Os papéis distintos de Alckmin e Braga Netto
Enquanto o ex-tucano tenta atrair centro na campanha, Braga Netto é um seguro em caso de vitória
Bruna Yamaguti
O general Walter Braga Netto (PL), vice na chapa de Jair Bolsonaro (PL) à Presidência da República, pouco esteve presente ao longo da campanha do presidente à reeleição. Nas últimas duas semanas, após o primeiro turno das eleições, Braga Netto fez apenas duas aparições ao lado do chefe do Executivo. Em apenas uma delas, o companheiro de chapa de Bolsonaro discursou.
Braga Netto esteve junto ao presidente em Belo Horizonte, onde falou com governadores, empresários e representantes da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), no dia 6 de outubro. Outra ocasião, no mesmo dia, foi durante encontro promovido por Bolsonaro com deputados e senadores eleitos no Palácio da Alvorada, em Brasília. A participação do vice, porém, foi discreta. Muitos parlamentares e até a primeira-dama discursaram, mas Braga Netto, não.
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Já Geraldo Alckmin (PSB), vice do canditato do PT ao Palácio do Planalto, Luiz Inácio Lula da Silva, tem participado de forma mais ativa da campanha do ex-presidente. Desde o último dia 2 de outubro, Alckmin esteve ao lado de Lula em ao menos seis eventos, nos quais não apenas marcou presença, mas também discursou a apoiadores, jornalistas ou atores políticos.
Por trás de tal cenário, há uma explicação. Se, por um lado, Alckmin foi escolhido estrategicamente para aproximar Lula do centro e tentar conquistar parte do eleitorado que não votaria no petista, Braga Netto, por outro, tem uma representação distinta na chapa de Bolsonaro.
É o que explica o cientista político André César, da Universidade de Campinas (Unicamp). "O Alckmin de fato tem aparecido muito mais do que o Braga Netto. Primeiro porque ele foi governador de São Paulo e candidato à Presidência da República por duas vezes. É uma figura conhecida e tem esse peso de buscar o eleitor para o centro. Por isso que Lula tenta apresentá-lo mais, citá-lo e estar sempre junto dele", diz.
"Já no caso do Braga Netto, ele na verdade dá mais lastro, dá mais segurança entre os militares. Bolsonaro optou pelo Braga Netto até por questões de medo de uma tentativa de impeachment, de algum golpe num eventual segundo mandato. Braga Netto também tem muita afinidade com ele [Bolsonaro], mas não é um político. Nesse sentido, sua participação é muito mais discreta", ressalta o especialista.
Escudo
A confirmação da chapa de Bolsonaro com Braga Netto mostrou que o que prevaleceu foi a vontade pessoal do presidente e não a articulação dos partidos aliados que queriam um nome político para a composição, e não, de novo, um militar. Havia ainda expectativa para que Bolsonaro escolhesse uma mulher para ser sua vice e atrair, assim, o eleitorado feminino.
No entanto, o objetivo de Bolsonaro na escolha de chapa, diferentemente de Lula, não era conquistar votos ou atrair setores econômicos. "Bolsonaro e seu entorno, sua família inclusive, têm esse receio de que ele possa ser vítima de alguma movimentação contra ele em algum momento do segundo mandato. Eles têm em mente a questão do Temer com a Dilma", explica o cientista político.
"Então para evitar isso, há o Braga Netto, com esse perfil de absoluta confiança de Bolsonaro. E tem a coisa da hierarquia do exército, nesse sentido das Forças Armadas, ele entra para 'blindar' seus aliados", diz.
Ex-ministro da Defesa no governo Bolsonaro, Braga Netto afirmou estar junto do chefe do Executivo na reeleição para a manutenção de valores que o militar considera fundamentais para a sociedade. "Nós estamos juntos porque os nossos valores, meu e do presidente, são os mesmos, pátria, família, religião. O que é mais importante é que esses valores sejam mantidos", afirmou.
"Eu escolhi, sim, um general do exército brasileiro, que vocês o conhecem muito bem por ocasião da intervenção aqui no Rio de Janeiro, que fez um trabalho fantástico no RJ", disse Bolsonaro em julho deste ano.
Voto de confiança
Antigos adversários políticos, o ex-presidente Lula e o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin oficializaram a chapa em agosto deste ano. A união desagradou alguns setores da esquerda, já que o ex-tucano foi crítico do petista em eleições passadas. Mas o movimento de Lula ao trazer Alckmin para o seu lado faz parte da estratégia para ter o voto de confiança, sobretudo, de empresários e outras camadas mais ao centro do eleitorado.
"Nenhum partido governa sozinho. Por isso que o vice e o presidente, em geral, são de partidos diferentes, para ampliar o arco de alianças", explica Adriana Marques, cientista política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). "Foi o que Lula fez nos seus primeiros mandatos, escolheu para ser seu vice-presidente um empresário, fazendo um aceno para a centro-direita. E o Alckmin agora também cumpre esse papel", destaca.
Em 2002 e em 2006, o vice na chapa de Lula era José de Alencar (1931-2011), empresário filiado, à época, ao Partido Republicano Brasileiro (PRB).
"Isso é também uma outra distinção em relação à escolha do Braga Netto. Veja que Bolsonaro não teve essa preocupação de ampliar o arco de alianças, tanto que Braga Netto se filiou ao PL. Então o atual presidente não trabalha com a lógica de compor um arco amplo de alianças. Ele aposta em outras coisas", pontua.