Supremo se prepara para discutir descriminalização das drogas
Após idas e vindas, julgamento está previsto para 2 de agosto
Após 13 anos de idas e vindas, o Supremo Tribunal Federal (STF) prevê uma nova data para retomar o julgamento de descriminalização das drogas. O tema está previsto para a volta do recesso do Judiciário, e consta, até o momento, na pauta do dia 2 de agosto. A depender do resultado, a política sobre drogas poderá ser alterada, com novas regras para pessoas que forem encontradas em posse de substâncias.
O pedido de análise do tema chegou ao Supremo em 2015, mas passou por uma série de adiamentos até entrar na previsão do mês de agosto. O período de indecisão é considerado um atraso, segundo especialistas consultados pelo SBT News. Da área jurídica, eles destacam que outros países da América Latina, como Argentina, Colômbia e México, já modificaram leis relacionadas ao porte de drogas. E que uma definição a respeito pode contribuir para políticas mais efetivas.
"Esse atraso no julgamento tem problemas no sentido do quanto que ainda a gente segue em uma medida atrasada de criminalizar as pessoas que usam drogas. Tem que abordar essas pessoas em outra esfera, que não a criminal, mas do ponto de vista de saúde pública", declara Andrea Gallassi, professora da Universidade de Brasília.
Gallassi também considera haver urgência para definir a respeito do tema, e defende que o julgamento não seja novamente adiado. Em relação à decisão vir pela Justiça, a pesquisadora considera haver falta de ação por parte do Legislativo para avançar com a política sobre drogas. "O que a gente enfrenta no Brasil é uma omissão do Congresso Nacional em estabelecer uma Lei clara sobre cannabis para fins medicinais e recreativos, e vem a legalização via justiça", avalia a também coordenadora do Centro de Referência sobre Drogas e Vulnerabilidades Associadas da UnB.
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A condução do Congresso também é apontada como uma das questões que seguraram uma decisão anterior do Supremo, na avaliação do advogado Cristiano Avila Maronna, diretor da Plataforma Justa. "Acho que houve uma demora excessiva e deliberada, determinada por razões políticas, inclusive pressão política do Congresso", diz. Maronna lembra que o tema chegou à Corte em 2015 e, de lá para cá, passou por uma série de pedidos de vista - mais tempo para análise -, além da escolha de presidentes do STF em não pautar o tema.
Tramitação no STF
Entre os períodos em que o tema não avançou, há destaque para pedido de vista do ex-ministro Teori Zavascki, que ficou com o processo no gabinete entre 2015 e 2017, e o transferiu para o ministro Alexandre de Moraes, nomeado ao cargo após a morte de Zavascki, em um acidente aéreo. Moraes retornou ao processo em 2018. Ele foi pautado em 2019, mas acabou sendo adiado novamente até este ano. Desde o início da tramitação, três ministros apresentaram voto:
- Gilmar Mendes: relator da ação, o ministro considerou o artigo 28 da Lei de drogas inconstitucional, e votou para que o porte deixe de ser crime, mas passe para um ilícito administrativo.
- Edson Fachin: acompanhou o voto do relator, Gilmar Mendes, com a consideração de que a mudança deve ser limitada para a maconha.
- Luís Roberto Barroso: também restringiu para que a mudança seja apenas em relação a maconha, e sugeriu a fixação do critério do peso. Para o magistrado, seria considerado consumo próprio se encontrado até 25 gramas de maconha, e até seis plantas em natura.
"Em todos os votos aqui proferidos, os ministros reconhecem que Lei de drogas não traz critérios para diferenciar o uso e tráfico. O Gilmar Mendes reconhece que a maior parte das pessoas flagradas com drogas foram processadas por tráfico. Barroso reconhece o racismo institucional, na diferença em considerar negros traficantes e brancos usuários", completa Maronna. O advogado também destaca que, em 2015, havia a indicação de maioria no Supremo a favor da descriminalização, mas com as mudanças na Corte, a expectativa de resultado depende do avanço do julgamento.
Outros critérios
Os especialistas destacam que, além da análise da constitucionalidade, é necessário que os magistrados aperfeiçoem os critérios entre uso e tráfico. "O Supremo deve fixar parâmetro que deve ser seguido por todo judiciário brasileiro, determinando que só pode haver acusação por tráfico de drogas quando houver de fato prova o intuito mercantil, não valendo para isso testemunho policial ou inferências que não têm consistência probatória", avalia Maronna.
Gallassi considera que a consideração do STF pode estabelecer critérios objetivos para que não fique sob julgamento do operador. "É muito bem-vindo que se estabeleça quantidades objetivas para que não caia no julgamento do policial que aborda uma pessoa. Os critérios têm objetivo de tirar do momento da abordagem elementos de confusão ou tendenciosos de local onde a pessoa é abordada, ou a cor da pessoa", conclui.