Relação com Tarcísio, MTST e Cracolândia: confira íntegra da entrevista de Boulos ao SBT News
Pré-candidato à Prefeitura de São Paulo pelo PSOL falou sobre propostas para a maior cidade do Brasil
O deputado federal e pré-candidato à Prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos (PSOL), apresentou suas propostas para a maior cidade do país em entrevista exclusiva exibida pelo SBT News nesta quarta-feira (13). Ele afirmou que, se eleito, quer se reunir com o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e com o presidente Lula (PT) ainda no primeiro mês de mandato. O psolista também fez uma defesa das ocupações realizadas pelo MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto), onde atuou por 20 anos, e falou sobre os desafios com a Cracolândia, que, segundo ele, devem aliar ações de segurança pública e políticas sociais como saúde, emprego e moradia.
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Veja a íntegra da entrevista de Guilherme Boulos ao SBT News:
Simone Queiroz: Estamos iniciando hoje uma rodada de entrevistas com os pré-candidatos à Prefeitura de São Paulo, começando com o deputado federal Guilherme Boulos, do PSOL. Deputado, muito obrigada pela oportunidade da entrevista.
Guilherme Boulos: Obrigada, Simone. Eu que agradeço a você e a todos no SBT News.
Simone: Eu queria começar pedindo para o senhor se apresentar.
Boulos: Antes de tudo, eu tenho 41 anos completos, sou pai da Sofia e da Laura, duas filhotas, casado com a Natalia. Moro no Campo Limpo, na zona sul de São Paulo. Tive a oportunidade de me formar, na USP, em Filosofia. Depois da minha formação, trabalhei como professor em escola estadual, depois dei aula em institutos, universidades. Até me tornar deputado, estava dando aula na PUC de São Paulo, na pós-graduação. Pude estender também a minha formação acadêmica com uma especialização em Psicanálise e o meu mestrado eu fiz em Psiquiatria, na Faculdade de Medicina da USP. Essa é a minha formação.
Atuei desde os 22 anos de idade na sala de aula, como professor, em várias instituições e tenho uma atuação de mais de 20 anos no movimento de luta por moradia, que é o que me trouxe para a vida política, para a disputa eleitoral. Mas comecei isso muito na atuação social, no movimento sem teto, ao lado das pessoas que estavam em área de risco, que moravam em favela, em situação de rua, nas situações mais precárias, lutando para que tivessem moradia e dignidade. Para mim, foi um grande aprendizado de vida, e política para mim é isso. Embora, hoje, eu não esteja no movimento, a política segue sendo pra mim a principal ferramenta para poder melhorar e mudar a vida das pessoas, e faço isso hoje como parlamentar. Tive a honra de ser o deputado mais votado do estado de São Paulo, no meu primeiro ano de mandato já consegui ter uma atuação efetiva, aprovar três projetos de lei. E, agora, enfrentando esse desafio de pré-candidato à Prefeitura de São Paulo.
Simone: Vamos falar de propostas. O transporte público é um gargalo na cidade de São Paulo, seja impedindo o avanço do desenvolvimento econômico, tornando tudo mais caro e também dificultando o deslocamento do trabalhador, da pessoa que quer ir para o lazer. Nos seus planos para o transporte público de São Paulo, o que o senhor vai privilegiar?
Boulos: Se você pensar, as grandes conquistas do transporte público em São Paulo foram feitas por governos de esquerda, foram feitos pelos governos do PT, do nosso campo político. No governo da Marta [Suplicy], foi feito o Bilhete Único, foi o início dos corredores de ônibus. Depois, no governo do Fernando Haddad, fez a maior extensão de corredores de ônibus e faixas exclusivas.
Essa é uma área fundamental, porque, para estimular o uso de transporte público, a gente tem que tocar em dois pontos-chave: primeiro reduzir a superlotação, esse é um problema de quem sai das periferias da cidade, fica uma hora e meia dentro de um ônibus lotado para poder chegar no trabalho e depois faz essa mesma maratona pra voltar pra casa no fim da tarde. Estamos falando de qualidade de vida das pessoas, então reduzir a superlotação é essencial. E para isso, tem que ter coragem de comprar briga quando as empresas de ônibus tiram frota. Sabe por que o ônibus muitas vezes é superlotado? Porque aquela linha que deveria passar de 15 em 15 minutos, a empresa passa de 30 em 30, ela é remunerada no subsídio da Prefeitura pelo número de passageiros que carrega, então ela economiza no ônibus, economiza funcionários, economiza em diesel, e quem paga é o povo com superlotação. Vamos ficar em cima, fiscalizar e cobrar com GPS nos ônibus, que já é previsto no contrato de licitação, para que a Prefeitura monitore e todas as viagens previstas sejam feitas, para que não tenha superlotação.
O segundo ponto é aumentar a velocidade. Como é que se aumenta a velocidade dos ônibus? Com mais corredores e faixas exclusivas. Isso vai ser ampliado. A gestão atual foi algo vergonhoso nessa área. O Plano de Metas para essa gestão era fazer 40 km de corredores de ônibus, eles fizeram 4, Simone, 10%. Precisamos atuar pesado para melhorar o transporte público nessa área.
E por fim, a tarifa zero que você mencionou, vamos combinar que muito antes de o prefeito querer adotá-la aos domingos, ela foi uma bandeira nossa. Eu, quando candidato a prefeito em 2020, defendia a tarifa zero. A primeira vez que ela foi discutida e chegou a ir à Câmara Municipal para ser implementada em São Paulo foi no governo da Luiza Erundina, do meu partido, que foi minha candidata a vice na última eleição. Essa é uma bandeira historicamente do nosso campo.
Simone: E quem tirou do plano foi ele.
Boulos: O prefeito dizia, inclusive, quando era vice do Bruno Covas, que era impossível. É isso que eles diziam, que eu era utópico. Como ele tá chegando ao fim do mandato, não tem uma marca, não tem um resultado depois de três anos como prefeito de São Paulo. Qual é o legado dele? É ter dobrado a população em situação de rua, é ter espalhado a Cracolândia pelo Centro, gerando insegurança numa política profundamente equivocada, é ter aumentado as filas da Saúde em 50%. Ele tentou tirar da cartola isso [a tarifa zero]. Nós defendemos a tarifa zero.
Simone: O senhor vai manter a tarifa zero?
Boulos: Não só... nós queremos ampliar a tarifa zero, não apenas nos domingos. Agora, não pode ser tarifa zero com ônibus zero, que é o que tá acontecendo hoje. É tarifa zero, mas reduz a frota e as pessoas têm que ficar esperando um tempão no ponto.
Simone: Mas o senhor vai conseguir implementar todas as melhorias que acabou de listar como necessárias sem cobrar a passagem?
Boulos: Veja, a tarifa zero geral é um ponto de chegada, ela não é um ponto de partida. Não dá para você implementá-la hoje, amanhã. Você precisa ter planejamento, primeiro integrando com o metrô, porque o metrô leva mais de 4 milhões de passageiros por dia. Se você tem tarifa zero no ônibus e não tem no metrô, resultado: vai ter migração de passageiros do metrô pro ônibus e você superlota e colapsa o sistema.
Tem que ter integração, tem que ter planejamento para absorver o aumento da demanda no sistema com tarifa zero e tem que ter uma solução para o problema de custo. E essa solução é a eletrificação da frota. Hoje, o ônibus elétrico a bateria, que já é implementado em 98% da frota de Xangai, na China, é duas a três vezes mais barato o custo de rodagem do que o ônibus a diesel.
Simone: Mas tem que ter investimento.
Boulos: Tem que ter o investimento inicial para comprar, porque a bateria ainda é uma tecnologia cara, a bateria de lítio do ônibus elétrico. Por isso fui para o BNDES, com o presidente Aloizio Mercadante, levei as empresas concessionárias de São Paulo para discutir um fomento inicial para as empresas, uma linha de crédito para compra de ônibus elétrico para São Paulo e para outras grandes cidades do Brasil. Porque aí é um ganha-ganha, você consegue ter um barateamento que facilita a redução gradual de tarifa e eventualmente, ao fim, a tarifa zero. E tem o ganho ambiental de reduzir as emissões de carbono e poluição.
Simone: Vamos falar de saúde agora. Nos últimos três anos, tivemos um aumento significativo de reclamações sobre dificuldade de marcação de consulta, de exames, demora. Tem um problema crônico e crescente na questão da saúde na cidade de São Paulo. Qual é o seu plano para resolver essa demanda tão importante da população paulistana?
Boulos: Primeiro, é triste de ver. Eu estava em Perus outro dia, na zona noroeste, conversando com um grupo de moradores. E aí uma senhora levantou a mão, a gente estava falando dos problemas do bairro, soluções, ela falou: "olha, meu filho é autista e eu fui aqui, fui no posto, fui no Caps, fui na UPA, não consegui tratamento para o meu filho. Eu fui conseguir tratamento e acompanhamento para o meu filho em Cajamar". Cajamar, que é uma cidade vizinha ali na zona noroeste, da região metropolitana, muito mais pobre que São Paulo, com muito menos estrutura que São Paulo. Ou seja, você ouve, você vai para algumas regiões da cidade e gente que precisa de medicamento regular, medicamento para pressão, para colesterol, de uso contínuo, às vezes medicamento de alta complexidade, de alto custo. Você vai no posto de saúde E, às vezes não tem dipirona
Simone: Mas isso é repasse do estado, que vem também do governo federal. Boulos: Não, é compra do município. Remédio é compra do município. E você não tem o básico. Estamos falando da cidade mais rica da América Latina, não ter remédio no posto...
Simone: E como é que resolve? Boulos: Primeiro o tema da fila. Hoje aumentou em 50% a fila de espera para exames: estamos chegando a 500 mil pessoas na fila de espera, além da fila de cirurgia. Nós temos que digitalizar e modernizar o conjunto do processo. Então, por exemplo, para agendamento de consulta, e isso reduz inclusive o esforço das pessoas e a fila no equipamento do posto de saúde, você não precisa ir para o posto de saúde para agendar consulta. Hoje, você poderia agendar consulta por celular com o aplicativo do SUS na cidade. Então se implementar esses mecanismos de inovação e digitalização, você ir acompanhando a sua fila.
Estou me reunindo com uma série de especialistas da área, ex-secretários de saúde do município, Gonzalo Vecina, dentre outros. Temos feito reuniões regulares para pensar um conjunto de medidas pra redução das filas, tanto para exame, quanto para procedimento na cidade de São Paulo. Além, lógico, do atendimento especializado, das consultas médicas. Então, vamos atuar nessa área. A digitalização nos ajuda muito para reduzir fila.
Simone: Mas não falta médico? Boulos: Outro elemento, a falta de médico. Aí é uma parceria que a Prefeitura tem que ter a abertura de fazer com o governo federal, o presidente Lula retomou o Mais Médicos. Temos um problema crônico, que a falta de médico é regional. Tem médico que não quer ir para regiões mais distantes das periferias, seja porque considera perigosa, seja porque acha que o salário não funciona. Você tem que ter um plano de contratação, um plano de carreira, inclusive garantindo salários que sejam atraentes pra esses profissionais estarem nas periferias e atuarem lá. E fazer um convênio bem feito com o governo federal, para garantir os Mais Médicos em São Paulo. "Ah, mas aí é o médico cubano...". Olha, a pessoa que está lá no fundão do Jardim Ângela não quer saber se o médico é cubano, mexicano ou brasileiro, ela quer alguém que a trate bem.
Então retomar isso, a minha relação com o presidente Lula e com o governo federal permite garantir o Mais Médicos na cidade de São Paulo. Só para concluir, o terceiro ponto que é chave para redução de filas é o uso adequado da telemedicina. Eu estive com a Ana Estela Haddad, que é a secretária de Saúde Digital do Ministério da Saúde, entendendo como está sendo planejado na cidade. Tem que tomar muito cuidado porque a telemedicina não pode ser para o primeiro atendimento. O primeiro atendimento tem que ser pessoal, o contato do clínico, do médico, com o paciente. Isso é muito importante.
Simone: E considerar que nem todo mundo na periferia, por exemplo, vai ter condições de ter uma internet, de ter equipamentos, para poder fazer uma consulta. Boulos: Claro, mas aí estou falando da telemedicina aplicada no próprio equipamento de saúde. Você vai ao posto e faz a consulta por telemedicina. Tem que ser casos mais simples, determinados, casos de retorno ou casos, por exemplo, em que você vai informar para o paciente o resultado do exame, fazer análise do resultado do exame, e por aí vai.
Se você usa de uma maneira mais racional e efetiva a telemedicina, um convênio mais forte com os Mais Médicos, e digitaliza todo o processo e integra o sistema, o sistema municipal com o sistema estadual da CROSS [Central de Regulação de Ofertas de Serviços de Saúde], por exemplo, integra os prontuários digitais e eletrônicos, você reduz drasticamente a fila e melhora o atendimento à saúde aos mais pobres na cidade.
Simone: O senhor citou essa parceria com o governo federal, com o governo Lula. Acha que vai ser fácil também fazer esse tipo de parceria com o governo do estado, que hoje é ocupado por Tarcísio de Freitas? Boulos: Uma coisa que quero, podendo me eleger prefeito de São Paulo, em janeiro, no primeiro mês de governo, é propor uma mesa com o presidente Lula e o governador Tarcísio, os três, para discutir os principais problemas de São Paulo. O problema da segurança pública, que nenhum dos entes resolve sozinho. O problema da saúde, porque o SUS é um sistema integrado que passa por estado, município e União.
E discutir porque, veja, minhas posições você conhece, Simone, quem tá assistindo a gente conhece, sabe qual é minha posição partidária e política. Agora, quando você chega para sentar na cadeira da maior cidade do Brasil, da cidade mais rica do hemisfério sul do planeta, você não vai representar só o seu partido e as suas posições políticas e ideológicas. Você tem que representar a cidade, você é eleito pra isso. Você tem que ter a grandeza e a capacidade de diálogo pra conversar com quem pensa diferente.
Vou lhe dar um exemplo, eu disse no começo que aprovei três projetos de lei como deputado federal, em Brasília: o projeto de lei das cozinhas solidárias, uma política de combate à fome que o presidente Lula assinou o decreto agora; o projeto de lei do combate ao golpe do consignado, contra aposentados e pensionistas, que é um absurdo, uma sacanagem, que as financeiras fazem, inclusive extraviando dados do INSS; e o projeto de monitoramento das políticas públicas de combate à desigualdade, que é um problema que a gente tem no Brasil, faz a política e depois não avalia, não repensa a política. Aprovei esses três com votos de deputados do MDB, do PSDB, do União Brasil, do Republicanos, de partidos que não estão no meu campo político. Só pude fazer isso por diálogo, porque política envolve essa capacidade de dialogar com quem pensa diferente.
Então, se eleito prefeito de São Paulo, vou ter o diálogo institucional com o governador, com todas as instituições da cidade, além do presidente da República. É lógico que, tendo um alinhamento político maior com o presidente, isso permite também construir uma relação com o governo federal que hoje a Prefeitura não tem tido, por falta de disposição política,
Simone: Um tema que vai exigir muito trânsito ali com o governo do estado é a Cracolândia. Eu queria entender como o senhor enxerga o problema da Cracolândia e como se resolve. Ela é um problema de polícia, enquanto a gente sabe que tem tráfico? Ela também é uma questão de saúde pública, em função do estado dos usuários? Como é que se combate? O senhor é a favor da internação compulsória? Boulos: Eu acho que, como tive a oportunidade de fazer meu mestrado em Psiquiatria, estudei essas questões, primeiro, não tem bala de prata. Quem vier dizendo "eu vou resolver a Cracolândia só com isso. Eu vou fazer essa medida e amanhã não tem mais Cracolândia". Me lembro do Doria, quando se elegeu prefeito. Falou "vou acabar com a Cracolândia em um mês".
Simone: Disse até que acabou. Boulos: Pois é, passou oito anos que ele se elegeu, hoje a Cracolândia está maior, mais dispersa, o problema só piorou. Vai perguntar para o comerciante da Santa Ifigênia que foi esfaqueado, para o morador da região da Luz. Só piorou o problema com uma linha de "tiro, porrada e bomba". Francamente, não é isso que resolve.
Temos que integrar essas vertentes na prática, de fato, e sabendo que é um problema que vai ter iniciativas de médio prazo e iniciativas imediatas, de curto prazo. Primeiro, o problema da Cracolândia é, sim, um problema de segurança pública. Como a droga chega à Estação da Luz? Ela não nasce lá. A droga chega a partir de quadrilhas organizadas. Então você tem que ter uma atuação de inteligência, de monitoramento, para buscar impedir a chegada da droga. Esse é um papel da polícia, do governo do estado com a sua Polícia Civil.
Você tem que ter identificação e monitoramento dos usuários, para poder ver as políticas públicas mais adequadas. Você falou internação, redução de danos. Veja, não existe uma solução universal para todos os casos. Você tem que ver caso a caso. Medicina não se faz no atacado, se faz no varejo, olhando caso a caso. "Esse caso, pelo nível de dependência, pelo nível de autocontrole, vai ser redução de danos. Este caso, a internação".
Simone: Então o senhor admite que existe a possibilidade da internação compulsória, dependendo do caso? Boulos: É que você tem que ver como você trabalha o conceito de internação compulsória, isso é importante. Porque, às vezes, as pessoas acham que internação compulsória é você arrastar alguém sem anuência. É lógico que uma pessoa que está totalmente tomada pela droga, muitas vezes, ela não tem a condição e a consciência de tomada de decisão. Para isso, você tem que trazer o âmbito familiar e buscar um tratamento.
Não existe ali solução mágica, temos que ter isso claro. E aí passo para o que acredito que tem que ser feito. Três linhas: primeiro, a atuação de segurança pública, como eu disse, integrando GCM, policiamento, inteligência e investigação. Segundo, consultórios de rua, através de Caps móveis, estabelecer tendas. Essa pessoa não vai a um psiquiatra, essa pessoa não vai a um Caps, você tem que levar o Caps até ela para poder fazer o atendimento e atrair, convencer, trazer para o tratamento.
Eu estava um dia conversando com monitores que trabalham com dependentes químicos na Cracolândia e um deles deu uma fez uma fala que me sensibilizou muito. Ele falou "eu fui viciado, eu estava na Cracolândia. Você não sabe o que é, eu roubava coisa na casa da minha mãe para comprar droga. Perdi minha família. Perdi tudo, fiquei sozinho e sem ninguém".
Ele falou que foi resgatado pelo Programa De Braços Abertos, que foi feito na gestão do Fernando Haddad. Ele conseguiu porque fez a redução de danos e virou um monitor porque ele falou: "Agora eu fiquei sem família, o sentido da minha vida é buscar tirar pessoas do fundo do poço como eu estava".
É resgate. Você tem que resgatar as pessoas, tem que estender uma mão. Essa mão é na saúde e essa mão também é em uma intervenção social. Ali é um problema de pessoas que não têm moradia, não têm emprego. Então você tem que atuar, para além da saúde e da segurança pública, com o acolhimento humanizado, para tirar aquela pessoa da rua. Porque uma coisa leva à outra: a pessoa está na rua, sem perspectiva, sem futuro, vai pra droga, aí é um ciclo sem fim.
E por último, o tema do emprego, que são frentes de trabalho. A Prefeitura abrir, olha como está a zeladoria da cidade, largada, praça que virou matagal, buraco na calçada. Junta essas pessoas, faz o tratamento, logicamente, e depois resgata através do trabalho, pagando um salário digno para a pessoa. É um ganha-ganha: a cidade ganha, fica melhor cuidada e você está devolvendo uma pessoa para o convívio social.
Simone: Esse discurso a gente ouve muito entre religiosos que atuam na Cracolândia. Na sua gestão, a Prefeitura vai fazer convênios com entidades religiosas para que eles atuem ali, com esse discurso religioso que ajuda a tirar muita gente da droga? Boulos: Quaisquer entidades, sejam elas religiosas, sejam elas laicas, sejam elas de organizações sociais da região. Qualquer entidade que faça um trabalho sério, que tenha profissionais da saúde mental, que siga as diretrizes da reforma psiquiátrica e da lei, nós vamos fazer convênio, porque a Prefeitura sozinha não consegue, ela precisa ter essa parceria. Mas temos que separar o joio do trigo. Como em qualquer lugar, existem as entidades sérias, sejam religiosas ou não, que fazem um trabalho bem feito, bem intencionado, com profissionais qualificados, e essas precisam ser valorizadas, e a prefeitura tem que fazer parceria. E existem as entidades que não são sérias, inclusive com casos até de agressão de dependentes químicos. Com essas não dá pra seguir.
Simone: Vamos falar agora do seu grande tema, que é a moradia. O senhor citou três projetos que conseguiu aprovar na Câmara e nenhum deles diz respeito a moradia e desenvolvimento urbano. E esse é um tema em que o senhor divide paixões. O senhor fala para aquele que precisa de moradia, que adere ao seu discurso, mas o senhor cria um problema enorme junto àqueles que acham que o senhor vai socializar a propriedade, que o senhor vai liberar a invasão de apartamentos, de casas. Como modular o discurso para aquele que precisa de casa, que vive de uma forma indigna, e modular o discurso com aquele, por exemplo, que é vizinho da sua vice, a Marta Suplicy.
Boulos: Moradia, para mim, a causa dos sem teto, das pessoas que estão na rua, de uma família que às vezes tem que escolher entre pagar aluguel e comprar o leite do filho, de uma família que às vezes não consegue dormir à noite quando chove, com medo de o barraco cair ou de a água subir, esse tema para mim não é um tema só eleitoral, esse é um tema de vida. Porque é de uma indignidade você negar um teto. Vamos nos imaginar. Eu tenho duas filhas, sou casado, tenho minha casa. Imagina você, no fim do dia, cansada, saindo aqui do SBT e você não tem para onde ir? É muito doloroso.
A atuação do movimento sem teto, de que eu com muito orgulho fiz parte durante 20 anos, ao contrário do que diz o meme, a fake news e tal, nunca tomou, invadiu a casa de ninguém. O movimento sem teto dá casa para as pessoas. Nós demos casa para mais de 15 mil famílias. Casas com dignidade. O primeiro Conjunto Habitacional do Minha Casa Minha Vida do Brasil com varanda, elevador e três dormitórios foi feito pelo nosso movimento, em Taboão da Serra, na região metropolitana de São Paulo. Nesse momento, o maior empreendimento de moradia popular da cidade de São Paulo em número de apartamentos, 2650, é em Itaquera e é uma parceria do movimento sem teto com o Minha Casa Minha Vida.
O MTST dá dignidade, dá casa. Essa história que invade, eu gostaria de saber, que dessem uma casa que o movimento tomou dos outros, pelo contrário.
Simone: E os terrenos ocupados? Boulos: O que o movimento faz? Esse é um ponto importante. Existem terrenos e prédios abandonados, sem função social, que devem muitas vezes mais imposto que o valor do próprio imóvel. Que estão em situação ilegal, pelo que diz o Estatuto da Cidade, uma lei federal. Diz lá, abertamente, não é a minha opinião, está na lei brasileira: um imóvel sem função social, sem uso e ocupação, que fica abandonado, largado, que deve imposto e tal, depois de um certo tempo o proprietário não fazendo nada, cinco anos, é desapropriação sanção. A Prefeitura já deveria ter desapropriado para moradia social, não fez. A atuação do movimento ao ir a esses imóveis para fazer a denúncia é de cobrar que a lei seja cumprida, que esses imóveis sejam desapropriados. Olha como está o centro de São Paulo hoje. Aqueles imóveis vazios, largados, depreciados, caindo aos pedaços, no centro, inclusive fortalecem a sensação de insegurança na cidade.
Simone: O senhor vai desapropriá-los? Boulos: Eu vou fazer a lei ser cumprida. E não só para fazer moradia social. Ali na revitalização do centro, temos que pensar moradia social, moradia para a classe média, comércio no térreo, casarão que está abandonado virar um centro cultural, um centro de formação. Você revitalizar algumas regiões do centro com bares e restaurantes.
Simone: Mas qual vai ser o critério para desapropriar? Boulos: A lei. A lei diz muito claramente: cinco anos, IPTU progressivo, não fez nada, não apresentou projeto, desapropriação sanção.
Simone: Só cinco anos? Já é suficiente? Boulos: Cinco anos após a notificação municipal. Vários desses imóveis estão há 30 anos. Quem anda pela cidade de São Paulo sabe do que estou falando. Gerando insegurança para a população. Aí fica lá só coisa que não presta, crime, droga. O abandono gera isso, violência contra mulher, violência sexual nesses terrenos baldios abandonados na periferia ou nesses prédios abandonados no centro.
Esse é o trabalho que o movimento faz. Aí perguntaram para mim um dia "no seu governo, se você for eleito, você vai liberar, vai ter invasão?". Meu governo, se eu for eleito, com certeza é o que menos invasão vai ter na história de São Paulo, porque sabe o que gera a ocupação? Falta de política de moradia. Ninguém ocupa um lugar porque quer, é porque não tem política. O meu governo vai ter política de moradia.
Simone: Em quanto tempo você acha que se resolve o problema de déficit habitacional na cidade de São Paulo? Boulos: Olha, isso não é fácil de resolver de uma hora para outra. Não vou ser demagogo aqui, não vou ser o Doria, "em um ano eu resolvo, em um mês eu resolvo", isso não existe. Temos um déficit habitacional de quase 500 mil famílias na cidade de São Paulo, temos um milhão de pessoas morando em favela, você tem que fazer uma política pública planejada.
População em situação de rua é uma política específica: acolhimento, geração de renda, para tirar as pessoas da rua. Pessoas que estão em área de risco: urbanização. Favela: urbanização, regularização fundiária. O déficit habitacional tem várias faces. Todas essas são faces diferentes do déficit habitacional. Construção de moradia, operar com mutirão para urbanização de favelas, para reboco, pintura das casas, fazer as ruas, vielas, escadarias. É uma política pública e integrada, seria absolutamente irresponsável da minha parte dizer "faço isso em um ano, em dois anos". Nós temos que começar, isso é importante.
Simone: A promessa de cumprimento da lei é o seu antídoto contra essa imagem, essa caricatura de invasor que colou no senhor? Boulos: Tem que ver para quem colou. Isso também é fato, porque tem gente que fala isso e difunde isso na rede social, Simone, por má intenção. Tem gente que faz porque está num campo político diferente do meu. E aí em vez de fazer a discussão política, como estamos fazendo aqui, me dando a oportunidade de esclarecer, de falar da atuação do movimento, do que penso de moradia, resolve com meme ou com vídeo de 15 segundos. Infelizmente, a lacração substituiu a discussão na política brasileira. E não pode ser assim.
E tem uma parte, que acho que até é minoritária, que recebeu essa informação e não recebeu outra, às vezes fica uma dúvida. E vou, com muita tranquilidade, durante a campanha, fazer o que estamos fazendo aqui: explicar qual é essa atuação do movimento, explicar que não é uma atuação contra a lei, ao contrário, é para o cumprimento da lei, do Estatuto da Cidade, do plano diretor, da função social da propriedade na Constituição, e tenho certeza que as pessoas vão entender.
Simone: O senhor citou mais de uma vez aqui o presidente Lula. O senhor acha que esse cenário político nacional, de bipolaridade, vai vir também pra Prefeitura de São Paulo? A Prefeitura de São Paulo vai ser disputada entre Bolsonaro e Lula? Boulos: Olha, quero discutir a cidade de São Paulo. Sou pré-candidato à Prefeitura para apresentar soluções para a maior cidade do Brasil, que é uma cidade que historicamente é inovadora, é acolhedora, é diversa, que tem um orçamento de R$ 113 bilhões, uma capacidade de investimento gigante. São Paulo é uma Ferrari, só que hoje tem um piloto que é meio barbeiro. Esse é o problema que temos. Então precisamos, hoje em São Paulo, colocar São Paulo no lugar onde ela não devia ter saído.
Simone: O senhor tem carta de habilitação? Boulos: Tenho, claro. Sou um bom piloto, modéstia à parte. Mas tive a oportunidade, nesse último ano, de visitar grandes cidades globais e conhecer experiências que estão acontecendo ao redor do mundo. Fui para Paris, conversei com a prefeita Anne Hidalgo, para conhecer o projeto Paris 15 minutos, que reduz distâncias entre local de moradia e local de trabalho, um projeto absolutamente inovador. Leva mais equipamentos de lazer, esporte, cultura, para as regiões mais distantes e periféricas, para que as pessoas não tenham que atravessar a cidade para ir para um teatro, um cinema, para ir trabalhar, melhora a qualidade de vida. Fui pra Xangai e para Pequim conhecer o projeto de eletrificação da frota de ônibus. Estive também em Santiago, com a prefeita Irací Hassler, que é a cidade fora da China com maior percentual de ônibus elétricos, conhecer como eles fizeram com detalhe, tempo de resistência da bateria, como que dá para trazer para cá e tudo mais. Fui para Nova York conhecer o projeto de revitalização dos galpões abandonados, que o ex-prefeito Bill de Blasio fez, porque temos muitos na cidade de São Paulo.
Se olhar hoje, o mundo está discutindo redução de distância, transição energética, combate às mudanças climáticas, apropriação do espaço público de convivência. E São Paulo não está fazendo poda de árvore. São Paulo não tapa buraco da calçada. É triste ver. É isso que vou querer discutir na eleição. Agora, é natural que os apoios apareçam e não tenho vergonha de quem me apoia. O presidente Lula me apoia, sou o candidato apoiado por ele em São Paulo e tem orgulho, vai estar no meu palanque junto comigo. É o presidente da República, tem realizações importantes, a gente conversando diuturnamente, para levar projetos para São Paulo. Universidade Federal da Zona Leste, em Itaquera, o Instituto Federal de Cidade Tiradentes e do Jardim Ângela, o novo Hospital Federal da Unifesp, em Santo Amaro, para atender uma parcela importante da zona sul. Discutindo isso com o presidente Lula, para levar esses benefícios, agora vai sair a seleção do PAC, com mais obras na cidade de São Paulo, investimentos do governo federal.
O meu adversário, o prefeito Ricardo Nunes, talvez até por não ser uma pessoa um pouco insegura, não se coloca, fica omissa nos problemas da cidade, ele tem vergonha do padrinho político dele, que é o Bolsonaro. Ele é um bolsonarista envergonhado, que gera até constrangimento entre os bolsonaristas, que às vezes falam em não apoiá-lo porque ele é envergonhado. Ele foi na Avenida Paulista, mas parece que ficou escondido embaixo do carro de som. Ele abraça o Bolsonaro, mas não quer aparecer na foto.
Simone: Então está respondido: vai ter uma contaminação nacional na eleição da cidade? Boulos: Isso sempre teve. Nenhuma eleição de uma cidade de 12 milhões de habitantes, da cidade mais importante do Brasil, não tem impacto nacional e não recebe impacto nacional. Isso sempre teve. O que eu estou dizendo é que isso logicamente vai aparecer, Ricardo Nunes deve ser o candidato do Bolsonaro, embora ele faça isso de forma meio envergonhada, o presidente Lula me apoia. Agora, o que quero é discutir a cidade, não vou fazer da discussão de São Paulo um ringue ideológico. Quero discutir os desafios e os resultados para cidade de São Paulo.
Simone: O senhor certamente vai ter o apoio do ministro Fernando Haddad. Como que o senhor avalia a gestão dele à frente da Prefeitura de São Paulo? Boulos: Fernando Haddad foi um grande prefeito de São Paulo.
Simone: Mas não se reelegeu. Boulos: Não se reelegeu porque qual era aquela circunstância: impeachment da Dilma foi naquele ano, Lava Jato contra o Lula. A esquerda, naquele ano de 2016, perdeu 80% das cidades que governava, era uma circunstância muito determinada. A avaliação com que o Haddad terminou a Prefeitura de São Paulo, pegue a pesquisa feita no ano retrasado, quando ele foi candidato a governador seis anos depois do fim do mandato. Depois que passou o tempo, aí veio Doria, as pessoas fizeram a comparação e a avaliação da gestão do Haddad aumentou. A gestão do Haddad recuperou espaços públicos de convivência em São Paulo. A Paulista aberta aos domingos é da gestão Haddad, o carnaval de rua que hoje traz recursos para cidade, além de turismo, veio da gestão Haddad. A maior parte dos corredores de ônibus, foi a gestão que mais construiu corredores. Você tem um legado de políticas públicas que não pode ser ignorado.
Simone: Velocidade nas Marginais, que foi algo que ele fez, ele reduziu, e isso foi revisto imediatamente pelo então Prefeito João Doria. O senhor vai manter a velocidade como é hoje, 90 como velocidade máxima nas pistas expressas, ou o senhor vai reduzir? Boulos: Esse debate específico tem que ser discutido com a população.
Simone: A população sempre disse que queria a velocidade maior. Boulos: Se esse é o cenário, temos que atuar para combinar isso com redução dos indicadores de violência no trânsito. Para você ter um grau de fiscalização que impeça aumento da mortalidade. A solução para esse problema de velocidade passa por um diálogo, por um planejamento urbano e viário e por uma fiscalização e educação no trânsito, para que o trânsito não se torne um espaço perigoso, como é hoje.
Simone: Que papel o senhor espera que a pré-candidata Tabata Amaral, do PSB, possa ter numa eventual Prefeitura sua? Pesquisas a colocam na terceira posição das intenções de voto neste momento. Se caminhar desse jeito, acha que ela pode ter na sua campanha um papel como Simone Tebet teve na campanha do presidente Lula? Boulos: Não seria correto, nem respeitoso da minha parte, entrar nesse tipo de discussão, na medida em que a Tabata é candidata, é uma pessoa por quem eu tenho respeito, é uma boa deputada federal, faz um trabalho na área de educação, é reconhecida por isso. Pode, inclusive, ajudar a qualificar o debate da eleição para a Prefeitura, porque, se você olhar o prefeito, o nível para que ele leva o debate é muito difícil, é baixo. Outro dia ele disse "o Boulos é do Hamas".
Simone: O senhor se refere ao prefeito Ricardo Nunes? Boulos: Ao Ricardo Nunes. Fui candidato a prefeito na última eleição contra o Bruno Covas. Fizemos uma campanha que todos vocês jornalistas reconheceram com a mais civilizada dos últimos anos em São Paulo. Discutimos a cidade. Com divergências, com diferenças, às vezes duras e firmes, mas sempre com respeito, sem baixar o nível, sem elevar o tom para além do razoável. Fiz isso com o Bruno. Agora, o prefeito atual mostra que não tem essa disposição e, às vezes, essa condição de fazer um debate qualificado. Ter a Tabata como candidata ajuda, porque imagino, o que percebo da atuação dela, é que ela vai, assim como eu, querer discutir os temas da cidade de uma forma razoável e respeitosa.
Simone: A forma como o senhor fala do ex-prefeito Bruno Covas sugere também uma tentativa de herdar um legado dele, por uma relação amistosa, cordial, respeitosa, mas o atual prefeito Ricardo Nunes se coloca como o único herdeiro desse legado, afinal de contas ele foi o vice do Bruno. Quem é que está herdando alguma coisa da ideia do Bruno Covas? O senhor acha que a atual administração segue o ideal que o Bruno Covas tinha? Boulos: Melhor do que falar de herança é a gente falar de qual é essa situação. O Ricardo Nunes tem uma postura totalmente diferente do Bruno. O Bruno Covas não apoiou o Bolsonaro para presidente, o Ricardo Nunes apoiou. O Bruno Covas não recebeu o apoio do Bolsonaro, o Ricardo Nunes está se humilhando para ter o apoio do Bolsonaro. O Bruno Covas fez um Plano de Metas para a cidade de São Paulo e ano passado Ricardo Nunes picotou, o que levou inclusive à crítica pública de um braço direito do Bruno Covas, que era o secretário Orlando, que foi da Casa Civil do Bruno Covas e que se demitiu no governo Ricardo Nunes quando ele se aproximou do Bolsonaro, e criticou publicamente isso. A ponto de hoje o PSDB, que era o partido do Bruno Covas, estar cogitando não apoiar a reeleição do Ricardo Nunes.
Então o Ricardo Nunes, nesse sentido, traiu este legado que o Bruno Covas deixou. E tem outra, quem indicou o Ricardo Nunes a vice, ele disse outro dia, deu uma declaração se eu não me engano no Estadão, todo mundo sabe que foi o Doria.
Simone: Com que interesse? Boulos: Aí você tem que perguntar para ele. Não vou ter condições de dizer. Aqui não se trata de reivindicar legado, fui adversário do Bruno, não teria como reivindicar essa herança política. Fomos adversários. O que digo é que nos respeitávamos e tínhamos uma relação bastante civilizada. Diferente do Ricardo, que se aproximou de um campo político que era oposto ao Bruno, que é o Bolsonaro.
Simone: Pra gente terminar: por que ser prefeito da maior cidade do país? Boulos: São Paulo é a cidade onde nasci, é a cidade onde vivo, é a cidade onde crio minhas duas filhas, é a cidade onde eu trabalho. Ver São Paulo largada, abandonada, me indigna. Eu estou chegando em casa, às vezes aquele semáforo que fica mais tempo sem funcionar do que funciona, a iluminação pública está desligada. São coisas assim, você vê a cidade meio largada à própria sorte, que são fáceis de resolver, são possíveis de resolver. Essa é uma das coisas que me estimula.
Ver uma cidade tão rica como São Paulo com tanta injustiça social, com gente morando na rua. Não precisava ter gente morando na rua. É imoral ter gente morando na rua numa cidade como São Paulo. Não precisava.
Isso me estimula a assumir o desafio, enfrentar, porque acho que o outro lado não tem. Falta coragem hoje em São Paulo. Falta coragem para pegar os problemas de frente, encarar e fazer. Não tenho rabo preso, não tenho interesse escuso. Meus adversários podem me chamar do que for, podem gostar, não gostar de mim e tal, mas sabem que estou na política pelo que acredito, não por nenhum interesse lateral, paralelo, financeiro, de enriquecer, de nada disso. E isso me permite comprar certas brigas e ter a coragem de enfrentar certos problemas na cidade que o atual prefeito certamente não tem.
Simone: O senhor disse que não tem outros interesses, mas ser prefeito de São Paulo o cacifa, futuramente, para ser candidato à Presidência da República, ou não? Boulos: É lógico que quando você assume espaços, dentro da disputa política, você tem anseios, você tem sonhos. Agora, isso não se dá por vontade. Se alguém chegar lá no Congresso Nacional, para 513 deputados, e perguntar quem tem vontade de ser presidente da República, todos vão responder que têm. Isso se dá pelas condições políticas. Eu, neste momento, estou focado não só em ganhar a eleição em São Paulo como governar por quatro anos. Para mim, São Paulo não é trampolim político como outros já fizeram, para ficar no meio, sair. Se for eleito prefeito de São Paulo, vou me dedicar de corpo e alma, suar a camisa durante quatro anos para poder enfrentar os problemas da minha cidade.