Dólar dispara em resposta a pacote fiscal e aumento de isenção do IR; economistas avaliam efeitos
A moeda americana chegou a ser negociada a R$6. Anúncio desagradou militares e mercado financeiro que esperava ajuste mais agressivo
Gabriella Rodrigues
Gabriel Sponton
O dólar chegou a ser negociado a R$6 nesta quinta-feira (28), um dia após o anúncio do pacote de corte de gastos feito pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. A alta da moeda norte-americana - que fechou em R$5,989 - foi uma resposta do mercado financeiro ao "combo" de medidas para ajuste fiscal que incluiu a isenção de Imposto de Renda (IR) para brasileiros que ganham até R$ 5 mil.
O aumento do dólar influencia diretamente nossa vida, já que muitos produtos do cotidiano acabam encarecendo, como combustível, eletrônicos, roupas, alimentos e medicamentos, que por mais que sejam de fabricação nacional, possuem matéria-prima estrangeira em sua composição - e estes são comprados em dólar americano.
Embora o objetivo do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, seja economizar R$ 70 bilhões só nos próximos dois anos - e R$327 bilhões em 5 anos -, as medidas geraram apreensão em relação ao cumprimento das metas do governo em relação à dívida pública. Para o economista Luciano Nakabashi, professor da Universidade de São Paulo (USP), a "reforma" no IR junto com as medidas de ajuste geraram mau humor no mercado financeiro.
"O timing não foi bom", avalia o economista, diante das expectativas um pacote mais agressivo. “É preciso resolver primeiro essa questão do aumento da dívida pública em relação ao PIB (Produto Interno Bruto) para depois pensar nas medidas que podem beneficiar a população, como esse aumento de faixa para cobrança de Imposto de Renda”, analisa Nakabashi.
+Isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil: entenda a proposta do governo
Já o professor de economia na Universidade de Campinas (Unicamp), Pedro Rossi, minimizou a grita do mercado. “ O dólar sobe hoje, mas amanhã ele pode cair. O importante é pensar no Brasil para o futuro e não se deixar influenciar pela volatilidade do mercado nesse momento’’, ponderou.
Para Rossi, é preciso ter cuidado para não desviar do foco principal, com discussões pautadas apenas pelo mercado financeiro, que atua de maneira especulativa. Por outro lado, economista também ponderou que as medidas anunciadas foram tímidas e que o país enfrenta desafios pela frente:
‘’Do lado dos gastos, não sabemos se essas reformas e a contenção serão suficientes para viabilizar o arcabouço fiscal, o debate sobre isso continua. Do lado das receitas, a grande questão é se as medidas vão ter impacto suficiente para neutralizar o aumento do imposto para os mais ricos, sem prejudicar os mais pobres.’’
O arcabouço fiscal é um conjunto de regras que o governo precisa seguir para manter as contas públicas em dia. Ele é fundamental para evitar crises e manter o crescimento do país de forma estável e longe das inflações descontroladas.
Quando perguntado sobre os pontos positivos das medidas apresentadas por Haddad, o professor destaca: deixar de fora saúde e educação do pacote de contenção de gastos; debate amplo sobre arrecadação (taxar mais quem tem acima de R$50 mil de renda, e taxar menos quem tem até R$5 mil) e o “pente fino’’ nas regras para receber o Benefício de Prestação Continuada (BPC).
Já sobre os pontos negativos, o economista aponta categoricamente a correção do salário mínimo - que será corrigido por até 2,5% acima da inflação e antes, considerava a variação do PIB -, uma vez que, de acordo com sua análise, o governo sacrificou a capacidade do salário mínimo gerar crescimento, emprego e distribuição de renda. Com a nova regra, o salário mínimo não terá o mesmo impacto positivo que teve no passado.
Anúncio também desagradou militares
Além dos investidores, as medidas para corte de gastos anunciadas por Haddad desagradaram, em especial, os membros das Forças Armadas. O governo pretende fixar em 3,5% a contribuição do militar para o Fundo de Saúde até janeiro de 2026, e ainda acabar com a chamada morte fictícia, ou seja, a pensão recebida por familiares quando militares são expulsos ou excluídos das Forças Armadas.
Na avaliação do professor da USP, Luciano Nakabashi, o governo acertou em incluir os militares no esforço para diminuir os gastos públicos, já que a previdência social é uma das preocupações do país, que está envelhecendo mais rápido.
“Essa classe tem ficado de fora das últimas reformas, e não tem muito porque. A gente tem muitos privilégios na economia brasileira para determinados grupos. A gente tem que trabalhar para reduzir esses privilégios para que todas as pessoas tenham condições semelhantes”, explicou.