Julgamento de Bolsonaro pode redefinir forças da direita e da esquerda nas eleições de 2026
Especialistas avaliam que eventual condenação pode acentuar radicalização, afetar alianças e influenciar o peso de Bolsonaro como cabo eleitoral

Vicklin Moraes
O Supremo Tribunal Federal (STF) encerra na próxima sexta-feira (12) o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e de outros sete réus por tentativa de golpe de Estado. Especialistas avaliam que a decisão será um divisor de águas no cenário político e poderá ditar os rumos das eleições de 2026.
A expectativa majoritária é de condenação, o que tende a ampliar a polarização entre direita e esquerda.
+ Entenda a acusação contra Jair Bolsonaro julgada pelo STF e o que diz a defesa
Bolsonaro e os demais acusados respondem na Ação Penal 2668 por organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe, dano qualificado por violência contra patrimônio público e deterioração de patrimônio tombado.
+ Tudo sobre o julgamento de Bolsonaro e 7 réus por tentativa de golpe de Estado
Risco de radicalização

Segundo o cientista político Paulo Ramirez, professor da ESPM, uma condenação unânime reduziria o espaço para reações mais radicais da direita. No entanto, uma eventual decisão dividida pode inflar discursos extremistas.
"Essa divergência pode favorecer conflitos entre partidos, setores da sociedade e também dentro da imprensa, entre veículos mais hegemônicos e os que rejeitam qualquer punição a Bolsonaro. Além disso, certamente terá reflexos no processo eleitoral do próximo ano, como já se viu no passado com o caso do próprio Lula”, afirmou o cientista político.
Por outro lado, segundo Ramirez, o aumento da radicalização entre esquerda e direita pode aumentar riscos da autonomia do Supremo Tribunal de Federal (STF), mas que não devem ser reforçados por partidos de centro-direita como PSD e MDB
Já para a professora de Ciências Políticas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Mayra Goulart, uma eventual condenação de Bolsonaro pode reforçar a narrativa de vítima do ex-presidente, além de atingir esferas mais moderadas.
"Uma narrativa que associa a figura de Alexandre de Moraes a uma dimensão mais personalista e menos imparcial pode, de fato, atingir bolhas mais moderadas e amplas do que a extrema-direita bolsonarista, que adere mais facilmente ao discurso da vitimização”, afirmou a professora.
+ Julgamento no STF: "Processo viciado", diz Flávio Bolsonaro
Extrema-direita no plano global
No caso de uma eventual condenação de Bolsonaro, há expectativa de que o presidente norte-americano Donald Trump retalie o Brasil com novas sanções econômicas e sociais. Trump já declarou apoio ao ex-presidente e aplicou tarifa de 50% sobre importações brasileiras. Uma das justificativas apontadas pelo republicano para as tarifas foi a chamada "caça às bruxas” contra Bolsonaro.
O presidente americano também revogou vistos de Alexandre de Moraes e de mais sete ministros do STF: Luis Roberto Barroso, o presidente da Corte, Edson Fachin, vice-presidente, Dias Toffoli, Cristiano Zanin, Flavio Dino, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes. Além dos ministros, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, também teve o visto suspenso.
+ Acusação contra Bolsonaro e outros réus não se baseia em 'suposições frágeis', diz PGR | #SBTNews
Para a professora Mayra Goulart, uma eventual movimentação de Trump em defesa de Bolsonaro, embora evidencie a força da extrema-direita no plano global, pode acabar beneficiando candidatos do campo da esquerda.
O professor Paulo Ramirez ressalta que, apesar de retaliações de Trump poderem fortalecer o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, atrasos nas negociações podem ser percebidos pela opinião pública como incapacidade do governo, representando um risco para um presidente que busca a reeleição em 2026.
7 de Setembro como termômetro
As manifestações deste 7 de Setembro, organizadas por aliados de Bolsonaro contra o julgamento, foram vistas como teste da força do bolsonarismo pelos especialistas. Ramirez considera que os atos mediram a mobilização da extrema-direita. Já Goulart ressalta que o impacto foi reduzido pelo desgaste causado pelo vazamento de conversas entre Bolsonaro e o pastor Silas Malafaia.
Direita nas eleições

Para as eleições de 2026, o ex-presidente Jair Bolsonaro não indicou oficialmente nenhum herdeiro político. Segundo os especialistas, a demora na nomeação prejudica a campanha eleitoral da direita e em caso de uma possível condenação limita o poder de Bolsonaro como cabo eleitoral.
Para o professor da ESPM, a direita enfrenta dificuldades em criar um herdeiro político que consiga fazer uma transferência direta de votos do Bolsonaro. Além disso, como o ex-presidente permanece em prisão domiciliar e com uso proibido de redes sociais, uma articulação política para a campanha de 2026 fica limitada.
"O PT se preparou para a condenação de Lula, deixando vídeos previamente gravados com a imagem dele. Foi uma situação muito curiosa, porque, mesmo preso, um ex-presidente conseguiu participar da eleição. Hoje, não vejo o mesmo tipo de organização em relação ao Bolsonaro, como o PT fez ao prever o pior naquele ano de 2018”, afirmou o cientista político.
Para a professora de Ciências Políticas da UFRJ, um outro desafio para a direita nas eleições de 2026 é conseguir uma figura política que consiga atingir camadas mais populares como Bolsonaro.
Caso Bolsonaro seja condenado, Ramirez acredita que uma figura que pode ganhar força como voz e cabeça da direita é o ex-presidente Michel Temer, que defende uma candidatura única neste compo político.
Esquerda nas eleições

Para a esquerda, a condenação de Bolsonaro é o cenário mais favorável, apontam especialistas. Segundo Ramirez, o PT exploraria a associação entre candidatos da direita e o ex-presidente, reforçando o favoritismo de Lula.
+Lula sobre julgamento de Bolsonaro no STF: "Que tenha o direito à presunção de inocência"
"É quase como disputar uma corrida sozinho", classifica o professor. Ainda assim, analistas ponderam que, mesmo fortalecida na disputa presidencial, a esquerda pode ter dificuldades para ampliar sua presença no Congresso.
"Bolsonaro preso representa um prejuízo generalizado para vários setores da direita, tanto os moderados quanto os mais conservadores. Isso não significa, porém, que a esquerda vá ampliar o número de candidatos. Mas, certamente, com Bolsonaro preso, candidaturas mais moderadas de direita tendem a ser favorecidas, em detrimento das mais radicalizadas”, afirmou Ramirez.









