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De Norte a Sul, Brasil sente os efeitos das mudanças climáticas

Em série especial, Marcos Uchôa mostra registros históricos e novas tecnologias que revelam como o clima mudou, às margens da COP30, em Belém

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Quase no extremo Sul do Rio Grande do Sul, em Pelotas, há muito tempo existe uma preocupação constante: o tempo. Os aparelhos usados ali medem vento, umidade e temperatura. Mesmo em um dia ensolarado, faz frio, mas menos do que antes. E isso está tudo registrado, tim-tim por tim-tim.

A primeira anotação data de 1888, no século XIX. De lá pra cá, esses registros vêm sendo mantidos até hoje, e são fundamentais para entender a variabilidade climática e as mudanças do clima.

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Trinta e sete anos se passaram, e para muita gente a constatação de que “a chapa está quente” é literal. Os antigos cadernos e canetas deram lugar a satélites e computadores, que mostram em tempo real como a ação humana vem alterando o clima, agravando impactos e ameaçando a vida no planeta.

Em Belém, sede do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a cidade se prepara para ser o centro das discussões sobre o futuro da Terra. Floresta ou desmatamento? Ser ou não ser, eis a questão para a humanidade.

“Você percebe que o clima tem mudado no Brasil inteiro. No mundo acadêmico a gente já sabe, mas no cotidiano as pessoas já entenderam que isso é um fato: é só olhar pela janela”, diz Alessandra Gomes, coordenadora do Inpe.

COP 30 e qualidade de vida

Belém vive a correria de quem prepara a casa para uma grande festa. Na COP30, o mundo vai desembarcar na cidade para discutir o que fazer, e é urgente. O histórico relógio de Belém, com quase mil anos, já testemunhou muitas transformações.

Há 50 anos, a Floresta Amazônica ainda estava quase intacta, apenas 0,5% havia sido desmatado. Desde 1975, a destruição aumentou quase 40 vezes. O tempo mudou, e a conta chegou.

“Tem um problema ainda maior por conta da mudança climática aqui: os incêndios. Incêndios domésticos, nas casas, por causa do ventilador que fica 24h ligado. A primeira coisa que acontece é um curto-circuito, por conta desses aparelhos que ficam muito tempo ligados”, revela Cláudia Conceição, integrante do Instituto Fênix.

Para quem vive em situação de vulnerabilidade, o abstrato “aquecimento global” pode virar um incêndio real, que destrói tudo. Em São Paulo, a “floresta de prédios” e a “selva de pedra” contrastam com a falta de verde nas favelas. Em Paraisópolis, encontrar uma árvore é difícil.

“Ou tá quente demais e as casas estão abafadas porque são muito coladas, ou quando chove ficam úmidas por muitos dias. A maioria das famílias sai cedo e fecha as casas. Ninguém quer estar num lugar que é 9 graus mais quente”, diz Renata Alvez, produtora cultural e líder comunitária.

São 9 graus de diferença entre a favela e o vizinho do Morumbi. As árvores funcionam como um “ar-condicionado natural”, um luxo. Sem elas, nove graus podem ser a diferença entre o inferno e o paraíso.

A palavra “paraíso” vem da Pérsia antiga, atual Irã, e remete à ideia de jardim, árvores e vida. Em São Paulo, o bairro Jardins é símbolo de riqueza, mas muitos outros bairros e favelas também carregam o nome, e vivem cercados de concreto. O calor já é uma questão de vida ou morte, especialmente para idosos. A expressão “tô morrendo de calor” se tornou real.

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O médico e professor da USP, Paulo Saldiva, estuda há décadas as causas de mortalidade ligadas ao meio ambiente, e sabe que o clima interefere diretamente na saúde e na vida.

“A gente calcula hoje, pelos dados, que morrem no Brasil, por extremos de temperatura, cerca de 50 a 52 mil pessoas por ano. Isso equivale a todas as mortes no trânsito e quase ao número de homicídios. Mas não vai aparecer ‘calor’ ou ‘frio’ no atestado. Aparece infarto, AVC, pneumonia”, aponta.

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