Além de Alckmin, Lula promete mais surpresas aos petistas
Ex-presidente manda recado aos insatisfeitos do partido com a negociação aberta com o ex-governador tucano
Durante uma reunião realizada há duas semanas com caciques petistas, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi duro ao reagir aos comentários sobre os avanços da conversa com Geraldo Alckmin, ex-governador paulista que está prestes a deixar o ninho tucano: "Vocês não têm a menor ideia de com quem eu ando conversando", disse o chefe do PT para espanto dos líderes partidários.
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A resposta, em tom de provocação, deixa claro o poder de decisão de Lula sobre o partido. Em outras palavras, o ex-presidente estabeleceu: não adianta chiadeira, a composição da chapa -- e os acertos regionais -- para a candidatura ao Planalto será uma decisão pessoal, e nos próximos meses podem vir mais surpresas. Com a chegada das eleições, o pragmatismo político toma corpo.
Alckmin apareceu no horizonte de Lula -- ou vice-versa -- há seis meses, por obra e graça de Gilberto Kassab, criador e dono do PSD. O ex-prefeito de São Paulo até ali deixava claro que o partido não teria candidato ao Planalto, estando aberto a ampla negociação com Lula e com Alckmin. Parecia agradar aos dois senhores, mas as conversas inciais foram interrompidas com a entrada do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, no PSD.
A pretensão de Pacheco de tentar o Planalto afastou Alckmin do PSD -- por mais que o presidente do Senado garanta que estará na disputa ao Executivo federal em 2022, a aposta é que a campanha dele termina antes mesmo de começar, em março do próximo ano. A dificuldade de Pacheco está em convencer filiados do Nordeste em apoiá-lo, abrindo mão de aparecer na foto com Lula, que tem popularidade na região, principalmente em Pernambuco e na Bahia.
O movimento de Pacheco, entretanto, acabou trazendo um novo personagem para o enredo: o também ex-governador de São Paulo, Márcio França, do PSB. Ex-vice de Alckmin no estado, França quer disputar o governo de São Paulo. Assim, estimula que o ainda hoje tucano troque o PSDB pelo PSB. A aliança levaria o ex-prefeito Fernando Haddad (PT) a disputar uma vaga ao Senado, França ao governo e Alckmin à vice-presidência.
"Nas conversas iniciais, Alckmin e Lula concordaram em vários pontos, principalmente nas críticas ao governo Jair Bolsonaro", disse ao SBT News um senador petista. As tentativas de acordo acabam sendo divulgadas na impresa estrategicamente numa espécie de testagem. Um dos últimos encontros acabou sendo publicado antes do tempo e foi abortado, mas está prevista ao menos mais uma reunião até o final do ano.
Lula se convenceu da necessidade de ter um vice para além da esquerda, reeditando a dobradinha com José Alencar (1931-2011), político e empresário mineiro, que deu sustentação ao petista no avanço de apoios entre conservadores do setor financeiro e dos negócios. O ex-presidente também não quer repetir o erro da campanha de Fernando Haddad, em 2018, que colocou como vice Manuela D'Ávila (PCdoB), que não agregou um único voto à chapa e acabou sendo alvo de fake news.
Lula tem dito a interlocutores que Alckmin seria capaz de ampliar os apoios pricipalmente no interior de São Paulo, onde é bem votado. Além disso o ex-governador é religioso -- no caso, católico -- e conservador. Mesmo que um vice não seja fundamental na história política brasileira, sinaliza para os agentes políticos que Lula quer ampliar o arco de alianças.
Para Alckmin, a vantagem é que ele voltaria ao cenário nacional, se cacifando para uma eventual candidatura principal em 2026, quando estaria com 75 anos -- Lula, hoje, tem 76 anos. Mas aí teria de abrir mão da tentativa de se reeleger governador de São Paulo, algo que ainda não decidiu.
Caciques do PSB aceitaram a ida de Alckmin para partido, e a hipótese de lançá-lo como vice na chapa de Lula. Mas, como prerrogativa, o ex-prefeito Fernando Haddad deve desistir de sua candidatura ao Palácio dos Bandeirantes para apoiar França ao governo de São Paulo. Haddad, então, se lançaria como candidato ao Senado. Além disso, o PSB quer ter candidatos com apoio do PT no Rio, Pernambuco, Espírito Santo e Rio Grande do Sul.
Para dirigentes do PT, a condição dos caciques do PSB não é um "empecilho" para fechar acordo, uma vez que entendem como necessária a eleição de um nome mais petista à bancada paulista para um eventual governo Lula em 2023.