ENGANOSO: Minirreforma não tiraria direitos de todos os trabalhadores como dá a entender vídeo no TikTok
Confira a verificação realizada pelos jornalistas integrantes do Projeto Comprova
ENGANOSO: É enganoso vídeo no TikTok afirmando que a medida provisória sobre a minirreforma trabalhista, derrotada nesta semana no Senado, tiraria direitos de todos os trabalhadores. Segundo texto aprovado na Câmara, ela eliminaria benefícios nos três formatos de trabalho que cria e de empregados via CLT em casos específicos.
- Conteúdo verificado: Vídeo no TikTok afirma que a minirreforma trabalhista proposta pelo governo Bolsonaro e derrubada no dia 1º de setembro pelo Senado retiraria direitos dos trabalhadores.
Um vídeo no TikTok engana ao sugerir que direitos trabalhistas seriam eliminados em todos os tipos de contratações caso a minirreforma trabalhista fosse aprovada no Senado ? na última quarta-feira (1), o texto foi derrubado pela Casa.
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Originalmente, a medida provisória número 1.045, enviada ao Congresso pelo Palácio do Planalto, previa ações como pagamento do benefício emergencial e redução proporcional de jornada de trabalho e de salários por conta da pandemia, mas a medida recebeu propostas de emendas feitas por deputados. Nelas, eles criavam formas de contratação e alteravam pontos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Um dos modelos propostos era, por exemplo, o Requip (Regime de Qualificação Profissional). Voltado para jovens, desempregados e pessoas carentes, o programa previa recesso remunerado de 30 dias após um ano de trabalho, mas não incluía pagamento de 13º salário nem de FGTS.
Dessa forma, a medida eliminaria benefícios nos três formatos de trabalho que criava, em casos específicos, não retirando todos os direitos trabalhistas. Além disso, ela valeria apenas para novas contratações. Em casos de contratos via CLT normais, a MP reduziria o valor da hora extra paga para algumas profissões, como bancários, operadores de telemarketing e jornalistas.
O Ministério Público do Trabalho (MPT) havia considerado as mudanças propostas na MP como inconstitucionais ? a mesma crítica foi feita por advogados ouvidos pelo Comprova.
A reportagem procurou o autor do vídeo, mas não recebeu retorno até a publicação desta checagem. Para o Comprova, enganoso é conteúdo que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor.
Como verificamos?
O Comprova buscou informações sobre a minirreforma trabalhista nos sites oficiais da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e também consultou matérias jornalísticas sobre o tema.
Além disso, conversou com dois especialistas em direito trabalhista: a advogada Fabíola Marques, doutora em direito do trabalho e professora da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, e com o presidente da Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo (AATSP), o advogado Horácio Conde.
Por mensagem privada no TikTok, a equipe tentou contatar o autor do vídeo, mas não recebeu retorno.
Verificação
Minirreforma trabalhista
A Câmara concluiu no dia 12 de agosto a votação do projeto que ficou conhecido como minirreforma trabalhista. O texto criava modalidades de contratações e mudava normas da CLT. A medida prorrogava o programa de redução de jornada e de suspensão de contratos, alterava regras trabalhistas e criava três novas formas de acesso ao mercado de trabalho.
A origem do projeto é a medida provisória número 1045, de 2021, enviada pelo Palácio do Planalto e que previa, segundo a emenda: "pagamento do Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda (BEm); redução proporcional de jornada de trabalho e de salários; e a suspensão temporária do contrato de trabalho". Essas seriam "medidas complementares para o enfrentamento das consequências da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus no âmbito das relações de trabalho".
Dessa forma, originalmente, a MP criou uma rodada do programa emergencial de redução de jornadas e salários durante a pandemia, o BEm, em abril. No entanto, na votação na Câmara para sua renovação, a medida recebeu uma dezena de adendos dos deputados que instruíram novas formas de contratação e alteraram pontos da CLT.
Reportagem do Correio Braziliense afirma que a Câmara aprovou, "a toque de caixa, uma minirreforma trabalhista, contrabandeada na medida provisória enviada pelo governo para prorrogar o Benefício Emergencial (BEm) e reduzir salários e jornada de trabalho. Mas o texto saiu do Planalto com 35 artigos. Engordou na Câmara dos Deputados para 95, recheado de emendas. Nelas, foram inseridos jabutis que criaram vários regimes de contratação em que as empresas se livram de pagar o FGTS e o INSS".
Os acréscimos ao texto original ? chamados de "jabutis" ? foram feitos pelo relator, o deputado federal Christino Aureo (PP-RJ). Entre as principais mudanças estavam: a criação do Requip, modalidade de trabalho sem carteira assinada, sem direitos trabalhistas e previdenciários, apenas com recebimento de bolsa e vale-transporte; criação de uma modalidade de trabalho sem direito a férias, 13º salário e FGTS; redução do pagamento de horas extras para algumas categorias com jornada reduzida, como bancários, jornalistas e operadores de telemarketing e a inclusão de condições que dificultavam a fiscalização, inclusive em casos de infrações graves, como a do trabalho análogo à escravidão.
No vídeo verificado aqui, postado no dia 23 de agosto, portanto, antes de a MP ser derrotada, o autor insinua que os direitos trabalhistas de todos os trabalhadores seriam retirados se a proposta fosse aprovada. No entanto, isso é enganoso, pois, como explicitado acima, ela eliminaria benefícios nos três formatos de trabalho que cria e de empregados via CLT em casos específicos. Além disso, ela valeria apenas para as novas contratações. Dessa forma, não atingiria aqueles que já estão prestando serviços.
Parte das medidas incluídas foi tentada pelo governo nos primeiros meses de 2020, na medida provisória do "Contrato de Trabalho Verde Amarelo". Como ela não seria aprovada a tempo pelo Congresso e perderia validade, o governo revogou a MP em abril de 2020. Desde então, o governo trabalhava para recriar as medidas. O texto do relator teve apoio da base do governo.
Derrotada no Senado
O Senado votou na quarta-feira (1) a MP 1.045 e rejeitou o projeto que criaria novos programas trabalhistas e impôs uma derrota aos ministros Paulo Guedes (Economia) e Onyx Lorenzoni (Trabalho e Previdência). O texto chegou ao Senado há duas semanas e recebeu quase 200 emendas.
O relator, o senador Confúcio Moura (MDB-RO), que recebeu a função na sexta-feira (27) e passou o fim de semana trabalhando no tema, chegou a retirar alterações na CLT, mantendo os novos programas de emprego. Mas a estratégia não foi suficiente. Por 47 a 27, o plenário do Senado derrubou o pacote trabalhista defendido pelos ministros.
Com a rejeição e o arquivamento da MP, segundo técnicos da Secretaria-Geral da Mesa do Senado, o Congresso deve elaborar um projeto de decreto legislativo para "modular" as relações que já foram firmadas.
Neste caso, o projeto de decreto serviria para dar segurança jurídica aos acordos já celebrados na nova fase do programa de redução de jornadas e salários ou suspensão temporária do contrato de trabalho (BEm).
Com a rejeição, o governo não poderá editar medida provisória com o mesmo teor neste ano.
Críticas
O texto votado nesta semana no Senado recebeu críticas por promover, sem discussão, mudanças permanentes na CLT. A MP divide opiniões de advogados.
Para a advogada Fabíola Marques, doutora em direito do trabalho, a medida é inconstitucional, porque viola direitos mínimos previstos constitucionalmente. "A Constituição Federal de 1988 garantiu que todos os trabalhadores urbanos e rurais tinham direitos, como salário mínimo, FGTS e 13º. Também previu que todos devem ser tratados de forma igualitária, não pode haver distinção em função do tipo de atividade. Quando essa MP cria uma classe de trabalhadores, reduzindo os direitos, ela viola um dos princípios básicos da república que é o princípio da igualdade", explica.
De acordo com Marques, toda a sociedade seria afetada pela MP. "Por exemplo, a fiscalização do Ministério do Trabalho seria flexibilizada e permitiria muito mais possibilidade de descumprimento das regras estabelecidas, como de saúde e segurança do trabalho, porque haveria uma redução nessas observações."
Horácio Conde, presidente da AATSP, acrescenta que "o texto criaria modelos de trabalho que, supostamente, fariam com que as empresas contratassem mais pessoas, mas que, na essência, retirariam os direitos desses trabalhadores". "O que temos criticado é que a medida criaria subcategorias de trabalhadores com menos direitos, e que isso não traz, de fato, emprego. Grosso modo, o que cria emprego é a estabilidade política somada à estabilidade econômica."
Por que investigamos?
Em sua quarta fase, o Comprova checa conteúdos enviados por leitores que falem da pandemia, de políticas públicas ou eleições. Só checamos conteúdos que tenham atingido um alto grau de viralização. O vídeo que foi verificado teve mais de 284 mil visualizações.
O conteúdo é prejudicial por levar a interpretações erradas sobre a minirreforma que foi discutida no Congresso.
Enganoso, para o Comprova, é conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Investigação e verificação
Folha e Piauí participaram desta investigação e a sua verificação, pelo processo de crosscheck, foi realizada pelos veículos O Povo, GZH, Correio de Carajás, A Gazeta, SBT, Estadão e Correio.
Projeto Comprova
Esta reportagem foi elaborada por jornalistas do Projeto Comprova, grupo formado por 33 veículos de imprensa brasileiros, para combater a desinformação. Em 2018, o Comprova monitorou e desmentiu boatos e rumores relacionados à eleição presidencial. A edição de 2019 foi dedicada a combater a desinformação sobre políticas públicas. Agora, na quarta fase, o Comprova retoma o monitoramento e a verificação de conteúdos suspeitos sobre políticas públicas do governo federal e eleições municipais, além de continuar investigando boatos sobre a pandemia de covid-19. O SBT faz parte dessa aliança.
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