Vitória nas eleições legislativas dá sobrevida a Milei, mas minoria ainda pode travar medidas econômicas
Presidente argentino fortalece posição política após resultado positivo nas urnas, mas ainda enfrenta desafios para aprovar medidas liberais no Parlamento

Murillo Otavio
O governo de Javier Milei obteve um resultado considerado positivo nas eleições legislativas realizadas no domingo (26). Embora o desempenho represente uma sobrevida política, as medidas econômicas liberais propostas por ele ainda devem enfrentar resistência no Congresso e no Senado.
📋 As eleições renovaram 127 das 257 cadeiras da Câmara dos Deputados e 24 das 72 do Senado. O partido de Milei, A Liberdade Avança, conquistou 64 cadeiras na Câmara e 13 no Senado. Já o Força Pátria, ligado ao peronismo, obteve 31 assentos na Câmara e 6 no Senado. Somados aos partidos aliados, os peronistas alcançam 44 vagas na Câmara e 7 no Senado. Antes da votação, o movimento de oposição detinha a maior minoria nas duas casas, dificultando o avanço das pautas de Milei.
O resultado mostrou que Milei ainda tem força política. O resultado surpreendeu as pesquisas de intenções de votos, que desenhavam um desempenho inferior nas urnas.
Para Leo Braga, professor de Relações Internacionais da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Rio, Milei sai fortalecido do pleito.
"Aumentam as chances de o governo aprovar projetos e seguir com sua linha liberal. Além disso, cresce a confiança do mercado financeiro na eficiência das medidas econômicas", avalia o especialista.
Outro ponto importante foi o desempenho em Buenos Aires. O partido de Milei liderou na maior parte das províncias argentinas, inclusive na capital, onde o governista havia amargurado derrota na última eleição legislativa. Ainda assim, a taxa de participação foi de apenas 67,9% dos eleitores, a menor desde 1983, quando a democracia foi restabelecida na Argentina.
Segundo Maria Laura Tagina, cientista política da Universidade Nacional de San Martín, ouvida pela agência Reuters, o resultado reflete o cansaço da população com os escândalos de corrupção e políticas de austeridade dos governos anteriores.
"Curiosamente, o escândalo envolvendo a irmã do presidente, Karina Milei, não abalou sua base política", lembra o professor Leo Braga, que reforça a ideia de que os argentinos continuam apostando em políticas que rompam governos anteriores.
A imprensa argentina considerou surpreendente o desempenho do partido do presidente. O jornal argentino La Nación classificou o resultado como "impactante", com uma "vitória esmagadora em todo o país".
A vitória de Milei amplia a pressão sobre o peronismo, enfraquecido desde o fracasso do governo de Alberto Fernández (2019–2023) e os escândalos envolvendo Cristina Kirchner, atualmente em prisão domiciliar.
Medidas econômicas
Desde o início do mandato, Milei tem defendido uma agenda liberal baseada na dolarização da economia, no fim do Banco Central e na redução drástica dos gastos públicos.
Embora a inflação tenha recuado, o custo social das medidas é alto: o país enfrenta recessão, desemprego e cortes de subsídios essenciais.
Mesmo com a vitória nas eleições legislativas, o governo de Milei segue sem maioria no Congresso. Milei, que chegou ao poder com um discurso antipolítico, agora precisará negociar com outros partidos para viabilizar sua agenda.
O professor Leo Braga explica que, a partir de 10 de dezembro, a coalizão governista terá uma base suficiente para evitar a derrubada de vetos presidenciais e mais margem para aprovar reformas e cortes de gastos.
Na nova composição, o partido de Milei terá 36% das cadeiras na Câmara. Com o apoio de legendas de centro e centro-direita, pode alcançar 48%, configurando maioria simples em algumas votações. No Senado, o avanço foi de 8% para 26%, enquanto a oposição peronista caiu para 36%.
"Mesmo sem maioria absoluta, Milei pode conquistar maioria simples nas duas casas. O poder de barganha do governo cresceu muito, o que aumenta as chances de aprovação de reformas econômicas", explica Leo Braga.
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Discurso de vitória e apoio dos EUA
Em seu discurso de comemoração, o presidente argentino adotou um tom conciliador e defendeu a formação de parcerias no Congresso.
"Há dezenas de deputados e senadores de outros partidos com quem podemos chegar a acordos básicos", afirmou. "O povo argentino decidiu deixar para trás cem anos de decadência e seguir pelo caminho da liberdade, do progresso e do crescimento. Hoje começa a construção da Argentina grande", completou.
Milei também agradeceu aos ministros Patricia Bullrich (Segurança), Luis Petri (Defesa), Luis Caputo (Economia) e ao chefe da Casa Civil, Guillermo Francos, além de outros integrantes de seu gabinete.
Nos Estados Unidos, o presidente Donald Trump afirmou que Milei contou com "muita ajuda" de Washington para garantir a vitória de seu partido nas eleições.
O apoio incluiu um pacote de resgate de até US$ 40 bilhões para reforçar a economia argentina antes do pleito.
"Ele teve muita ajuda nossa. Eu o apoiei, uma recomendação muito forte", declarou Trump, atribuindo parte do sucesso ao secretário do Tesouro norte-americano, Scott Bessent, responsável por supervisionar a assistência financeira ao governo argentino.
O empréstimo norte-americano será concedido por meio de um swap cambial, um mecanismo de troca temporária de moedas entre países, utilizado para dar maior estabilidade à economia e reforçar as reservas internacionais, recursos mantidos em moeda estrangeira para conter oscilações do dólar e garantir pagamentos internacionais.
A iniciativa integra o plano do governo argentino para conter a inflação e promover um crescimento econômico sustentável. O acordo permitirá ampliar as reservas em dólar sem recorrer a empréstimos tradicionais. Após o prazo determinado, a Argentina devolverá a moeda norte-americana com os ajustes de juros ou câmbio correspondentes.
O anúncio ocorre em meio à forte desvalorização do peso e à fuga de capitais, fatores que agravam a crise econômica enfrentada pelo governo Milei.









