Após decretos de Bolsonaro, liberação de munições pelo Exército cresceu 851%
Foram vendidos 71.665.025 projéteis de 2019 a 2021, entre eles de pistolas, metralhadoras e fuzis
A liberação de munições pelo Exército para colecionadores, atiradores e caçadores, os chamados CACs, cresceu 851% desde a assinatura dos decretos do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que facilitam o acesso a armas de fogo no país. No total, foi registrada a compra de 71.665.025 projéteis, que servem para pistolas, metralhadoras e até fuzis.
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As informações foram obtidas com exclusividade pelo SBT News com dados do Exército, responsável pelo registro de balas no país por meio do Sistema de Controle de Venda e Estoque de Munição (SICOVEM). A reportagem comparou os números disponíveis de 2019 -- quando o governo deu início à política armamentista -- até outubro de 2021.
Só neste ano, houve a liberação de 41.161.895 munições -- 36.835.665 a mais que em 2019, quando foram vendidos 4.326.230 balas, entre maio e dezembro. O aumento foi de cerca de 851%. Com a facilitação do acesso ao armamento, a tendência foi de crescimento e, em 2020, foram adquiridas 26.176.900 munições -- 14. 984.995 a menos do que em 2021.
No mesmo período, como o SBT News mostrou, os decretos presidenciais autorizaram o acesso a ao menos 45 mil armas pesadas que, antes das regras, eram de uso restrito, como pistolas de calibre pesado, fuzis semi-automáticos e rifles de precisão. Só o Exército liberou 6.601 armamentos desse tipo.
Com a maior circulação de armas de fogo e, consequentemente, de projéteis, o gerente do Instituto Sou da Paz, Felippe Angeli, explica que o impacto de uma população mais armada é, principalmente, a violência letal. "Não se trata de opinião, há evidências científicas que demonstram o impacto negativo do aumento das armas e munições, que é, principalmente, a violência letal. Esse número acompanha o crescimento da venda de armas", justificou.
Para Angeli, há ainda o perigo do desvio de armas para o crime, com a falta de controle e fiscalização do Estado. "É preciso deixar muito claro: a arma do crime é a arma legal. Não existe fronteira entre a arma legal ou a arma ilegal. A arma de fogo não é um instrumento artesanal, não dá em árvore, na natureza, precisa de uma indústria", completou.
Política armamentista
Essas mudanças foram inauguradas pelo decreto n° 9.785/2019, que facilitava a concessão de porte de armas no país, inclusive o direito à compra de fuzil. No entanto, Bolsonaro foi aconselhado a revogar a resolução e substituiu o decreto original por outros três. São eles: o 9.845, o 9.846 e o 9.847 - todos reproduziram as novas regras dos calibres e da compra de armas e estão sendo analisados pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
No último 17 de setembro, a Corte retomou o julgamento sobre a constitucionalidade desses decretos presidenciais. Mas o ministro Kassio Nunes Marques, indicado por Bolsonaro, pediu vista -- medida que garante mais tempo para analisar o assunto -- e interrompeu a análise do caso. O placar parcial conta, até o momento, com três votos contrários à facilitação, e não há previsão de data para a retomada.
Ao todo, são 14 ações analisadas pelo Supremo, apresentadas por partidos de oposição ao presidente da República, que abordam mudanças nas normas do governo sobre o tema. Em abril deste ano, a ministra Rosa Weber já havia concedido decisões provisórias sobre trechos de quatro decretos presidenciais.
Para a magistrada, as normas são "incompatíveis" com o sistema de controle de armas regulamentado pelo Estatuto do Desarmamento e ameaçam o dever de promover a segurança pública e o direito à vida. Ela determinou que o assunto fosse enviado ao plenário do STF para confirmar ou rejeitar sua decisão.
O decreto 9.845 trata apenas de posse de arma, ou seja, direito de manter o objeto em casa ou no trabalho; o 9.846, que permite a compra e o registro do armamento para caçadores, atiradores, profissionais e frequentadores de clubes de tiros, os CACs. O texto facilitava o acesso a armas de uso permitido e de uso restrito. Há, ainda, o 9.847, que tratava da aquisição, do registro, do porte e da comercialização de armas de fogo e munições.
A mudança de calibres e de acesso a armas foi inaugurada pelo decreto n° 9.785/2019. Bolsonaro, entretanto, foi aconselhado a revogar a resolução, com receio de perder no Supremo e no Congresso. Mas o presidente substituiu o decreto original por outros três, justamente os que estão sendo questionados no Supremo. São eles os decretos n° 9.845, o n° 9.846 e o n° 9.847 -- todos eles reproduziram as regras dos calibres, simplificados em portarias do Exército.