Conselho de Ética aprova continuidade de processo contra Chiquinho Brazão
Deputado acusado de ser um dos mandantes do assassinato de Marielle Franco tem prazo de dez dias úteis para apresentar defesa
O Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados aprovou, nesta quarta-feira (15), a continuidade do processo para perda de mandato do deputado federal Chiquinho Brazão (sem partido-RJ). Foram 16 votos a favor e um contrário ao parecer preliminar da relatora, deputada Jack Rocha (PT-ES), que votou pela admissibilidade da representação do Psol e Rede Sustentabilidade contra Brazão.
A representação por quebra de decoro parlamentar foi protocolada em 24 de março, após o deputado ser alvo da Polícia Federal (PF) suspeito de ser um dos mandantes do atentado contra a vereadora Marielle Franco, do Rio de Janeiro, no qual também morreu o motorista Anderson Gomes. Os deputados do Psol e Rede dizem que, pelo envolvimento de Brazão no caso, "a sua cassação é uma necessidade". A cada dia que o parlamentar continua como deputado federal, ressaltam no documento, "é mais um dia de mácula e de mancha" na história da Câmara.
Com a aprovação da continuidade do processo no Conselho de Ética, Brazão tem prazo de dez dias úteis para apresentar sua defesa escrita, indicar provas e arrolar testemunhas (em número máximo de oito). É nessa nova fase também que a relatora se manifestará sobre o mérito da representação, ou seja, se o parlamentar deve ter o mandato cassado ou não.
Defesa
Durante a sessão do Conselho de Ética desta quarta, antes da votação, Brazão afirmou que é "inocente" no caso de Marielle. O parlamentar, que está preso preventivamente desde 24 de março, falou por videochamada.
"Eu sou inocente. Continuo alegando que vamos provar a inocência. Se olhar o meu mapa eleitoral, vai ver que eu tenho voto tanto em área de milícia quanto em área do tráfico. Podem averiguar isso. Vão ver que as minhas votações são boas nos dois sentidos", declarou. Parlamentares disseram, posteriormente, que, pela fala, parece que o Rio de Janeiro só tem esses dois tipos de áreas.
O advogado do deputado, Cleber Lopes, também falou no colegiado antes da votação. "Esse caso envolvendo o deputado Chiquinho Brazão seguramente é um dos casos mais rumorosos da nossa história recente, mas é um caso difícil, como é difícil navegar no mar bravio, como é difícil navegar no mar tormentoso", declarou.
"Por isso a Câmara precisa fazer um esforço para exercer a sua jurisdição ético-disciplinar, apesar da gravidade do fato. Ou seja, não podemos permitir que a gravidade da imputação contamine a judicatura ético-disciplinar. Porque os senhores estão aqui reunidos na condição de juízes".
Cleber Lopes criticou o fato de Jack Rocha, durante a análise da prisão do deputado na CCJ, ter segurado uma plaquinha em que estava escrito “Brazão na prisão".
"Isso é, a nosso juízo, com todas as vênias, de maneira incontrastável, uma antecipação do juízo de valor que a eminente relatora tem acerca do fato", pontuou. Ele relembrou que, por causa do ocorrido, pediu ao presidente do Conselho, Leur Lomanto Júnior (União-BA), a declaração de suspeição da relatora, solicitação que foi negada.
Ainda em sua fala, o advogado defendeu que fato anterior ao mandato não pode ensejar a cassação do mandato do parlamentar, o que, segundo ele, impede Brazão de ser cassado. Ele argumentou que o assassinato de Marielle ocorreu em 2018, antes de ser eleito, e que mesmo fatos relativos a alegada obstrução da justiça por parte dele foram anteriores à data na qual assumiu o posto de deputado federal.
Cleber também classificou a representação do Psol e Rede como "absolutamente imprestável a viabilizar a instauração de um processo ético-disciplinar contra quem quer seja". Há, em suas palavras, "uma representação solta, que não traz um único documento a demonstrar a razoabilidade do que está aqui descrito. A representação não descreve absolutamente nada no que diz respeito à autoria desse suposto mando de homicídio havido lá em 2018".
Conforme o advogado, a representação não diz sequer o motivo do crime de homicídio. De acordo com ele, na denúncia formulada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Brazão no caso Marielle, a instituição trabalha com a premissa de que Marielle "seria uma ferrenha opositora dos interesses clandestinos na aprovação dos Projetos de Lei de interesse do deputado chiquinho Brazão".
O advogado afirmou, porém, que a "narrativa" de que havia inimizade entre Marielle e Chiquinho Brazão "é uma criação mental". Ele pediu, ao final, que o processo no Conselho de Ética fosse arquivado pela ausência de contemporaneidade do fato com o mandato ou falta de justa causa decorrente da ausência de documentos acompanhando a representação, e alternativamente que fosse devolvido aos partidos para instruir a ação "com documentos capazes de viabilizar a instauração do processo ético-disciplinar".
Voto da relatora
Em seu voto, Jack Rocha ressaltou que "o caso em tela e o comportamento dos órgãos e das instituições vêm revelando as evidências dos supostos crimes cometidos pelos irmãos Brazão".
Também segundo ela, "a representação contém, ainda, narrativa clara dos fatos cuja análise se pretende, assim como as provas que a embasam". Para a relatora, "atendidos os requisitos formais exigidos nas normas de regência, não há que se falar na inépcia formal da peça inaugural".
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Em suas palavras também, "a conduta descrita na peça inicial configura, em tese, afronta ao decoro parlamentar". Conforme a petista, "é inegável que as condutas atribuídas ao representado, em análise preliminar, possuem a natureza jurídica de ilícitos penais de altíssima gravidade, inclusive caracterizados como crime hediondo".
Jack Rocha pontua que, “diante da inocorrência de inépcia da representação, bem como verificada a ocorrência de justa causa, impõe-se o regular processamento da representação em apreço".