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Com desmatamento zero, controle de emissões por veículos será maior desafio na área ambiental

Se meta de redução for alcançada, 70% das emissões ficarão com o transporte. Mudança depende da troca da frota de ônibus e caminhões e transição em combustíveis

Com desmatamento zero, controle de emissões por veículos será maior desafio na área ambiental
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O transporte de carga é o terceiro maior emissor de gases de efeito estufa no Brasil. O monitoramento mais recente do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG) estima que a área como um todo representa 44% da produção de gases dentro da categoria industrial. Os níveis ficam atrás apenas da agricultura e pecuária e, em termos de poluição, podem alcançar a liderança de piores registros quando houver a redução do desmatamento.

Caso o governo alcance a meta de colocar fim ao desaparecimento de florestas e biomas até 2030, conforme anunciado pelo próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o maior desafio para diminuir a contenção desses gases estará ligado ao transporte, conforme ratificaram especialistas ao SBT News. Apesar dos esforços contra o desmatamento, que acertam em ser prioritários, a atenção também deve estar voltada aos veículos e combustíveis, de acordo com as avaliações.

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A necessidade está associada a um período maior de transição específico da indústria. No caso do transporte, pesa a necessidade de modernização da frota e até adequações em infraestrutura. Atualmente, 12,8% dos caminhões no país têm de 20 anos ou mais - a maior taxa em comparação aos veículos do tipo em circulação ao longo da última década. Os dados, que avaliaram o fechamento do ano de 2023, também mostram um avanço recorde no período para veículos de 16 a 20 anos: são 18%, segundo o monitoramento do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças).

O aumento de idade da frota em circulação está atrelado à prática de caminhoneiros autônomos em tentar prorrogar o uso de veículos pelo maior tempo possível, conforme analisa Felipe Barcellos, pesquisador do Instituto de Energia Meio Ambiente (Iema).

“Não se tem um número ideal de quantos por cento um caminhão tem de vida útil, mas quanto mais o caminhão vai ficando velho, quanto mais tempo ele tem de rodagem, duas coisas acontecem: ele vai ficando menos eficiente e o motor mais desgastado. Então, ele tende a consumir mais combustível por quilômetro e isso, fatalmente, emite mais”, diz.

A idade mais elevada de veículos - de 16 aos mais de 20 anos - alcança 500 mil dos 7,5 milhões de caminhões em circulação no país. Por outro lado, cerca de meio milhão de todos os que estão na rua foram fabricados entre 2010 e 2014. Segundo informações do Inventário Nacional de Emissões do Transporte Rodoviário analisados pelo Iema ao SBT News, os anos de 2022 e 2021 têm o melhor índice de aquisição de veículos novos.

O período corresponde aos dois últimos anos monitorados, e aponta uma média de 125 mil caminhões adquiridos em cada período. Os maiores números também vêm após uma evolução gradual em comparação a anos anteriores. Apesar do ingresso de veículos novos, nem todos os caminhões que foram trocados saíram de circulação. Nomes ligados ao setor destacam que parte dos veículos são revendidos na escala a outros caminhoneiros, o que ainda mantém a elevação na faixa etária da frota.

O Brasil é o 13º país no ranking de mais altas taxas de emissões de carbono, segundo o monitoramento do Global Carbon Project. Das 2,3 bilhões de toneladas de gás carbônico emitidas que foram emitidas pelo país em 2022, 484 milhões de toneladas vieram do transporte, segundo a 11ª edição do relatório do SEEG, divulgado no ano passado.

A análise ainda estima que o Brasil pode reduzir as emissões para 685 milhões de toneladas caso cumpra a promessa de zerar o desmatamento em todos os biomas. Caso a redução seja alcançada e a emissão de transportes siga no mesmo patamar, a área se tornaria responsável por 70% das emissões.

“É fundamental que o país busque alternativas ao uso do diesel de petróleo no transporte de cargas por longas distâncias via caminhões. Além disso, as cidades precisam aproveitar o esforço global pela transição energética para se reestruturarem em torno dos modos ativos e coletivos, menos emissores e, sobretudo, mais democráticos que o uso do carro”, avalia a publicação, que é encabeçada pela organização Observatório do Clima.

Na mesma linha, o gerente de projetos do Instituto de Energia e Meio Ambiente, Ricardo Baitelo, destaca que a importância do combate ao desmatamento deve estar relacionada a outras iniciativas para a transição energética.

“No setor de transportes ainda precisa de um tempo para permitir a eletrificação, que ainda está engatinhando, para ônibus e carros de passeio. E para caminhões, o hidrogênio é uma possibilidade, mas a gente tem que ter esse cuidado com a maneira com que esses combustíveis são usados. A frota que está aí não vai desaparecer da noite para o dia, então a gente tem que fazer um movimento de médio a longo prazo”, afirma o doutor em planejamento energético pela Escola Politécnica da USP.

Com avaliação de que o governo tem criado políticas, mas ainda falta a implementação de um projeto que defina metas e expectativas para se alcançar a descarbonização no país. O ajuste vai para além do transporte, sendo relacionado a fontes de energia. “A gente não cobra que o Brasil deixe de produzir petróleo, mas que mostre um cronograma de descarbonização e descontinuidade de agora até 2050, e esse cronograma não existe”, aponta.

“Quando a gente fala de infraestrutura a gente tá falando de um movimento que leva um certo tempo para mudar. Quando a gente fala de setor elétrico, por exemplo, a construção de uma usina, dependendo do caso, pode levar 3, 5 ou 10 anos. E o contrato dessa usina vai levar no mínimo 15 anos se a gente está falando de uma térmica, gás ou de uma eólica para para hidrelétrica, elas operam nuclear por exemplo, elas operam 40 anos, então é um setor extremamente lento” explica.

Desafio em combustíveis: Foz do Amazonas

Um pedido apresentado pela Petrobras para explorar petróleo na bacia da Foz do Amazonas segue sob análise do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). A intenção é identificar se há óleo na Margem Equatorial, para avanço em extração caso seja confirmado. A solicitação foi inicialmente negada, mas um recurso segue sob avaliação do instituto.

+ Confronto ambiental: exploração em Foz do Amazonas ameaça pesca e indígenas

A situação está sob pressão política, que se intensificou após posicionamentos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e de divisões entre ministérios. A pasta do Meio Ambiente defende que a decisão final é técnica, em concordância com as decisões do Ibama.

Conforme apurou o SBT News, uma das justificativas para a negativa ao primeiro pedido foi o impacto em comunidades indígenas, como ruídos de helicópteros e interferência na caça, que a estatal alega ter solucionado. Outros riscos considerados foram possíveis incidentes com vazamento de petróleo e o tempo que levaria para que a Petrobras conseguisse chegar à região. A Petrobras sustenta ter um plano para conter possíveis riscos.

Para Baitelo, o atual pedido da Petrobras para exploração de Petróleo na Foz do Amazonas apresenta uma contradição aos planos em se avançar na transição energética pela intenção em duas apostas mútuas. “Mais uma vez existe esse sinal do Brasil que está caminhando na contramão, porque a Petrobras, por mais que tenha mudado a sua presidência agora, certamente continua com essa sinalização de aumentar [a busca por combustíveis fósseis] ao invés de reduzir”, considera.

Além de impactos ambientais, o engenheiro elétrico também destaca que o impacto negativo em emissões não é diretamente percebido, pela possível exportação de petróleo, mas que é um tema que demanda atenção: “As emissões que são computadas são as emissões da cadeia brasileira, ou seja, de toda a infraestrutura relacionada, todo o gasto de energia que vai ser empregado para extrair o petróleo. Mas a emissão da queima do combustível, que é a grande maioria - de 80 a 90% - não é computada. Ela é computada no país que adquire e usa esse petróleo. Então existe esse ponto cego que é o Brasil sendo um dos grandes produtores de petróleo, querendo ganhar espaço nessa nesse ranking, mas não sendo responsável por essas emissões”.

Em nota, a Petrobras afirma que as operações da estatal têm apresentado uma diminuição de emissões e intensidades de carbono se comparada a outras empresas do setor. “O petróleo produzido no Brasil tem menor emissão por barril de óleo equivalente produzido do que a média mundial. Adicionalmente, alguns de nossos campos do pré-sal, como Tupi e Búzios, possuem intensidade ainda menor”, afirma trecho de comunicado. “Já reduzimos nossas emissões operacionais absolutas em 41% e metano em 68% desde 2015. Adotamos metas para os próximos anos em relação às emissões de gases de efeito estufa de nossas atividades e a ambição net zero em 2050”, diz outra parte da nota.

A companhia ainda diz que em relação ao pedido na Foz do Amazonas, é necessária uma resposta do Ibama para definir próximas ações e seguir com o processo de licenciamento ambiental. O instituto afirma que o caso ainda está sob análise.

Busca pela redução da frota

No ano passado, o governo federal implementou o programa de renovação da frota, com investimento de R$ 1 bilhão em crédito tributário para veículos de transporte de passageiros e cargas, mas ainda não há uma confirmação de quantos veículos foram substituídos. De acordo com o Ministério de Desenvolvimento em Indústria, o cálculo final está sob análise deve ser concluído até o mês de outubro.

Em agosto de 2023, quando 27% do recurso havia sido utilizado, a estimativa era de que a troca havia possibilitado a modernização de 100 caminhões. A possibilidade de que o programa se torne permanente.

O governo também anunciou, em maio, o investimento de R$ 10,5 bilhões para renovar frotas - tendo foco na compra de ônibus elétricos e trens. O investimento virá pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) Seleções. A estimativa é conseguir dois tipos de financiamento: R$ 4,5 bilhões pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), por recursos do Fundo Clima, e R$ 6 bilhões por meio da Caixa Econômica Federal, com valores baseados no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

As adequações vem um período de déficit em investimentos. Nas estimativas do BNDES, há uma falta de R$ 360 bilhões, conforme aponta Luciana Costa, diretora de infraestrutura, transição energética e mudança climática do banco.

"O Brasil tem um grande déficit de infraestrutura de mobilidade urbana. Nós aqui no BNDES estimamos que esse déficit é de R$ 360 bilhões. Em 2022, foi investido 0,06% do PIB em mobilidade urbana nos modais de média e alta capacidade. Dentro desse número de R$ 360 bilhões, a gente não considera ônibus. A gente só considera metrô, VLT. A gente considera média e alta capacidade", declara.

Desafio do combustível

No caso de caminhões e ônibus, a transição em combustíveis tem como maior desafio a garantia de alternativas que permitam maior poder energético - dada a necessidade de movimentação de carga e o transporte de passageiros. Há também a necessidade de aperfeiçoamento do combustível, para garantir que não haja impactos negativos em relação aos combustíveis, e uma maior produção, conforme elenca o engenheiro elétrico Felipe Barcellos, do Iema.

“A gente tem essa solução do biodiesel, mas que ainda não é tão viável quanto ao etanol hoje para os veículos leves. E aí tem duas coisas também: o poder de produção no Brasil. Se todo mundo fosse usar biodiesel, não teria usina de fabricação de hoje suficiente no Brasil. E também as montadoras, fabricantes desses veículos, dos motores a diesel que dizem como ele é feito hoje, a partir da soja, não é ideal para os motores. Ele vai desgastando o motor, vai criando algumas sujeiras no motor, e isso prejudica”, aponta.

Em outra frente, a situação das rodovias também pode contribuir com uma diminuição no gasto de combustíveis. Pesquisa feita pela Confederação Nacional do Transporte (CNT) de Rodovias em 2023 aponta que caminhões que trafegam em pavimentos inadequados consomem, em média, 5% mais combustível que o habitual - um prejuízo que apresenta mais gastos e aumenta os índices de emissões.

Pela avaliação, menos da metade (43,2%) das rodovias brasileiras estão com uma qualidade ótima ou boa, frente a 56,8% em estado regular, ruim ou péssimo. A estimativa do último ano é de que 3 milhões de toneladas de gases poderiam ter sido mitigadas caso a qualidade fosse superior.

Agenda verde e transporte

O governo estima que parte dos investimentos será atingida quando a agenda verde for concluída no Congresso Nacional. Na lista, estão projetos como o combustível do futuro, mercado de crédito de carbono e eólicas offshore. Há ainda aprovações recentes como o hidrogênio verde e o Programa de Mobilidade Verde e Inovação (Mover).

A aprovação do hidrogênio verde prevê regras para produção e transporte do hidrogênio verde, além de incentivos para estimular a produção dele no país. A alternativa é vista como uma opção de baixa emissão de carbono e alta capacidade energética. No caso do Mover, há o incentivo de R$ 19,3 bilhões para a redução de impostos, com a intenção em estimular soluções tecnológicas sustentáveis. Um dos exemplos são veículos com menos emissão de gases do efeito estufa.

Os demais projetos ainda precisam passar por análise do Senado. No caso do combustível do futuro, se prevê a criação de programas nacionais para o diesel verde, combustível sustentável para aviação e biometano, além de aumentar a mistura de etanol à gasolina e de biodiesel ao diesel - de forma que o uso em veículos tenha aumento gradual. Já o mercado de crédito de carbono define regras para que possa haver a venda de compensação de carbono, de forma a contribuir com a redução de outros países.

A eólica offshore é uma fonte de energia produzida através de parques eólicos, geralmente implementados em áreas banhadas pelo mar. A proposta, que também está no Senado, pode ser votada após o recesso parlamentar - neste mês de agosto. Mas está travada pela inclusão dos chamados “jabutis”, temas que não são diretamente ligados ao texto mas foram incluídos.

A aprovação das propostas é vista pelo governo como um caminho para alcançar novos investimentos, conforme analisa o secretário de Economia Verde, Descarbonização e Bioindústria do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Rodrigo Rollemberg.

“A cada dia que se atrasa na aprovação e regulamentação desses temas, são investimentos que podem estar se deslocando para outros países do mundo. Então é muito importante que o Brasil priorize essa agenda, porque essa é uma agenda capaz de transformar o Brasil no sentido de um novo processo de industrialização, geração de empregos qualificados e remunerados, e que o Brasil dá uma contribuição importante na descarbonização do planeta”, diz.

Rollemberg ainda argumenta que parlamentares devem dar uma atenção maior aos textos, de forma que as propostas possam avançar na Câmara.

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