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Política

Mauro Vieira compara tentativa de golpe na Bolívia a ataques do 8/1 no Brasil: "A democracia venceu"

Chanceler brasileiro discursou na 64ª Reunião Ordinária do Conselho do Mercado Comum, no Paraguai

Imagem da noticia Mauro Vieira compara tentativa de golpe na Bolívia a ataques do 8/1 no Brasil: "A democracia venceu"
Reunião precede a 64ª Cúpula de Chefes de Estado do Mersosul e Estados Associados | Reprodução/X
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Em discurso na 64ª Reunião Ordinária do Conselho do Mercado Comum (CMC), em Assunção, no Paraguai, neste domingo (7), o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, comparou a tentativa de golpe de Estado que aconteceu na Bolívia no mês passado com os ataques às sedes dos Três Poderes, em Brasília, no dia 8 de janeiro de 2023.

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"No Brasil também tivemos de enfrentar, ainda nos primeiros dias deste terceiro mandato do presidente Lula, uma tentativa de reverter, por meio da violência, a vontade soberana do povo, expressa nas urnas. No Brasil, assim como na Bolívia, a democracia venceu — e tenho certeza de que sairá mais forte", afirmou o chanceler brasileiro, após se solidarizar com a ministra das Relações Exteriores boliviana, Celinda Sosa, por causa do episódio na Bolívia.

A reunião em que Mauro Viera discursou precede a 64ª Cúpula de Chefes de Estado do Mersosul e Estados Associados, que ocorrerá em Assunção nesta segunda-feira (8) e contará com a participação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Na terça (9), Lula visitará a Bolívia.

O presidente boliviano, Luis Arce, que resistiu à tentativa de golpe de Estado, enfrenta um país descontente com os rumos da economia. Nas ruas, o que mais se ouve é reclamação sobre a situação econômica.

Ao chegar na Bolívia, na terça, o presidente brasileiro seguirá para uma reunião restrita com o boliviano. Será a primeira visita do petista ao país no terceiro mandato como presidente do Brasil. Já Arce esteve no território brasileiro quatro vezes no ano passado passado.

Relação com outros países

Em seu discurso na reunião do Conselho do Mercado Comum hoje, Mauro Vieira falou também sobre as discussões mantidas com a Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA) e o Japão. "Embora as tratativas estejam em estágios diferentes, vislumbramos o seu potencial, desde que tais parceiros respondam adequadamente às preocupações do Mercosul", pontuou.

Além disso, informou que o Brasil depositou, na semana passada, a carta de ratificação ao Acordo de Livre Comércio entre o Mercosul e o Estado da Palestina. De acordo com Vieira, isso permitirá que o acordo comece a vigorar no início de agosto.

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Outro tema abordado foi a construção, em andamento, do acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia. "Não obstante as eleições realizadas para o parlamento europeu, nosso objetivo de alcançar um acordo ambicioso e equilibrado segue vigente", declarou.

Segundo o chanceler, "foi possível estabelecer uma dinâmica positiva nessa negociação" e chegou-se a entendimentos em temas centrais para o Brasil, como compras governamentais.

"Vemos os próximos meses como grande oportunidade para lograr os avanços necessários para a conclusão de um acordo que buscamos há mais de duas décadas".

Confira a íntegra do discurso:

Senhoras e senhores ministros,

Quero começar transmitindo o meu agradecimento e o de toda a delegação brasileira ao meu amigo Rubén Ramírez e à delegação paraguaia pela acolhida que nos proporcionaram aqui. Gostaria também de destacar o excelente trabalho da presidência paraguaia à frente do MERCOSUL, neste semestre.

Para mim, é uma grande satisfação voltar ao Paraguai, pela quarta vez neste ano. É, aliás, a segunda vez em que nós, os ministros das Relações Exteriores dos Estados Partes do MERCOSUL, nos reunimos aqui, no contexto da presidência pro tempore paraguaia.

Não posso começar esse meu pronunciamento sem me referir, logo de início, à tentativa de golpe de estado ocorrida, há pouco mais de 10 dias, na república da Bolívia. Quero aqui me solidarizar com minha contraparte e amiga Celinda Sosa. No Brasil também tivemos de enfrentar, ainda nos primeiros dias deste terceiro mandato do presidente Lula, uma tentativa de reverter, por meio da violência, a vontade soberana do povo, expressa nas urnas. No Brasil, assim como na Bolívia, a democracia venceu – e tenho certeza de que sairá mais forte.

Caras e caros Ministros,

No último semestre, celebramos os 33 anos do Tratado de Assunção. São mais de três décadas de conquistas, a começar pela multiplicação por dez do comércio entre os Estados Partes; são 33 anos de integração econômica, cooperação política e cultural, e fortalecimento da identidade regional. Alcançamos benefícios palpáveis em áreas que vão da circulação de pessoas à integração fronteiriça; da cooperação judicial e consular ao trabalho e emprego; da seguridade social à educação; do transporte às comunicações, entre muitas outras. Saúdo a presidência paraguaia por ter marcado essa efeméride com seminário de alto nível, em que discutimos não só os êxitos alcançados e os desafios que enfrentamos, como também as perspectivas para o futuro do bloco. Agradeço à presidência paraguaia por ter promovido essa necessária reflexão.

Celebraremos, também, no mês de agosto, já sob a presidência uruguaia, o aniversário de 20 anos do Tribunal Permanente de Revisão do MERCOSUL, que o Brasil tem a honra de presidir neste ano de 2024. O Tribunal tem papel fundamental na garantia do cumprimento das normas estabelecidas em nossos acordos. Por isso, indicamos como árbitra uma brasileira do mais alto nível, que tem trajetória jurídica exemplar e atuou no Supremo Tribunal Federal por mais de dez anos. Transmito minha saudação especial à árbitra brasileira, a Ministra Rosa Weber. Recordo que a Ministra era a presidente da Suprema Corte do Brasil durante os atentados contra a democracia brasileira, no 8 de janeiro de 2023. Sua presidência, neste ano de aniversário do TPR, muito nos honra e demonstra o compromisso do governo brasileiro com o MERCOSUL e sua institucionalidade.

A propósito, quero trazer para este Conselho, de maneira clara, a visão do Brasil sobre a institucionalidade do bloco. Devemos trabalhar de forma constante e construtiva para fortalecer -- e não para diminuir -- as instituições do MERCOSUL, em particular os órgãos que tratam de temas tão importantes, como Instituto de Políticas Públicas em Direitos Humanos, o IPPDH, e o Instituto Social do MERCOSUL.

Quando assinamos, aqui nesta cidade, no ano de 2005, o Protocolo de Assunção sobre o compromisso com a promoção e a proteção dos direitos humanos no MERCOSUL, nos comprometemos a ampliar a cooperação regional nessa área. E, para atingir esse objetivo, criamos o IPPDH, em 2009. Ressalto a importância de ampliarmos as atividades do Instituto e de muni-lo com todos os meios necessários para a contínua promoção dos direitos humanos em nossa região.

O Brasil orgulha-se de ter uma mulher, Andressa Caldas, a presidi-lo. Andressa Caldas conta com formação e experiência reconhecidas na área de direitos humanos e integra, há vários anos, a própria equipe do IPPDH.

O Instituto Social do MERCOSUL, com sede aqui em Assunção, igualmente merece o apoio de todos os Estados Partes. Nossas sociedades enfrentam desafios enormes, como a desigualdade econômica e social, com graves consequências para nossas populações, especialmente as parcelas mais vulneráveis. Por isso, é preciso reforçar o ISM, que oferece um espaço para pensarmos, de forma conjunta, soluções concretas em matéria de política social.

Senhoras e senhores,

Tivemos um semestre com muitos avanços concretos. Destaco a criação do Comitê ad hoc sobre Medidas que Afetam o Comércio Intrazona, bem como do Comitê ad hoc sobre Áreas de Controle Integrado. O primeiro deverá identificar eventuais restrições ao livre fluxo de comércio entre os Estados Partes e propor medidas para superá-las.

Já o comitê encarregado das áreas de controle integrado contribuirá para melhorar a vida dos cidadãos que atravessam nossas fronteiras por terra. Mais uma vez, vemos que o MERCOSUL avança, paralelamente, em duas frentes complementares e indissociáveis, que são o bom fluxo de nosso comércio regional e a mobilidade de nossos cidadãos.

Felicitamos a presidência paraguaia pelos esforços para retomar os trabalhos do Grupo ad hoc de Micro, Pequenas e Médias Empresas, que não se reunia desde 2018. Esperamos que, no semestre que se inicia, seja possível a organização de nova reunião desse grupo.

Importante, também, foi a criação do Grupo ad hoc sobre Propriedade Intelectual, dada a crescente importância desse assunto para a promoção da inovação e do desenvolvimento econômico. Esperamos que seu trabalho possa ser iniciado prontamente.

O Brasil apoia a proposta do Paraguai de criar Subgrupo de Trabalho sobre Comércio e Gênero, a respeito do qual, contudo, ainda não foi possível lograr consenso. Esperamos poder avançar, no segundo semestre, de maneira mais concreta, nesse tema tão caro a nossas democracias, que devem ser cada vez mais inclusivas e igualitárias.

Ao mencionar esse assunto, não posso deixar de registrar que, durante a 13ª Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio, em Abu Dhabi, em fevereiro último, o Brasil aderiu ao Arranjo Global sobre Comércio e Gênero, a convite do Chile. Muito me orgulha ver países da nossa região caminhando na direção da inclusão da mulher empreendedora. Importantes iniciativas nesse sentido têm avançado também no âmbito da ALADI. Esse caminho é indispensável para um comércio internacional mais justo.

Quero mencionar também a realização da 12ª edição do Foro Empresarial do MERCOSUL, no último dia 1º de julho. Esta edição do Foro reuniu, de forma virtual, representantes dos setores privado e público, para tratar de temas como a integração comercial de bens e serviços; economia criativa; manufaturas leves; e logística fluvial. Consideramos muito positiva a participação do setor privado nas discussões de políticas adotadas em nossos países. Esses debates fortalecem, sem dúvida, a integração.

Quero tecer alguns comentários a respeito de outro importante instrumento de nosso bloco: o Fundo de Convergência Estrutural do MERCOSUL - o FOCEM -, que continua a funcionar a pleno vapor para promover a redução das assimetrias entre os Estados Partes do bloco. Em 2023, o Brasil transferiu cerca de 99 milhões de dólares ao fundo e saldou dívida que acumulávamos há muitos anos. Os efeitos positivos que esperamos produzir com esse novo aporte poderão ser sentidos, especialmente, pelas comunidades fronteiriças dos países do nosso bloco.

No intuito de continuar a fortalecer o FOCEM, apresentamos uma candidatura para preencher o cargo de coordenador-executivo da “Unidade Técnica FOCEM”. Consideramos que o senhor Luciano Wexell Severo, do Ministério do Planejamento e Orçamento do Brasil, tem todas as qualidades, e a experiência necessária, para exercer essa função. Esperamos contar com o apoio dos demais sócios para aprovar a sua designação nesta sessão do CMC.

Celebro, a propósito, a assinatura, que realizaremos hoje, dos convênios de complementação financeira e técnica entre o MERCOSUL e o FONPLATA. Quando vigentes, esses convênios permitirão ao Fundo do MERCOSUL receber do Fundo da Bacia do Prata cooperação técnica para o aprimoramento da execução de seus projetos. Além disso, viabilizarão empréstimos do FONPLATA em condições mais favoráveis ao FOCEM.

Caras e caros colegas,

O MERCOSUL, nos seus mais de 30 anos de existência, é, ao mesmo tempo, uma obra consolidada e um projeto inacabado. Algumas poucas pendências, se bem que fundamentais, precisam ser resolvidas. Refiro-me, principalmente, a dois setores que permanecem excluídos da nossa união aduaneira: os setores automotivo e açucareiro. São setores que representam importante parcela do comércio intrabloco e deveriam beneficiar-se de um comércio livre de impostos de importação.

Em relação ao setor automotivo, precisamos harmonizar e aprimorar os avanços que obtivemos em diferentes acordos bilaterais, de modo a integrá-los plenamente à nossa união aduaneira. Esse esforço exigirá um compromisso renovado de todos os Estados Partes, além de um planejamento coordenado para garantir que os benefícios dessa inclusão sejam distribuídos de forma equitativa entre todos os países do bloco.

Já a incorporação do setor açucareiro, que se relaciona diretamente com vários outros setores da indústria alimentícia e energética, poderia fortalecer cadeias de valor. Esse é a verdadeira proteção que podemos dar a nossos produtores.

No que diz respeito à integração regional, o Brasil tem grande satisfação por ter assumido a coordenação das negociações de um acordo comercial entre o MERCOSUL e a República Dominicana, que hoje é a sétima economia da América Latina e do Caribe. Esperamos poder avançar no lançamento das negociações desse acordo ainda durante este semestre. Recordo, ainda, que, em seu discurso de posse, o novo presidente do Panamá, Raúl Mulino, expressou seu desejo de negociar um acordo de livre comércio com o MERCOSUL. Sua presença na Cúpula de Chefe de Estados, amanhã, reforça a mensagem panamenha e representa clara oportunidade para avançarmos em direção a negociações concretas durante a presidência uruguaia.

A atualização e o aprofundamento dos acordos que temos com nossos Estados Associados são compromissos da agenda de relacionamento externo em que também podemos avançar. No caso do Chile, por exemplo, concluímos, recentemente, a negociação sobre o regime de origem do acordo entre o MERCOSUL e aquele país, que permitirá a ampliação das trocas comerciais no setor automotivo. A crescente concorrência com atores externos de peso, como a China, é um importante desafio que será melhor enfrentado por meio de maior integração comercial intrarregional.

No caso da nossa agenda de negociações extrarregionais, mantivemos o dinamismo alcançado no último ano. Esse sucesso é fruto da estratégia acertada de dar prioridade às frentes com resultados possíveis, o que permitiu a conclusão do Acordo MERCOSUL-Singapura em dezembro último.

Congratulo a PPTP pelo êxito no lançamento das negociações de um Acordo de Parceria Econômica Abrangente com os Emirados Árabes Unidos. Vemos grande potencial nas discussões com esse país, que se posiciona como um dos importantes parceiros comerciais e grandes investidores no Brasil e nos países do MERCOSUL. Nossa expectativa é que seja conferida prioridade a essa frente, com vistas à conclusão das tratativas ainda em 2024. Para isso, podem contar com o engajamento do governo brasileiro.

No caso das relações com a União Europeia, constato que, não obstante as eleições realizadas para o parlamento europeu, nosso objetivo de alcançar um acordo ambicioso e equilibrado segue vigente. Foi possível estabelecer uma dinâmica positiva nessa negociação e, inclusive, chegamos a entendimentos em temas centrais para o Brasil, como compras governamentais. Vemos os próximos meses como grande oportunidade para lograr os avanços necessários para a conclusão de um acordo que buscamos há mais de duas décadas.

Registro, ainda, as discussões mantidas com a Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA) e o Japão. Embora as tratativas estejam em estágios diferentes, vislumbramos o seu potencial, desde que tais parceiros respondam adequadamente às preocupações do MERCOSUL.

Finalmente, é com grande alegria que informo termos depositado, no último dia 3 de julho, a ratificação do acordo MERCOSUL-Palestina, o que permitirá que o acordo entre vigência no começo do mês de agosto.

Por fim, gostaria de reafirmar o compromisso do Brasil com um MERCOSUL cada vez mais integrado com nossos irmãos da América do Sul e da América Latina e do Caribe, bem como com importantes parceiros em todo o mundo. Para enfrentar os desafios globais e fortalecer a nossa região, devemos, primeiramente, fortalecer nosso bloco, com instituições robustas, maior integração de nossas cadeias produtivas, mais cooperação e, acima de tudo, com a constante defesa dos nossos princípios fundadores: a paz e a democracia como elementos-chave do processo de integração.

Muito obrigado.

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