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Política

Bolsonaro usa discurso jurídico para aparentar legalidade de suposta ação ilegítima, diz especialista

Thiago Bottino, professor da FGV analisa estratégia de defesa e tensão jurídica em julgamento da trama golpista

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O advogado e professor da FGV Direito Rio, Thiago Bottino, avaliou em entrevista ao SBT News os interrogatórios realizados no Supremo Tribunal Federal (STF) dos réus envolvidos na suposta trama golpista que visava impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Segundo ele, a estratégia de defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) está centrada em descolar os atos apurados da execução do crime, mesmo com fatos já provados nos autos.

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Bottino considera incontestável a realização da reunião entre Bolsonaro e militares na qual foram discutidas “alternativas” ao resultado das eleições. Para ele, a defesa tenta enquadrar esse encontro como um ato preparatório — e, portanto, ainda não criminoso — enquanto a acusação sustenta que já se tratava do início da execução de um golpe de Estado. A definição jurídica desse momento será crucial para o julgamento.

O professor também comentou o uso do conceito de “legalidade instrumental” por alguns dos réus, incluindo Bolsonaro e seu ex-ajudante de ordens, o tenente-coronel Mauro Cid.

Segundo Bottino, essa é uma tentativa recorrente na história de golpes de Estado: utilizar o discurso jurídico para dar aparência de legalidade a ações ilegítimas. Ele lembrou que algo semelhante ocorreu em 1964, quando o golpe militar foi formalizado por meio de atos institucionais após a tomada do poder.

“O direito por si só, embora ele possa dar essa aparência de legalidade, quando você não tem legitimidade, ele não é válido. O que é válido é a força”, disse Bottino.

Questionado sobre a validade da chamada “minuta do golpe” como elemento suficiente para caracterizar uma tentativa de abolição do Estado democrático de direito, Bottino foi cauteloso. Ele afirmou que o documento, por si só, pode não bastar, mas ganha relevância quando analisado em conjunto com reuniões, articulações e eventuais apoios buscados junto a autoridades militares e internacionais.

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A estratégia de silêncio adotada por alguns réus, como o general Augusto Heleno, também foi abordada. Para o professor, é uma postura legítima e prevista na Constituição. Ele frisou que nenhum ministro do STF pode interpretar o silêncio como indício de culpa. “É obrigação da acusação provar os fatos. A defesa não precisa produzir prova alguma se não quiser”, destacou.

No caso de Bolsonaro, que optou por falar, Bottino observou contradições no discurso do ex-presidente — como admitir reuniões e discussões sobre estado de sítio, mas negar qualquer intenção golpista. Ainda assim, ele explicou que essas inconsistências não têm valor probatório automático e não podem fundamentar uma condenação. No máximo, tornam a defesa menos eficaz.

A condução do interrogatório pelo ministro Alexandre de Moraes foi elogiada pelo professor. Apesar das tensões históricas entre o relator e o ex-presidente, Bottino avaliou que Moraes manteve uma postura serena, permitindo que os réus fizessem suas defesas em ambiente de equilíbrio institucional. Ele classificou como "momentos cômicos e desnecessários" as brincadeiras feitas por Bolsonaro, como o convite irônico para Moraes ser seu vice em 2026.

Por fim, Bottino explicou que, encerrados os interrogatórios, o processo entra na fase de alegações finais. A acusação será a primeira a se manifestar, seguida dos réus colaboradores e, por fim, das defesas. O professor não arriscou uma previsão sobre o prazo para julgamento, mas reconheceu a importância do caso. “É possível que o ministro Moraes dedique mais atenção a esse processo, dada sua relevância para a democracia brasileira”, concluiu.

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