Dino: PF apurará se houve desvio de verba pública destinada à saúde indígena
Ministro determinou abertura de inquérito devido à crise social no território Yanomami em Roraima
Guilherme Resck
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, disse que o inquérito da Polícia Federal (PF) anunciado pela pasta no sábado (21.jan) apurará eventual cometimento não apenas do crime de genocídio e de delitos ambientais no território do povo Yanomami, em Roraima, mas também de omissão de socorro aos yanomamis vivendo no local e outros.
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"Porque há inclusive denúncias que nós elencamos no ofício relativos a supostos atos de peculato, corrupção, desvio de verba pública destinada à saúde indígena", complementou o ministro. O documento ao qual se referiu foi enviado nesta 2ª feira (23.jan) à PF e trata-se da ordem de Dino para a corporação abrir o inquérito.
Segundo o ministro, nesta semana, o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, designará os delegados que ficarão responsáveis pela investigação e vai instaurá-la. As declarações foram feitas em coletiva de imprensa concedida, junto à presidente do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), Sheila de Carvalho, pouco depois do término da cerimônia de lançamento do Programa de Atenção e Aceleração de Políticas de Refúgio para Pessoas Afrodescendentes e criação do Observatório Moïse Kabagambe.
O ministro da Justiça e Segurança pública afirmou não ter qualquer dúvida técnica "de que há indícios fortíssimos de materialidade do crime de genocídio" contra o povo Yanomami em Roraima.
"Há denúncias de cerca de 500 crianças que morreram nos últimos anos em áreas indígenas [yanomamis, no estado]. E isso é revelador por si só de uma situação, primeiro, tendente a configuração de genocídio, porque genocídio em termos legais não é apenas matar. Violar a integridade física também é uma forma de genocídio. Violar a integridade mental, dignidade da pessoa, também é uma forma legal da prática. E mais, o que a lei brasileira do genocídio trata é que também quando você busca, com medidas comissivas ou omissivas, ou seja, ações, omissões, levar ao extermínio progressivo de um povo. Ora, assassinar as crianças é uma forma óbvia de conduzir o extermínio de um povo", pontuou.
A possível omissão de socorro a ser apurada pela PF, falou o ministro, teria ocorrido na medida em que há o abandono daqueles yanomamis. "E há denúncias de que os recursos públicos federais, ao longo dos anos, destinados à saúde indígena, não estariam sendo corretamente empregados", complementou. Dino visitou Roraima no último sábado (21.jan), junto ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), devido à crise encontrada no território do povo Yanomami. Na ocasião, disse na coletiva desta 2ª, os integrantes do Governo Federal viram existir "um desmonte das estruturas de atendimento aos indígenas, eles próprios relatam isso. Nós estamos nos referindo, portanto, a milhões de reais que são alocados para essa atividade, mas que não encontraram a eficácia".
Dimensões
O Ministério da Justiça e Segurança Pública trabalhará em três eixos em relação à crise no território Yanomami. O primeiro é o atendimento dos indígenas migrantes e refugiados venezuelanos que se encontram no local, continuidade ou não da Operação Acolhida e em que termos. O segundo é a desintrusão de garimpeiros ilegais em terras indígenas. E o terceiro é a apuração dos crimes. "Quais os crimes possíveis? Genocídio, crimes ambientais, omissão de socorro, peculato, corrupção - no que se refere a recursos públicos. Que irresponsavelmente agentes políticos, agentes públicos no passado fomentaram e agora tentam minimizar, e isto é uma revitimização cruel e inaceitável", falou Dino.
A Polícia Federal, disse, já deu início ao planejamento para o cumprimento das decisões judiciais de desintrusão das terras indígenas yanomamis em Roraima invadidas por garimpo ilegal. A operação é considerada "bastante complexa" pelo ministro, do ponto de vista policial e social, porque haveria em torno de 15 mil garimpeiros ilegais no local. Porém, ele garantiu que "será feita".
O ministro afirmou que, acompanhando Lula na visita no sábado, ouviu de todos os líderes indígenas com quem se reuniu que o garimpo ilegal é um "ensejador em larga medida" da crise social e de saúde no território Yanomami.
Comando do Exército
Outro tema abordado pelo ministro da coletiva foi a troca do comandante do Exército. O general Tomás Ribeiro Miguel Paiva substituiu Júlio César de Arruda no posto. Dino afirmou crer que a mudança "põe um ponto final nesse tema relativo ao dia 8 de janeiro no que se refere a relação as instituições militares e as instituições civis". "E acredito que a tendência, portanto, é de normalização desse relacionamento que é muito bom para o Brasil. Porque precisamos trabalhar unidos em favor eh da nossa nação. Precisamos trabalhar, produzir, ter paz social e acho que esse diálogo entre as instituições militares e civis vai doravante fluir em condições boas. É algo que, particularmente no que se refere ao Ministério da Justiça., nós desejamos, tenho certeza que esse também é o desejo do ministro Múcio [da Defesa]", acrescentou.