"Temos orgulho de pagar mais impostos", dizem super ricos
Herdeiros, empresários e artistas pedem que líderes taxem grandes fortunas; saiba quem é o único brasileiro a assinar lista
Um grupo de super ricos do mundo mandou uma mensagem para o Fórum Econômico Mundial, em Davos: "Líderes eleitos devem nos taxar, os super ricos. Nós ficaríamos orgulhosos de pagar mais". A carta, batizada de "Proud to pay more" (Orgulhosos de pagar mais), foi assinada até esta sexta (19) por 268 multimilionários do mundo, entre eles vários herdeiros de grandes empresas, como Ise Bosch, herdeira da Bosch, Abigail Disney, da Disney, além de Valerie Rockefeller, da célebre família norte-americana, e figuras como Brian Cox, ator da série "Sucession", que aborda a vida de uma família de magnatas da mídia.
Entre os signatários há apenas um brasileiro, João Paulo Pacífico. Fundador do Grupo Gaia, de investimentos, Pacífico ficou conhecido por lançar títulos – Certificados de Recebimento do Agronegócio (CRAs) – na Bolsa de Valores para levantar recursos para o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, o MST. Em 2021, os títulos emitidos pelo Grupo Gaia para o movimento chegaram a R$ 17,5 milhões, destinados a sete cooperativas. Os investidores recebem o investimento de volta com juros e correção, como em outras aplicações.
+Vencedor do Nobel de Economia defende elevar taxação de mais ricos
Pacífico também doou a própria empresa e a transformou numa ONG de impacto social. "Quero ter dinheiro e trabalhar, mas não quero mais ser dono. Serei o diretor da ONG, receberei salário, mas todo lucro passará a ser investido em impacto social e ambiental. Também sou contra a ideia de minhas filhas nascerem donas - terão toda condição possível, mas não herdarão a empresa", disse em entrevista ao UOL.
João Paulo Pacífico também deu uma palestra no TEDx sobre o tipo de liderança que o mundo precisa.
Taxação de grandes fortunas
No Brasil, o aumento da cobrança de impostos dos mais ricos é um dos temas da reforma tributária, além da simplificação do sistema. Em dezembro de 2023, o governo federal sancionou a taxação de fundos offshore e exclusivos, também chamados de fundos dos super-ricos.
+Como a reforma tributária atinge o nosso bolso
Neste ano, a segunda parte da reforma deve discutir mudanças no Imposto de Renda para que haja uma cobrança maior dos super ricos. Um dos fundamentos para um sistema tributário mais justo, segundo especialistas, é aumentar o imposto sobre a renda – pago individualmente de acordo com os ganhos de cada um – e reduzir a taxação sobre os bens de consumo – que cobra um mesmo preço de todos, independentemente da renda.
Leia a íntegra carta dos super ricos para os líderes de Davos:
"Estamos surpresos por vocês não terem respondido a uma pergunta simples que fazemos há três anos: quando vocês irão taxar a riqueza extrema? Se os representantes eleitos das principais economias do mundo não tomarem medidas para enfrentar o dramático aumento da desigualdade econômica, as consequências continuarão a ser catastróficas para a sociedade.
Nossa busca por impostos mais justos não é radical. Pelo contrário, é uma demanda por um retorno à normalidade baseado em uma avaliação sóbria das condições econômicas atuais. Somos as pessoas que investem em startups, moldam mercados de ações, fazem crescer os negócios e promovem um crescimento econômico sustentável. Também somos as pessoas que mais se beneficiam do status quo. Mas a desigualdade atingiu um ponto de inflexão, e seu custo para nossa estabilidade econômica, social e ecológica é grave – e cresce a cada dia. Em resumo, precisamos de ação agora.
Nosso pedido é simples: pedimos a vocês que nos tributem, os mais ricos da sociedade. Isso não alterará fundamentalmente nosso padrão de vida, nem privará nossos filhos, nem prejudicará o crescimento econômico de nossas nações. Mas transformará a riqueza privada extrema e improdutiva em um investimento para o nosso futuro democrático comum.
A solução para isso não pode ser encontrada em doações pontuais ou em filantropia; a ação individual não pode corrigir o atual desequilíbrio colossal. Precisamos de nossos governos e nossos governantes para liderar. E, assim, voltamos a vocês novamente com o pedido urgente de que ajam – unilateralmente no nível nacional e em conjunto no cenário internacional.
Cada momento de atraso consolida o perigoso status quo econômico, ameaça nossas normas democráticas e transfere a responsabilidade para nossos filhos e netos. Não queremos apenas ser mais taxados, mas acreditamos que devemos ser mais taxados. Ficaríamos orgulhosos de viver em países onde isso é esperado, e orgulhosos de líderes eleitos que constroem futuros melhores. Como os membros mais ricos da sociedade, ficaríamos:
Orgulhosos de pagar mais para combater a desigualdade extrema.
Orgulhosos de pagar mais para ajudar a reduzir o custo de vida para os trabalhadores.
Orgulhosos de pagar mais para educar melhor a próxima geração.
Orgulhosos de pagar mais por sistemas de saúde resilientes.
Orgulhosos de pagar mais por uma infraestrutura melhor.
Orgulhosos de pagar mais por uma transição verde.
Orgulhosos de pagar mais impostos sobre nossa riqueza extrema.
O valor de sistemas tributários mais justos deveria ser evidente por si mesmo. Todos sabemos que a "economia do derramamento" não se traduziu em realidade. Em vez disso, nos deu salários estagnados, infraestrutura deteriorada, serviços públicos falhos e desestabilizou a instituição da democracia. Criou um sistema econômico vergonhoso incapaz de proporcionar um futuro mais brilhante e sustentável. Esses desafios só piorarão se vocês não enfrentarem a desigualdade extrema de riqueza.
A verdadeira medida de uma sociedade pode ser encontrada não apenas em como ela trata seus mais vulneráveis, mas no que ela pede aos seus membros mais ricos. Nosso futuro é de orgulho fiscal ou vergonha econômica. Essa é a escolha.
Pedimos a vocês que deem esse passo necessário e inevitável antes que seja tarde demais. Faça seus países se orgulharem. Taxem a riqueza extrema.
Atenciosamente,
Os signatários"