ENGANOSO: Reino Unido não interrompeu vacinação infantil devido a aumento de mortes
Confira a verificação realizada pelos jornalistas integrantes do Projeto Comprova
Projeto Comprova
Enganoso: É enganoso post no Twitter que afirma que o governo do Reino Unido interrompeu a imunização contra a covid-19 em crianças de 5 a 11 anos devido a um aumento de mortes nessa faixa etária. A vacinação de crianças continua ocorrendo. Somente as que completarem cinco anos a partir de setembro que não irão mais ser imunizadas, o que já era previsto desde fevereiro. Além disso, embora realmente tenha havido um crescimento na mortalidade em crianças em 2022, não existe evidência de que isso tenha ocorrido por causa da vacinação. Segundo a OMS, a vacinação de crianças contra a covid continua sendo eficaz e segura.
Conteúdo investigado: Post no Twitter que diz que o governo do Reino Unido teria interrompido a vacinação contra a covid-19 em crianças de 5 a 11 anos devido a um aumento de mortes nessa faixa etária. O post traz um link para um conteúdo do site negacionista The Exposé sobre o assunto.
Onde foi publicado: Twitter.
Conclusão do Comprova: É enganoso tuíte segundo o qual o governo britânico interrompeu a imunização contra a covid-19 em crianças de 5 a 11 anos "após um aumento de 22% nas mortes nesta faixa etária desde que o NHS (sistema de saúde britânico) começou a vaciná-las".
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De fato, foi registrado aumento de óbitos de 22%. Segundo o Instituto Nacional de Estatísticas Britânico, de janeiro a setembro de 2020 foram contabilizadas 143 mortes de crianças de 5 a 9 anos. No mesmo período de 2022, foram 176 ? ou seja, um aumento de 22%. Mas, diferentemente do que afirma o post enganoso, não é possível afirmar que os óbitos tenham relação com a vacina, nem que foram a causa da interrupção da campanha de imunização.
A suspensão da imunização para esse público estava prevista desde o mês de fevereiro, antes do início da campanha de vacinação. Na ocasião, o governo anunciou que a imunização do público de 5 a 11 anos incluía apenas as que completassem 5 anos de idade até o final de agosto de 2022. Ou seja, já estava previsto que, a partir de setembro deste ano, crianças que tivessem completado cinco anos não estariam mais elegíveis para a vacinação. Para o restante do público dessa faixa etária (ou seja, crianças que completaram cinco anos até agosto de 2022) as vacinas seguem disponíveis e sendo aplicadas, segundo o governo do Reino Unido.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Alcance da publicação: Até o dia 27 de setembro o post contava com 6,7 mil curtidas e 2,7 mil retuítes.
O que diz o autor da publicação: O Comprova entrou em contato com o perfil do Twitter que fez a publicação por meio de mensagem direta na rede social, mas não houve retorno até a publicação da verificação.
Como verificamos: Para fazer a verificação, o Comprova pesquisou no Google notícias sobre a interrupção da vacinação em crianças a partir de cinco anos. Nessa pesquisa, encontramos uma matéria do The Guardian, citada no post viral, e uma do iNews. As duas falam sobre críticas de pais e especialistas à interrupção e também que a imunização dessas crianças era temporária desde o início. Em seguida, consultamos o site oficial da Agência de Segurança em Saúde do Reino Unido (UKHSA) para confirmar se a imunização realmente era temporária.
A fim de saber se o dado de 22% era verdadeiro, consultamos o site do Instituto Nacional de Estatísticas Britânico, onde são publicadas estatísticas sobre mortalidade e natalidade no Reino Unido. Os dados de 2022 estão disponíveis até o fim da primeira semana de setembro, por isso, fizemos a comparação com os outros anos usando o mesmo recorte.
Também procuramos na internet se havia sido publicado em algum lugar que a interrupção da vacinação tinha ligação com aumento de mortes, mas nada foi encontrado. Por fim, entramos em contato com a UKHSA, por e-mail, e por mensagem no Twitter com o autor do post.
Imunização de crianças no Reino Unido era temporária
A vacinação para crianças de 5 a 11 anos no Reino Unido começou em fevereiro de 2022 com o imunizante da Pfizer. A publicação de fevereiro deste ano no site oficial do governo do país já previa que a imunização seria suspensa em setembro para crianças que completassem cinco anos a partir desta data. Segundo o texto de fevereiro do governo britânico, o programa "se aplica a pessoas com idade entre 5 e 11 anos, incluindo aqueles que completarão 5 anos de idade até o final de agosto de 2022". Ou seja, a imunização não terá mais como público as crianças que completarem cinco anos após o fim de agosto.
O Comprova tentou contato por e-mail com a Agência de Segurança em Saúde do Reino Unido (UKHSA) mas não houve retorno até a publicação desta checagem. Em verificação recente sobre o mesmo tema publicada pela agência de checagem australiana AAP, a UKHSA informou que nada havia mudado com relação à vacinação de crianças entre 5 e 11 anos.
À AAP, a agência britânica respondeu que "a elegibilidade sempre terminava em 31 de agosto e isso foi anunciado pela primeira vez em fevereiro deste ano" e que "aqueles que são elegíveis (ou seja, completaram 5 anos antes de 31 de agosto) ainda podem receber a vacina".
No comunicado oficial de fevereiro de 2022, o governo britânico não detalhou qual critério para deixar de aplicar doses das vacinas em crianças que completam 5 anos a partir de setembro. Conforme relatado nas matérias do The Guardian e do iNews, um dos motivos para justificar a decisão é que crianças nessa idade correm menos risco de desenvolver formas graves da doença e que seria mais eficaz priorizar a vacinação de grupos mais vulneráveis.
Essa decisão gerou repercussão negativa entre especialistas e famílias, conforme noticiou o The Guardian, em reportagem que está citada no texto do The Exposé que faz parte do tuíte aqui verificado. Segundo o Guardian, a UKHSA disse que "a oferta de vacinas contra a covid a crianças saudáveis ??de 5 a 11 anos sempre foi temporária" e que "crianças com cinco anos ou mais que pertençam a grupo de risco continuariam a receber as vacinas".
Assim, a partir de agora, crianças saudáveis que completarem cinco anos de setembro deste ano em diante não terão mais direito a ser vacinadas. Crianças entre 5 anos (completos até agosto de 2022) e 11 anos que ainda não foram vacinadas, seguem tendo direito à imunização. E crianças que têm mais de 12 anos continuam tendo direito de ser vacinadas.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a vacinação de crianças de cinco a 11 anos é eficaz e segura. A recomendação é o uso de dose reduzida da vacina ? 10 microgramas em vez de 30 microgramas ? em comparação com aquela aplicada em pessoas com 12 anos ou mais. Além disso, este grupo deve ser o último a receber o imunizante e também não há orientação para dose de reforço.
Não há indícios de que aumento de mortes tenha relação com a vacina
O texto do The Exposé fala que a decisão de interromper a vacinação de crianças saudáveis a partir dos 5 anos aconteceu depois que uma instituição de governo do Reino Unido, conhecida como "Office for National Static", publicou que o "número de mortes de crianças de 5 a 9 anos está 22% maior do que nos dois anos antes das vacinas serem aplicadas no país em crianças de 5 a 11 anos".
De acordo com dados anuais do governo do Reino Unido, divulgados no site do Instituto Nacional de Estatísticas Britânico, entre janeiro e a primeira semana de setembro de 2020 foram registradas 143 mortes de crianças entre cinco e nove anos. Em 2021, foram 144 e em 2022, 176, no mesmo período. O aumento realmente representa 22% a mais do que nos dois últimos anos. Porém, não há nenhum indício de que o aumento tenha relação com a vacina.
Não é possível comparar o mesmo recorte com anos anteriores a 2020, já que antes a divulgação do governo usava recortes de idades diferentes.
Fonte citada no tuíte é site negacionista
O tuíte aqui analisado compartilha como fonte para as informações um link do site "The Exposé", que se apresenta como veículo disposto a divulgar conteúdos "alternativos aos propagados pela grande mídia mentirosa". O site é conhecido por publicar informações falsas sobre a pandemia de covid-19 e já foi verificado pelo Comprova em outras oportunidades: em dezembro de 2021 quando publicação do site afirmou que a vacina da covid teria provocado aumento de mortes de crianças e em março de 2022 por conta de um conteúdo que afirmava que a proporção de mortes era maior entre não vacinados do que entre vacinados no Reino Unido.
Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos que viralizaram nas redes sociais sobre a pandemia, as eleições presidenciais e políticas públicas do governo federal. Conteúdos falsos ou enganosos sobre as vacinas contra a covid-19 podem desestimular as pessoas a se imunizarem, o que coloca a vida delas em risco.
Outras checagens sobre o tema: Esse mesmo conteúdo foi marcado como falso pela Australian Associated Press FactCheck.
Em checagens recentes sobre a pandemia, o Comprova também mostrou que é enganoso que ex-funcionária da Casa Branca tenha confessado, em entrevista, que as vacinas não protegem contra a covid-19, que a morte de seis médicos canadenses não tem relação com a vacina contra a covid-19 e que erros admitidos por órgão dos EUA no combate à covid têm relação com estratégias de comunicação, e não política de vacinação.
Investigação e verificação
Folha, Correio Braziliense e Piauí participaram desta investigação e a sua verificação, pelo processo de crosscheck, foi realizada pelos veículos Correio do Povo, Plural, O Popular, Estadão, A Gazeta, SBT e SBT News.
Projeto Comprova
Esta reportagem foi elaborada por jornalistas do Projeto Comprova, grupo formado por 42 veículos de imprensa brasileiros, para combater a desinformação. Iniciado em 2018, o Comprova monitorou e desmentiu boatos e rumores relacionados à eleição presidencial. Agora, na quinta fase, o Comprova segue verificando conteúdos suspeitos sobre políticas públicas do governo federal e eleições, além de continuar investigando boatos sobre a pandemia de covid-19. O SBT e SBT News fazem parte dessa aliança.
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