Homem descobre câncer no fígado após receber órgão com tumor em transplante
Após 13 anos na fila de espera, paciente recebeu fígado com tumor de doadora e agora enfrenta novo tratamento contra o câncer
Simone Queiroz
Natalia Vieira
Marcia Barros
Um homem de 58 anos viveu uma reviravolta após finalmente conseguir um transplante de fígado, depois de mais de uma década na fila de espera. O que parecia o fim de uma longa batalha contra a hepatite acabou se tornando o início de outra: ele foi diagnosticado com câncer no órgão transplantado.
A história começou há mais de 20 anos, quando o paciente contraiu hepatite. A doença evoluiu e, após 13 anos na fila, ele foi submetido a um transplante de fígado pelo SUS, em julho de 2023.
O alívio durou pouco. Oito meses após a cirurgia, exames de controle mostraram alterações nas enzimas do fígado. Uma ressonância magnética revelou seis nódulos no novo órgão. Segundo a esposa, Márcia Helena, a biópsia de um dos nódulos confirmou o diagnóstico de adenocarcinoma, um tipo de tumor maligno.
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Análises de DNA comprovaram que o câncer era da doadora, uma mulher falecida. A amostra genética revelou genes femininos, o que confirmou a origem do tumor. Diante disso, o paciente precisou passar por um segundo transplante.
No Brasil, os doadores podem ser vivos — cedendo um rim, parte do fígado, medula ou pulmão — desde que o procedimento não comprometa a própria saúde. Também há os doadores falecidos, diagnosticados com morte encefálica, quando o cérebro não apresenta mais atividade, mas o coração ainda bate.
Antes da doação, é necessário haver compatibilidade entre doador e receptor, considerando tipo sanguíneo, tamanho e peso. Cada estado possui uma Central de Transplantes, ligada à Secretaria Estadual de Saúde, responsável pelos exames laboratoriais. Os hospitais que realizam os transplantes não fazem essa checagem, e o processo precisa ser rápido.
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O médico Rodrigo Vianna, diretor do Instituto de Transplantes de Miami — o maior centro de transplantes dos Estados Unidos — explica que os testes realizados incluem sorologias de doenças graves, como HIV e hepatite, além de culturas de sangue e exames de imagem.
“A gente faz sorologia de todas as doenças que podem ser transmitidas, que seriam graves. O sangue hoje dá uma ótima noção de transmissão. Também fazemos cultura de sangue e exames de imagem, que são fundamentais para a doação”, afirmou.
No Brasil, o exame de tomografia não é obrigatório antes do transplante. Segundo o médico, o histórico de saúde do doador é essencial para evitar riscos, mas pequenas lesões podem não ser detectadas.
“Um paciente com câncer não pode ser doador. Mas não é possível excluir totalmente a presença de micro metástases, células que já estejam circulando pelo sangue”, explica.
A probabilidade de um órgão com câncer ser transplantado é de um caso a cada cinco a dez mil doadores. “É extremamente raro, mas não impossível”, diz o especialista.
Mesmo após a remoção do primeiro fígado transplantado, o paciente — identificado como seu Geraldo — desenvolveu metástases nos pulmões.
“Eu faço o tratamento de quimioterapia. Pelo que o médico falou, vou ter que fazer para o resto da vida. Se eu parar, o câncer pode crescer no meu organismo”, contou.
Em casos como esse, todos os receptores de órgãos da mesma doadora precisam ser avisados e monitorados.
Em nota, o Ministério da Saúde afirmou que os transplantes realizados no Brasil seguem protocolos de segurança e eficácia reconhecidos internacionalmente e que todos os doadores passam por exames clínicos e laboratoriais rigorosos.