dos depoimentos prestados. "Eles só queriam que eu confirmasse as informações que eles já tinham. Brigadeiro Baptista [Junior, ex-comandante da Aeronáutica] e FG [Freire Gomes, ex-comandante do Exército] foram no detalhe das reuniões. Mas o foco eram os generais BG [Braga Netto], Theo [Theophilo Gaspar] e PS."
Áudios anexados pelo advogado Eduardo Kuntz ao processo mostram Cid lamentando os impactos da investigação em sua vida privada.
"Vê quem se ferrou. Quem perdeu a carreira? Quem teve o pai, a esposa, família toda investigada. General Heleno chegou no topo, reserva. Presidente ganhou milhões em Pix, chegou ao topo, tudo bem, tô no meu barco. Quem que se f*? Quem perdeu tudo? Fui eu. E eu ainda inventei de pegar um advogado por fora. Ah, ainda tô pagando, tô acabando com a vida financeira da família."
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Como investigado, Cid estava proibido de usar as redes sociais. A possível quebra de medida cautelar foi levantada pela primeira vez durante o interrogatório dele no STF no último dia 9. O advogado Celso Vilardi, responsável pela defesa do ex-presidente Bolsonaro, questionou o delator se ele havia utilizado o perfil @Gabrielar702, se comunicado por ele, inclusive relatando aspectos do acordo de colaboração premiada. Cid negou.
Na última sexta (13), o ministro Alexandre de Moraes ordenou à Meta – empresa detentora do Instagram – que fornecesse, em 24 horas, informações de acesso e dados cadastrais da conta @Gabrielar702. Dias antes, reportagens publicadas pela revista Veja acusavam Cid de ter mentido em juízo e traziam parte das conversas agora expostas por Kuntz.
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Entre sábado (14) e segunda (16), as defesas do general Walter Souza Braga Netto e de Bolsonaro solicitaram ao ministro que demandasse à Meta a entrega de informações mais detalhadas sobre o histórico da conta supostamente utilizada por Cid.
Até o momento, a empresa ainda não enviou uma resposta nos autos do processo. Procurada, a Meta afirmou que não irá se pronunciar sobre o assunto.