Vacina nasal anticovid: Incor pede autorização para testes em humanos
Desenvolvimento brasileiro é inédito no mundo. Testes devem começar em janeiro de 2022
O Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (InCor) solicitou à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), nesta 5ª feira (21.out), uma autorização para iniciar os testes clínicos em humanos da vacina em spray contra a covid-19. A nova geração de imunizantes será capaz de estimular a produção de anticorpos do tipo IgA na porta de entrada do coronavírus, o que pode ajudar a frear sua alta capacidade de transmissão.
+ Leia as últimas notícias no portal SBT News
O objetivo é que os testes sejam iniciados em janeiro de 2022 com 280 voluntários. "Como a maioria da população brasileira está imunizada, iremos recrutar voluntários já vacinados contra covid-19 e com isto poderemos analisar o efeito de potencializar a resposta imune", esclarece o pesquisador chefe do estudo, Jorge Kalil, diretor do Laboratório de Imunologia do InCor e professor Titular da FMUSP.
Os participantes serão distribuídos em 7 grupos, sendo que seis deles tomarão doses diferentes entre si, para testar a melhor dosagem, e o último receberá apenas placebo. As duas primeiras fases dessa etapa clínica terão duração de até três meses e contemplarão a análise de segurança, a resposta imune e o esquema vacinal (dose) mais adequado.
"Estamos esperançosos nos resultados clínicos desta vacina em spray, pois todos os testes que nos propomos a fazer têm nos mostrado importantes conquistas no combate ao vírus", diz o pesquisador.
O imunizante de fácil aplicação está sendo desenvolvido pelo Laboratório de Imunologia do InCor em parceria com a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e das seguintes unidades da USP: Faculdade de Medicina, Instituto de Ciências Biomédica e Faculdade de Ciências Farmacêuticas.
Por que spray nasal?
Segundo os pesquisadores, cada tipo de vírus escolhe uma 'porta de entrada' no organismo. Kalil explica que o Sars-Cov-2 entra no organismo pelo nariz, infectando a mucosa. "O nosso foco é criar uma vacina que atue diretamente no sistema respiratório, fortalecendo a resposta imune de toda essa região, de forma a evitar a cadeia de infecção do indivíduo, desenvolvimento da doença e transmissão para outras pessoas."
Ainda em relação à diferença de atuação das vacinas, a imunologista e docente da Escola Paulista de Medicina da Unifesp (EPM/Unifesp) Daniela Santoro esclarece que as vacinas que atualmente são aplicadas no braço estimulam a produção de anticorpos dos tipos IgM e IgG, que circulam livremente no sangue e no plasma. "Elas são muito eficazes no combate ao vírus e, sem dúvidas, são grande responsáveis pela queda no número de internações e de óbitos, mas ainda enfrentam o desafio de barrar a grande capacidade de transmissão. É nesse aspecto que entram as chamadas vacinas de segunda geração, como as de spray nasal", afirma.
Para combater as doenças respiratórias, os anticorpos ideais são os do tipo IgA, produzidos nas mucosas, presentes em grandes quantidades nesses locais e muito mais específicos para atacar patógenos como o coronavírus.
"As novas vacinas devem atuar como mecanismos de defesa nessas portas de entrada, reforçando o que o nosso organismo já faz de forma muito inteligente. Os estudos caminham nesse sentido e acreditamos que essa nova geração de imunizante seja capaz de frear a transmissão do vírus, com potencial para conter a pandemia", conclui Daniela.
Diferente das vacinas atuais, que usam a proteína spike para induzir a resposta imune do organismo, a vacina do InCor utiliza peptídios sequenciais (biomoléculas formadas pela ligação de dois ou mais aminoácidos) derivados de proteínas que compõe o vírus. Para fazer a administração pelas vias aéreas superiores, os pesquisadores desenvolveram uma formulação também inédita. A proteína vacinal é inserida em nanopartículas capazes de atravessar a barreira de cílios e muco presentes no nariz, chegando às células.
"O coronavírus vai persistir na sociedade. Sabe-se que as vacinas atualmente em uso não garantem a proteção por longos períodos, sendo necessário um reforço vacinal", arremata Kalil.