"OAB deve proporcionar o ensino do ofício", diz Mário de Oliveira Filho
SBT News entrevista os candidatos a presidente da seção de São Paulo da Ordem dos Advogados
Guilherme Resck
A seção de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), a maior do país -- com mais de 400 mil inscritos --, realiza na 5ª feira (25.nov), das 9h às 17h, a eleição para definir os integrantes do Conselho Seccional e de sua Diretoria, os Conselheiros Federais, e integrantes da Diretoria da Caixa de Assistência dos Advogados (Caasp), que atuarão no triênio 2022 a 2024. Cinco chapas concorrem ao pleito. Como candidatos a presidente da Ordem estão Patricia Vanzolini, Dora Cavalcanti, Alfredo Scaff Filho, Mário de Oliveira Filho e Caio Augusto Silva dos Santos, que tenta a reeleição.
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Na eleição deste ano, foram implementadas mudanças. A principal delas, no que diz respeito às chapas, é que a composição deve considerar a paridade de gênero e o sistema de cotas - aprovados pelo Conselho Federal da OAB em 2020. Mário de Oliveira Filho é bacharel em direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, atua na área de direito criminal e se especializou em direito médico pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Com 42 anos de profissão, afirma ser a melhor opção para a Presidência da Ordem em São Paulo porque "nenhum outro candidato" tem uma história de vida profissional como a sua.
Cabeça da chapa 23 -- Inovação e Futuro --, ele quer implementar medidas específicas para cada etapa da carreira do advogado. Para os jovens, por exemplo, se eleito presidente da OAB-SP, pretende instituir um período de residência, no qual o profissional vai para um escritório, se desejar, e ganha experiência por seis meses em determinada área da advocacia; ao final, poderá receber um certificado. Outra proposta, desta vez voltada aos idosos, é um retiro, "para abrigar esse advogado no fim da vida, no fim da sua carreira, com dignidade e respeito à profissão que ele exerceu e à sua condição de ser humano".
Mário de Oliveira Filho planeja também um mutirão para negociar com advogados que estão com a anuidade da Ordem atrasada. Por outro lado, admite que ainda precisa saber qual orçamento teria à disposição: "eu vou fazer não é uma auditoria, será uma devassa fiscal, financeira, administrativa, da OAB, da Escola Superior da Advocacia e da Caixa de Assistência ao Advogado. Eu preciso saber o que eu tenho de dinheiro até para pensar na redução da anuidade".
Confira a entrevista na íntegra:
Como o senhor avalia a importância da OAB?
A OAB sempre foi a voz da sociedade civil organizada. E, para que ela continue sendo, ela precisa e representatividade. Essa representatividade influencia diretamente na defesa dos advogados da advocacia, do desempenho da função da advocacia, do respeito aos direitos e prerrogativas da profissão do advogado. Todas as carreiras jurídicas tem lei orgânica que regulam a sua atividade e conferem a cada uma das profissões, juiz, promotor de Justiça,. delegado de polícia, os seus direitos e prerrogativas, e nós temos a nossa lei federal, que infelizmente é enxergada por muitos como privilégios, mas não sabem sequer o que estão falando, porque todas as carreiras jurídicas têm. Então a importância da OAB para o exercício da advocacia é fundamental. Você veja nessa época de pandemia, os fóruns foram fechados, abertos, horários restringidos, horários voltados, juiz que não atende advogado, juiz que não está no fórum, e a OAB de São Paulo, que representa 500 mil advogados, o maior colégio de advogados do mundo, o segundo colocado é Nova York, com 118 mil, não foi chamado o presidente desses 500 mil profissionais que estão na Constituição Federal como indispensáveis à administração da Justiça, para dizer o que precisava a categoria durante um período tão difícil como esse que foi do fórum fechado, comércio fechado, cidades fechadas.
Quais mudanças seriam implementadas pelo senhor se eleito presidente da OAB-SP?
Como eu vou ser eleito, eu vou implementar alguns projetos que são de fundamental importância para a sobrevivência da advocacia. A "menina dos meus olhos" é a Escola Superior de Advocacia. A magistratura, quando o candidato passa e ingressa na magistratura, ele não vai direto para a vara judicar, ele vai para a Escola da Magistratura aprender a ser juiz. No Ministério Público é a mesma coisa, ele vai para a Escola do Ministério Públicoaprender o ofício do promotor de Justiça. E os delegados de polícia estadual e federal eles também vão para a Academia de Polícia aprender o ofício de ser policial. O advogado passa no exame na Ordem e pega a carteira, ele vai para onde? Vai para o inferno, porque aí começa o inferno da vida dele. Ele não tem para onde ir. Ele não sabe advogar, a faculdade não ensinou a advogar, e não é função da faculdade ensinar ofício. A faculdade de direito ensina ciências jurídicas. Quem deve, quem tem o dever de proporcionar ao novo advogado o ensino do ofício é a Ordem, que faz pela Escola Superior da Advocacia. E, hoje, essa escola não cumpre as suas finalidades. Aliás, essa escola nem está na mão da OAB. Está nas mãos de uma entidade particular. Aquilo lá entrou sem licitação, sem concorrência pública, sem coisa nenhuma. Ninguém sabe como essa empresa particular tomou conta dos destinos da ESA. E isto vai mudar. O jovem advogado, inspirado na, como eu me inspirei na medicina, ele poderá cursar as residências. Como tem a residência médica, nós teremos a residência da advocacia das várias áreas do direito. E ele fará o seu estágio como advogado, como residente numa determinada área, nos escritórios espalhados por todo o estado de São Paulo. Então ele vai fazer a parte prática num escritório de verdade, aprendendo como é o funcionamento de um escritório. Isto é muito importante para que o advogado recém-formado tenha a possibilidade de aprender a advogar. Esta residência, ao final, que são seis meses de residência, não é obrigatória, ele pode ser contratado pelo escritório ou pode sair e viver a sua vida, abrir o seu escritório. O importante é que ele terá, se passado tanto no exame de admissão para residência quanto no exame para receber a certificação, que a nota é 8,5, ele receberá um certificado de residência feita naquela área. Isso quer dizer que a Ordem dos Advogados de São Paulo confere a ele o status de especialista em advocacia naquela área. Isso é muito importante e vai fazer toda a diferença na vida dele. Com isso nós estamos abrindo o mercado de trabalho, a valorização da profissão, e ensinando o colega como se exerce o ofício. Quero também resgatar a dignidade do advogado na questão dos honorários. O Estado joga sobre os ombros do advogado o ônus que lhe cabe e sobre a Ordem dos Advogados também um outro ônus que lhes cabe. A Defensoria Pública deveria ter um defensor público em cada comarca do estado. Não tem. Nem espaço físico. A Ordem é que tem que ceder para a Defensoria Pública um espaço dentro da Ordem. Uma sala, com mobiliário, com aparelhamento de informática, para atender os hipossuficientes e não recebe nada por isso. E o advogado que trabalha ele recebe abaixo da tabela mínima da Ordem dos Advogados. Por exemplo, um júri custa R$ 27 mil, a Defensoria paga R$ 600,00, R$ 500,00 em duas parcelas. Isso é um absurdo, isso não é honorários, isso é uma esmola, e nós não vamos aceitar. Vamos negociar com a Defensoria Pública e ela tem que pagar no mínimo a tabela mínima da Ordem, porque receber abaixo da tabela é infração ética, e a Ordem não pode alvarizar uma situação dessa. Quanto à Caixa de Assistência do Advogado, de fundamental importância que em meio à pandemia deu a esmola de R$ 100,00 para cada advogado necessitado, enquanto, por exemplo, o estado de Pernambuco, que é um estado pequeno, deu R$ 3 mil para cada advogado necessitado em três parcelas de R$ 1 mil. Nós demos R$ 100,00. Mas ao mesmo tempo essa Caasp contratou uma empresa de publicidade, de marketing, em meio à pandemia, por R$ 1,02 milhão e paga R$ 85 mil por mês para um programa de marketing. O que interessa um programa de marketing para a Caasp? Isso tem que mudar. Os planos de saúde tem que ter preços compatíveis com a grandeza da Caasp, com a grandeza da Ordem, e com a necessidade do advogado. Na outa ponta, nós temos a advocacia pública, que vou entrar muito pesado. Os advogados públicos eles têm que ter a liberdade, o direito de receber a sucumbência. Sucumbência em processo não é da prefeitura, do prefeito, não é de ninguém. Sucumbência é do advogado. Isso está na Lei 8.906/94. Precisamos parametrizar o salário nacional, o piso salarial do advocacia pública, porque cada um paga o que quer e quanto quer, e não pode ser assim, nós temos regras para isso. A garantia ao advogado pública, a independência da tecnicidade no andamento, na tramitação dos processos sobre a sua responsabilidade, ninguém pode dar palpite no que ele está fazendo ou deixando de fazer. É como um médico. O médico tem que ter a sua autonomia de decidir, de fazer prescrição, enfim, de cuidar do paciente. E nós temos o dever de fazer o melhor dentro da advocacia com os nossos próprios recursos técnicos e profissionais. E, na última ponta, eu tenho o velho advogado, que é o final da vida. Nem todos conseguem o sucesso financeiro ou profissional, mas dedicaram a sua vida à advocacia e pagaram a Ordem a vida inteira. Por esses percalços da vida que a gente não sabe por que acontece, ninguém tomou vacina para não passar por isso, pode chegar principalmente quando velho, sem família, sem filho, sem mulher, sem ninguém, sem dinheiro, sem casa. Assim como os artistas têm o retiro dos artistas, nós teremos o retiro do velho advogado, para abrigar esse advogado no fim da vida, no fim da sua carreira, com dignidade e respeito à profissão que ele exerceu e à sua condição de ser humano. Então, em rápidas pinceladas, esses são os pontos básicos do meu projeto de gestão para a OAB, que vai ser implementado no dia 1º de janeiro de 2022, a partir das 15h, com a minha posse na Presidência da Ordem.
Quais as principais dificuldades que o senhor espera para implementar essas mudanças?
Primeiro, união da classe. Nós temos que resgatar o orgulho de ser advogado, que há muito tempo foi para o vinagre, acabou. Nós precisamos resgatar isso daí. As dificuldades, a primeira será ter uma visão geral da condição da Ordem. Então, eu vou fazer não é uma auditoria, será uma devassa fiscal, financeira, administrativa, da OAB, da Escola Superior da Advocacia e da Caixa de Assistência ao Advogado. Eu preciso saber o que eu tenho de dinheiro até para pensar na redução da anuidade. Mas para isso eu preciso ter uma visão, uma radiografia, mais do que isso, uma ressonância magnética da situação da Ordem. E os desafios são sempre os mesmos. Os inimigos do Estado Democrático de Direito, que nós iremos enfrentar um a um.
Quais os principais problemas da atual gestão que o senhor avalia?
Falta de representatividade, trampolim político, interesses pessoais acima de qualquer coisa e enganação. Você veja, eu tenha 42 anos de profissão. A Ordem dos Advogados de São Paulo tem 91 anos, ou seja, metade da vida da Ordem eu estou lá. Eu nunca vi a Polícia Federal invadir a Ordem dos advogados para recolher documentos em busca de prova de venda de sentença do Tribunal de Ética, isso é uma coisa inadmissível. Vaga para o quinto constitucional, outra coisa absolutamente inadmissível. Isso é a falta de representatividade, falta de vergonha na cara dos dirigentes ao impor aos demais colegas um vexame dessa ordem. Isso nós vamos proibir. Esses são grandes problemas a serem enfrentados. O outro problema a ser enfrentado é a questão da inadimplência dos colegas. O advogado não deixa de pagar a Ordem porque é picareta, bandido, safado, não. Escritórios fechando, clientes morrendo de covid não pagam advogado. O que a Ordem faz? Protesta o advogado. No momento em que ela protesta o advogado, ela trava a vida financeira do advogado. Ele não tem cartão de crédito, ele não tem crédito, não tem mais nada. E não contente com isso, em meio à pandemia, a Ordem executa, faz ação de execução com penhora de bens de advogados. Isso é inadmissível. Nós faremos primeiro um estudo socioeconômico de cada advogado por uma empresa especializada, vamos chamar, em um grande mutirão, todos os inadimplentes, e diante da sua condição socioeconômica, faremos negociações para ele pagar. Não é isenção, é negociação para receber aquele que é devido à Ordem.
Quais características foram observadas para a escolha dos demais integrantes da chapa?
Primeiro, que não seja ex-isso ou ex-aquilo, a minha chapa não tem tem ex-juiz, não tem ex-delegado, ex-promotor, todos são advogados de carreira. Nós fizemos convocação, convidamos as pessoas conhecidas, convocamos as pessoas desconhecidas, fizemos conversas, reuniões, vigorosa triagem. Aqueles que são verdadeiramente vocacionados, que querem servir a Ordem e não se servir da Ordem foram as pessoas selecionadas para compor a chapa.
Como avalia as mudanças implementadas na atual eleição, como a paridade de gênero e as cotas raciais?
Eu sou a favor das cotas raciais, temos que fazer essa inclusão, e sou favorável também à paridade de gênero. Mas, não é o sexo, não é a cor, não é a origem que diz que alguém tem condições ou não de exercer determinada atividade. O que importa aí é a vivência, a experiência, o que importa é o compromisso com a advocacia e com a OAB. Isso é o que importa. Se o sujeito é branco, negro, baixo, gordo, gay, hétero não interessa. Tem competência para adminsitrar a Ordem? Tem. Ele é o administrador. É assim que funciona. É a meritocracia independentemente de sexo ou de cor.
Como o senhor se identifica no espectro político?
Essa questão da política eu acho muito complicada, porque nós temos que tratar de Ordem. A Ordem não pode ser puxadinho político de partido nenhum. A Ordem não pode ser berço de ideologia de direita ou de esquerda. A Ordem tem como partido a advocacia e, como ideologia, o bem-estar do advogado. Então se alguém da esquerda fizer alguma coisa boa para a Ordem, vai receber aplausos. Se fizer alguma ruim para a Ordem, vai receber o nosso repúdio. E assim é também com o pessoal da direita. Se alguém fizer alguma coisa ruim para a OAB, vai receber o nosso repúdio. E, se fizer coisa boa, receberá o nosso apoio. A independência da Ordem é inversamente proporcional ao número de favores que ela deve aos partidos políticos. Não pode ter partidarização dentro da Ordem. A Ordem é outra coisa. E eu sempre me vi como um homem democrático. Quando me pergunta "Mário, você é de direita ou de esquerda?", eu não sou nem de direita nem de esquerda. Eu não sou direitista e não sou esquerdista, eu sou criminalista, eu defendo direitos. Já defendi gente da esquerda, já defendi gente da direita, já defendi gente de centro, essa é a minha missão. Se alguém tiver um direito a ser defendido, seja quem for, eu vou defender aquele direito, para que até, se houver uma condenação, ela seja baseada dentro de um processo legal com ampla defesa e contraditórios garantidos.
Por que o senhor seria a melhor opção para a OAB-SP?
Eu sou a melhor opção porque nenhum outro candidato tem a história de vida profissional que eu tenho, nenhum outro candidato tem uma folha de serviços prestados à advocacia sem ocupar cargo nenhum e ninguém tem uma folha de serviços prestados à OAB de São Paulo como eu tenho. Fui conselheiro seis vezes, presidi várias comissões, fundei e dirigi várias entidades de classe voltadas para a advocacia. Eu tenho experiência. Eu não caí no ônibus agora e quero sentar na janelinha. Não é isto. Os meus candidatos eu avaliei o perfil de cada um. Ninguém, nenhum deles tem a história que eu tenho. Aliás, nunca participaram de absolutamente nada em defesa da Ordem, em defesa da advocacia, em defesa da advocacia negra, em defesa da advocacia pública, em defesa do que quer que seja relativo à advocacia. Nenhum. Nem sabe onde fica a Ordem. Isto é muito importante. Não participaram de comissão, não presidiram comissão, não levantaram bandeiras e não seguraram bandeiras já levantadas pela advocacia. São franco-atiradores e isso a Ordem não pode mais admitir. Chega de cadeirista. A Ordem tem que ser administrada por advogado de carreira e a experiência faz a diferença. E eu não quero ser presidente só da Ordem. Eu quero ser o advogado da advocacia, como sempre fiz, advogando em defesa da democracia.