Exército usa categorias impróprias para cor e raça, e esconde negros e indígenas
Contrariando classificação do IBGE e o Estatuto da Igualdade Racial, Força estabelece três subgrupos para “pardos” e um para “moreno”
O Exército usa seis categorias para cor e raça da tropa: “branca”, “morena”, “parda”, “parda clara”, “parda escura” e “preta”. A classificação é considerada imprópria por contrariar o modelo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e o Estatuto de Igualdade Racial. Dessa maneira, acaba "escondendo" o total de negros e indígenas de seu contingente. Os dados inéditos foram obtidos pelo SBT News por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI).
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Por que isso é importante: desde a criação do Estatuto da Igualdade Racial, em julho de 2010, ainda no primeiro governo Lula, órgãos federais são obrigados a produzir estatísticas públicas sobre “raça/cor”. As estatísticas do Exército, entretanto, não seguem os requisitos previstos no artigo 39 do Estatuto, que determina a identificação do “segmento étnico e racial” dos servidores, com a utilização de critérios do IBGE.
O que se disse: “Em vez de usar as cinco categorias ‘branco’, ‘preto’, ‘pardo’, ‘indígena’ e ‘amarelo’, previstas pelo IBGE, a categoria parda foi desmembrada em três, e a categoria indígena e amarelo sequer aparecem”, diz Luiz Augusto Campos, professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP), um centro de pesquisa e pós-graduação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
As falhas: coautor do livro “Raça e eleições no Brasil”, Campos diz ainda que a categoria “moreno” é estatisticamente falha. “À exceção de loiros e ruivos, quase todo mundo pode se dizer moreno, fazendo com que a categoria não distingua nada.”
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Alerta: outro ponto na resposta do Exército é a quantidade de não-respostas. Dos 200.884 militares da ativa, 125.268 (62,3%) não informaram qual a categoria correspondente. “O Exército, assim, não tem informações sobre mais da metade do seu contingente, o que é alarmante.”
Sem bússola: a falta de informações torna impossível saber se o Exército discrimina os próprios integrantes. “Os dados sobre raça/cor servem para mensurar desigualdades, para mitigá-las. Isso se torna ainda mais relevante tendo em vista que as Forças Armadas pretendem ser representantes do Brasil enquanto nação, mas não parecem representar minimamente nossa população”, acredita Campos.
O outro lado: depois de receber as informações da LAI, a reportagem do SBT News voltou a questionar o Exército sobre o modelo de classificação e onde se encaixariam os indígenas: “A divisão para cútis utilizada pelo Exército segue a notação cromática resultante de estudo da classificação da pele, publicado pelo Museu Nacional e adotada no Livro de Identificação Datiloscópica do Serviço de Identificação do Exército”. Não há detalhes sobre a publicação ou mesmo a data da edição do “livro”.
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Identificação: o Exército diz ainda que a classificação dos seus integrantes “ocorre no momento da confecção da sua primeira identificação, sendo realizada por militar na função de identificador, especializado para exercer tal encargo. O índio é classificado com a cor da pele ‘parda’, conforme estudo constante do Livro de Identificação Datiloscópica do Serviço de Identificação do Exército”.
Outras Forças: enquanto a Marinha afirma ter 26.032 militares (47,5% da Força) autodeclarados negros (categoria que inclui pretos, pardos e “morenos”), a Aeronáutica diz ter 6.930 negros (20% do total, entre praças e oficiais) nos seus quadros. A Marinha diz que nenhum dos seus integrantes se declarou indígena; na Aeronáutica, há 187 deles.