Lula defende desdolarização de transações entre países do Brics
Proposta visa facilitar transações comerciais entre países do grupo e refletir nova ordem mundial
Durante a reunião do Brics nesta quarta-feira (23), o presidente Lula defendeu a necessidade de criar uma moeda alternativa ao dólar para transações comerciais entre os países do grupo, que inclui Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, além de Egito, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Irã.
O tema já era discutido por China e Rússia, e esteve na pauta do encontro, na terça-feira (22), entre Vladimir Putin e Dilma Rousseff, presidente do Banco do Brics.
Em seu discurso, Lula afirmou: "agora é chegada a hora de avançar na criação de um meio de pagamento alternativo para transações entre nossos países. Não se trata de substituir nossas moedas, mas é preciso trabalhar para que a ordem multipolar que almejamos se reflita nos sistemas financeiros internacionais".
A proposta tem como objetivo a "desdolarização", ou seja, a redução da dependência do dólar em transações comerciais.
O que isso muda no preço dos produtos?
Atualmente, as taxas bancárias são aplicadas duas vezes durante as conversões de moedas. O real é convertido em dólar antes de ser trocado pela moeda do país onde se faz o comércio, resultando em duas taxas. Com a desdolarização, essa taxa seria aplicada apenas uma vez, o que poderia reduzir o custo final dos produtos.
No entanto, Roberto Dumas, professor de economia do Insper, destaca as dificuldades práticas: "do lado de quem importa, é ótimo pagar em reais. Mas a outra parte, a economia do outro país, terá que aceitar moedas como a da Etiópia ou da Rússia, que sofre sanções. Aceitar o yuan chinês, ou até moedas de países como o Afeganistão. A questão é: o que fazer com essas moedas?".
Essa complexidade faz com que, no curto prazo, apenas alguns países do BRICS, como Irã e Rússia, tenham vantagens na proposta. Esses países, com moedas sancionadas, poderiam escapar das restrições financeiras impostas por nações ocidentais.
Além disso, a proposta carrega um peso ideológico. Uriã Fancelli, analista de política internacional, aponta que esses países, historicamente críticos aos EUA, enxergam o uso do dólar como uma humilhação, intensificando o desejo de se livrar da moeda estadunidense.
Para o Brasil, de acordo com Dumas, o papel é estratégico: país pode influenciar a governança e ter poder de veto em decisões importantes do grupo.