Integridade e a saúde suplementar no Brasil
Brasil tem mais de 50 milhões de usuários de plano de saúde e setor tem suas complexidades
Lucas Augusto Perez dos Santos
*Integridade e Desenvolvimento é uma coluna do Centro de Estudos em Integridade e Desenvolvimento (CEID), do Instituto Não Aceito Corrupção (INAC). Os artigos têm publicação semanal.
De todos os diversos setores que foram levados ao limite nos últimos anos, a saúde sem dúvida ganha destaque. Além da pandemia, que colocou à prova todos os aspectos da prestação de assistência ao paciente, temos a constante batalha do setor público para oferecer universalização de tratamentos para a grande quantidade de usuários em um país com dimensões continentais. No setor privado, por sua vez, temos a busca pela equalização dos custos versus receita gerada pelos beneficiários dos planos de saúde.
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No tocante à saúde suplementar, segundo dados da ANS, até setembro de 2023, o Brasil possuía mais de 50 milhões de usuários de plano de saúde, resultando em um mercado promissor que movimenta bilhões de reais todos os anos.
A assistência prestada pela iniciativa privada, devido sua complexidade, emprega praticamente todos os tipos de profissionais do mercado, possibilitando um atendimento de qualidade a uma grande parcela da população brasileira, desonerando o SUS e acima de tudo, salvando vidas.
Como todo setor lucrativo e complexo, há inúmeras falhas de processos e riscos do negócio que necessitam de atenção, todavia, nos últimos anos, é possível evidenciar o aumento no número de fraudes contra operadoras de saúde, principalmente referente à prática de reembolso.
Vale ressaltar que o reembolso de consultas, procedimentos e exames é uma prática legal e garantida contratualmente para os usuários de plano de saúde. Essa modalidade acaba ampliando indiretamente a rede credenciada e possibilita ao paciente escolher o profissional de saúde que melhor se identifica.
Segundo dados da ABRAMGE - Associação Brasileira de Planos de Saúde, o valor relativo às fraudes contra operadoras de saúde foi superior a 7 bilhões de reais nos últimos 3 anos.
O mecanismo utilizado para essas fraudes envolve diversos agentes, podendo incluir desde médicos prescritores, clínicas e até mesmo o usuário final que, em muitas vezes, por desinformação, acaba envolvido nesse esquema milionário, seja compartilhando sua senha para possibilitar que reembolsos sejam solicitados por terceiros ou mesmo por desconhecimento das limitações e regras deste mecanismo de ressarcimento.
Naturalmente, inclusive por questões culturais, o paciente deposita sua confiança no serviço de saúde e em prol da sua própria recuperação, acaba cedendo ainda que involuntariamente aos espúrios mecanismos utilizados pelos fraudadores.
As operadoras de planos de saúde são fundamentais para a perenidade dos mais 4 mil hospitais privados no Brasil. Por isso, os efeitos deste esquema não ficam detidos apenas a este grupo, pelo contrário, geram um efeito sistêmico em todo setor.
Os planos de saúde trabalham em busca do equilíbrio financeiro, com o aumento das fraudes, consequentemente, temos a diminuição da receita, impactando diretamente hospitais, clínicas e médicos, comprometendo toda a cadeia de relacionamento estabelecida.
As operadoras de saúde vêm intensificando a vigília em relação às fraudes, desenvolvendo tecnologias e mecanismos para detecção e aumentando também a quantidade de documentos e verificações necessárias para realização de reembolso por parte do usuário final. No entanto, essas medidas, por mais benéficas que sejam, são custosas e não garantem a mitigação deste mal.
Com o avanço tecnológico, é nítido que estamos enfrentando novas formas de ilícitos em todos os segmentos da sociedade, cada vez mais engenhosos, que se aproveitam não apenas do usuário final, mas também das lacunas do sistema.
Mais do que combater e detectar os esquemas fraudulentos, é preciso a conscientização de todos os envolvidos nesta complexa cadeia, principalmente do paciente, peça fundamental para as fraudes em reembolso.
É necessário o desenvolvimento de um verdadeiro senso de integridade, onde hospitais, clínicas, médicos, pacientes e conselhos de classe, precisam estar atentos e vigilantes para o perfeito equilíbrio do sistema de saúde suplementar, não propiciando e compactuando com reembolsos fraudulentos ou mesmo com pedidos descabidos de exames.
Do ponto de vista do Estado, existe a real necessidade da criação de delegacias especializadas nesse tipo de fraude, ou mesmo da tipificação específica de crimes desta natureza, com punições mais severas.
Um setor que congrega e administra recursos de mais de 50 milhões de brasileiros, gera inúmeros empregos diretos e indiretos, necessita de atenção específica do poder público.
Mais do que nunca, tanto o SUS quanto a saúde suplementar buscam majoritariamente, diante de todas as dificuldades neste complexo sistema, propiciar ao paciente uma assistência médica de qualidade. As fraudes e o uso abusivo do sistema lesam toda a população.
Integridade e uso responsável são essenciais para a perenidade da saúde suplementar no Brasil.
*Integridade e Desenvolvimento é uma coluna do Centro de Estudos em Integridade e Desenvolvimento (CEID), do Instituto Não Aceito Corrupção (INAC). Os artigos têm publicação semanal.