Possível criminalização: advogados analisam situação jurídica de Bolsonaro
Ives Gandra, Thiago Bottino e Renato Ribeiro têm avaliações diferentes sobre futuro do ex-presidente
Roseann Kennedy
O SBT News ouviu três advogados sobre a situação jurídica atual de Jair Bolsonaro (PL): o jurista Ives Gandra Martins; o professor de direito penal da FGV, Thiago Bottino; e o coordenador da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), Renato Ribeiro. Os três concordam que a investigação sobre os atos golpistas de 8 de janeiro ainda está no início e é preciso aguardar o que será coletado de provas. Mas, eles têm pensamentos distintos sobre a real possibilidade de Bolsonaro vir a ser criminalizado.
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O ex-presidente passou a ser investigado no inquérito do Supremo Tribunal Federal (STF) que apura os responsáveis pelos atos golpistas, acusados de incitar a violência. E, no Tribunal Superior Eleitoral, o ministro Benedito Gonçalves autorizou a inclusão da chamada "minuta do golpe" em ação contra o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Renato Ribeiro acredita que Bolsonaro será responsabilizado, pois carrega um histórico de confrontos com as instituições e chegou a dizer que não cumpriria decisão do Supremo Tribunal Federal, especialmente do ministro Alexandre de Moraes.
"Se não bastasse o seu filho Eduardo ter dito que, para fechar o STF bastava um cabo e um soldado, já levando seus seguidores à uma animosidade com a Suprema Corte, o próprio Bolsonaro atacou diversas vezes o Supremo, tentando fazer a população acreditar que ele era um perseguido pela Justiça, que lutava contra o Poder Judiciário, que na visão dele seria cooptado por forças políticas contrárias às suas", afirmou.
Ribeiro também aposta que Bolsonaro ficará inelegível pela divulgação de fake news, como a postagem na qual afirma que o presidente Lula não foi eleito pelo povo, mas escolhido pelo STF e TSE.
O jurista Ives Gandra Martins, que no período eleitoral inclusive declarou voto em Bolsonaro e defendeu sua gestão, considera difícil a justiça criminalizar o ex-presidente, com base no que haveria de indícios até o momento.
Ele ressalta que durante os dois meses, após ter perdido a eleição, Bolsonaro continuava a ter poder e não houve nenhuma ruptura nem movimento neste sentido naquele momento, nem da parte do ex-presidente, nem das Forças Armadas.
"Evidentemente ainda vai ter que se investigar, mas acho muito difícil, como o presidente deixou de ter poder nos Estados Unidos, que ele teria feito um movimento, sem força nenhuma, sem armas, sem nada, para tentar dar um golpe de estado. A meu ver, a não ser que apareçam outras provas, acho muito difícil que ele possa ser responsabilidado", opinou.
Ives Gandra também minimiza o peso da "minuta do golpe", encontrada na casa do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres. O jurista ressalta que o Congresso jamais aprovaria e o texto não tinha embasamento jurídico para decretação de estado de defesa. "O papel não tinha validade nenhuma", concluiu.
Para o professor de direito penal da FGV, Thiago Bottino, as declarações de Bolsonaro, por exemplo sobre a possibilidade de o Brasil assistir à uma situação semelhante à invasão do Capitólio nos Estados Unidos e suas constantes críticas ao sistema eleitoral, criam um contexto e "dão um desenho mais amplo de qual é a postura dele", mas não substitui a investigação, que irá demonstrar se houve ou não alguma ação concreta dirigida a instigar os atos golpistas de 08 de janeiro.
"Se você dá uma declaração de que não confia nas urnas, não acredito nas eleições, isso é muito genérico ainda. E é muito difícil para o Ministério Público, na hora de formular uma acusação, relacionar como causa e efeito esse tipo de declaração com os atos das pessoas invadindo e depredando os prédios dos três Poderes. No caso de Bolsonaro, todos esses fatos ajudam a construir um contexto, mas não dispensam a investigação para demonstrar se houve de fato uma conduta", ponderou.
Bottino observou que há várias pessoas presas e que celulares estão sendo periciados. "Então será observado se houve conversa, articulação, organização, um estímulo, eventualmente até uma participação mais direta para que esses atos aconteçam. Querer que já haja todas as provas agora é exigir muito, ainda há muito a se investigar", finalizou.