Economia

As 5 forças que vão moldar as marcas mais bem-sucedidas em 2026

Novo relatório da Dentsu Creative mostra como IA, escapismo, vida analógica e novas formas de conexão redefinem estratégias de marca

Imagem da noticia As 5 forças que vão moldar as marcas mais bem-sucedidas em 2026
Bonecos como Labubu ilustram a 'cuteificação' da cultura e o uso do lúdico como forma de alívio emocional em um cenário de incertezas ( VCG/VCG/Getty Images)

Em um cenário em que a inteligência artificial avança mais rápido do que qualquer tecnologia anterior, as marcas mais bem-sucedidas em 2026 não serão as que apenas dominam ferramentas digitais, mas aquelas capazes de equilibrar eficiência tecnológica e inteligência emocional. Esse é o diagnóstico do relatório Generative Realities (Realidades Generativas, na traduçã0), lançado pela Dentsu Creative.

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A pesquisa analisa cinco forças culturais e comerciais que devem influenciar o comportamento do consumidor no próximo ano, com base em entrevistas com 4.500 pessoas em sete mercados: Estados Unidos, Reino Unido, Índia, Espanha, Brasil, China e Japão. Os dados foram coletados entre 25 de outubro e 4 de novembro de 2025, por meio da plataforma de pesquisa online Toluna, com painéis nacionalmente representativos em cada país.

O relatório aponta para uma nova fase de reconfiguração da relação com a tecnologia marcada por fricções simultâneas: o desejo pelo hiper-real convive com a valorização do analógico e do feito à mão; a aceleração digital avança ao mesmo tempo em que cresce o cansaço com a lógica algorítmica e o interesse por desaceleração.

"Ao olhar para as tendências de 2026 vemos um movimento claro de tensão e ajuste entre a aceleração tecnológica e a busca por experiências mais tangíveis humanas e presentes", diz Marília Gallindo, diretora de estratégia da Dentsu Brasil.

Dados do estudo indicam que 53% das pessoas já usam plataformas de chat com IA em suas vidas pessoais — percentual que chega a 70% entre a Geração Z. Ao mesmo tempo, 55% dizem estar cansados de algoritmos que recomendam sempre conteúdos semelhantes, e 50% afirmam tentar reduzir o tempo de tela. Para 40% dos entrevistados, o ambiente online é tão estressante que a estratégia é se desconectar ao máximo, índice que sobe para 45% entre a Geração Z.

Bonecos colecionáveis vendidos a preços elevados, raves durante o dia, clubes de xadrez frequentados por jovens e uma avalanche de tendências que surgem e desaparecem no ritmo dos algoritmos compõem esse cenário fragmentado. O efeito é uma dificuldade crescente de separar o que é passageiro do que sinaliza mudanças estruturais. Antes mesmo de compreender a diferença entre Labubu e 'delulu', gíria derivada de delusional, o feed já se desloca para outro tema, com impacto direto sobre ideias, comportamentos e padrões de consumo.

"Não à toa, muitas das tendências já aparecem de forma concreta nos feeds, na rotina e no consumo — a ponto de objetos simples, como as canetas Bobbie Goods, estarem à frente do iPhone na lista de presentes mais desejados para esse Natal", afirma Gallindo. "O desafio para marcas e negócios estará justamente em capturar essas oportunidades em larga escala sem ignorar e até estimulando momentos de pausa e maior presença humana.”

PBonecos como Labubu ilustram a 'cuteificação' da cultura e o uso do lúdico como forma de alívio emocional em um cenário de incertezas | VCG/VCG/Getty Images
PBonecos como Labubu ilustram a 'cuteificação' da cultura e o uso do lúdico como forma de alívio emocional em um cenário de incertezas | VCG/VCG/Getty Images

Quando tudo vira tendência

Desenvolvido sob a liderança de Pats McDonald, chief strategy officer global da Dentsu Creative e presidente do júri de Creative Strategy no Cannes Lions 2025, o Generative Realities conta com a colaboração de estrategistas da rede global da empresa e descreve um cenário em que exaustão e interesse pelas transformações tecnológicas coexistem, impulsionando a busca por escapismo, reconexão e maior senso de controle.

A aceleração da inteligência artificial generativa e a demanda constante por novos conteúdos intensificaram um ciclo rápido de criação, imitação e memetização. Nesse ambiente, muitas tendências parecem descartáveis. O relatório descreve a sensação de um “tempo quase surreal”, em que imaginação e experiência concreta passam a se confundir.

Segundo a Dentsu, esses sinais não surgem ao acaso. Eles refletem tensões sociais persistentes que atravessam diferentes expressões culturais. A crise do custo de vida, por exemplo, segue afastando marcos tradicionais da vida adulta, sobretudo entre os mais jovens, o que ajuda a explicar a busca por conforto em colecionáveis e o investimento emocional em fandoms e comunidades de interesse.

Ao mesmo tempo, o enfraquecimento do senso de conexão social e a redução dos chamados terceiros espaços — ambientes de convivência além de casa e trabalho — alimentam a procura por novas formas de estar junto. Raves diurnas e encontros em torno de hobbies surgem como alternativas mais acessíveis, com menor consumo de álcool e foco na experiência compartilhada.

Entre o algoritmo e o afeto

A complexidade dessas tensões também aparece na relação com a tecnologia. De um lado, avançam vínculos intensos com chatbots e influenciadores virtuais. De outro, cresce o interesse por conteúdos mais lentos, reflexivos e por tecnologias analógicas associadas a gerações anteriores. A nostalgia dos anos 1990, aponta o relatório, reflete tanto a busca por um repertório cultural comum quanto a percepção de um período visto como mais simples e otimista.

O desejo por pertencimento e estabilidade também ajuda a explicar o retorno a valores tradicionais, à religião e à espiritualidade. Rituais ganham espaço, assim como o interesse por fungos, fermentação e conservas, práticas associadas a conforto, autonomia e redução de custos.

Embora a crise climática tenha perdido visibilidade nas agendas de marca em 2025, de acordo com o estudo, há um movimento de reconexão com a natureza e de deslocamento para fora dos grandes centros urbanos. Em paralelo, emerge uma relação ambivalente com a cultura do bem-estar. Enquanto parte da elite persegue a longevidade extrema, outros hábitos reaparecem, como bebidas açucaradas, bronzeamento artificial e soluções rápidas para controle de apetite.

Nesse ambiente de forças contraditórias, o relatório observa ainda uma reação ao funcionamento do ecossistema midiático atual. Consumidores demonstram cansaço diante da repetição algorítmica e da estética excessivamente polida, abrindo espaço para um movimento anti-algoritmo na moda, nos relacionamentos e na cultura.

5 macrotemas para 2026 e além

É nesse cruzamento entre tendências, contra-tendências e forças estruturais que a Dentsu organiza cinco macrotemas, cada um sustentado por três subtemas.

Mais do que antecipar modismos, o relatório propõe um mapa para orientar decisões estratégicas das marcas, desbloquear novas possibilidades criativas e construir conexões emocionais mais profundas com os consumidores em 2026 e além.

1. Escape Velocity: a economia da “fofura” e o refúgio no lúdico

Escape Velocity descreve a busca crescente por escapismo emocional estruturado em um mundo percebido como caro, instável e psicologicamente exaustivo para muitas gerações. Com marcos tradicionais da vida adulta como casa própria, estabilidade financeira e filhos cada vez mais fora de alcance, especialmente para millennials e Gen Z, o consumo passa a operar como refúgio simbólico.

Não se trata apenas de nostalgia ou colecionismo, mas de uma tentativa de recuperar controle, conforto e identidade por meio de universos ficcionais, objetos afetivos, fandoms e estéticas “fofas”. O relatório aponta que essa “cuteificação” da cultura mistura ternura e estranhamento, funcionando como resposta à ansiedade coletiva, à perda de confiança em instituições e ao custo de vida elevado. O escapismo, aqui, não é fuga passiva, mas uma forma de resistência emocional.

O dado

As vendas de brinquedos para adultos cresceram 18% ano a ano nos Estados Unidos. A Jellycat, marca de pelúcias, registrou alta de 66% na receita, alcançando £333 milhões no período analisado.

O insight

O consumo vai além do colecionismo. 70% dos entrevistados globalmente afirmam que a vida moderna é tão estressante que, às vezes, precisam 'escapar', índice que sobe para 80% entre a Geração Z.

A “cuteificação” da cultura

O relatório aponta a 'fofura' como estratégia de sobrevivência emocional. 63% dizem que produtos e embalagens fofos trazem uma alegria necessária e 36% afirmam que se definem pelos fandoms dos quais fazem parte. Colecionáveis funcionam como objetos de conforto, identidade e pertencimento.

Isso explica a popularidade de bonecos como Labubu, blind boxes e charms colecionáveis, com adultos chegando a gastar até US$ 270 por semana em busca de itens raros.

Exemplos de marcas e ações

Jellycat: transformou pelúcias em objetos de desejo adulto, com ativações premium, pop-ups e colaborações de alto valor simbólico, como a Jellycat Airlines com a Harrods.

Crocs: expandiu o uso de “charms” como linguagem de autoexpressão, em parcerias com marcas de moda, entretenimento e games.

Fenty Beauty + Arcane: produtos inspirados em personagens de animação, conectando maquiagem a universos ficcionais e fandoms.

7-Eleven + Hot Wheels: campanha imersiva com colecionáveis, experiências físicas e produtos exclusivos, transformando varejo em playground cultural.

Starbucks: adoção de estratégias de blind box e produtos colecionáveis para gerar escassez, desejo e engajamento.

Oportunidade para marcas

Marcas, inclusive de luxo e FMCG (bens de consumo), podem usar o lúdico não apenas como estética, mas como plataforma estratégica de construção de fandoms, IPs próprios, personagens e símbolos, criando vínculos emocionais duradouros. Explorar colecionáveis, edições limitadas e collabs como ferramentas de vínculo emocional.

Crocs expandiu o uso de “charms” como linguagem de autoexpressão | Divulgação
Crocs expandiu o uso de “charms” como linguagem de autoexpressão | Divulgação

2. Electric Dreams: o amor e ódio na era da IA

Electric Dreams explora a relação cada vez mais emocional, íntima e ambígua entre pessoas e inteligência artificial. À medida que a IA se torna onipresente, ela deixa de ser apenas ferramenta produtiva e passa a ocupar espaços de aconselhamento, companhia e até afeto.

Ao mesmo tempo, essa aceleração gera desconfiança, fadiga e rejeição ao excesso de conteúdos genéricos, repetitivos e sem autoria clara — o chamado “slop”. O macrotema revela um paradoxo: consumidores recorrem à IA para apoio pessoal, mas também buscam mais humanidade, curadoria e profundidade como contrapeso à automação.

A “situationship” com a IA

O uso varia por geração. Enquanto 73% dos Boomers usam IA para suporte prático, a Geração Z se destaca no uso emocional: 25% recorrem à IA para se sentir menos sozinhos ou apenas para serem ouvidos.

Dados sensíveis

32% dos consumidores globais dizem que seu chatbot de IA os entende melhor do que amigos ou familiares. Ainda assim, apenas 46% confiam que conseguem identificar conteúdo gerado por IA.

A resistência ao “slop”

Cresce a rejeição ao conteúdo descartável. 54% da Geração Z afirmam buscar conteúdos mais lentos e gratificantes como resposta a feeds saturados por automação.

Exemplos de marcas e ações

Nike: aposta em newsletters e conteúdos aprofundados no Substack, priorizando engajamento lento e contextualizado.

Belmond (Orient Express): vídeos longos e contemplativos que funcionam como antídoto ao consumo rápido de conteúdo.

Canon Brasil: campanha “No Click, No Prompt”, posicionando o olhar humano como diferencial criativo.

Aerie: compromisso público de não usar corpos ou pessoas gerados por IA em suas comunicações.

Kombucha Counter Culture: linguagem explícita de “feito por humanos” como valor de marca.

Oportunidade para marcas

Comunicar transparência no uso da tecnologia como ativo de confiança. O uso indiscriminado de IA para escalar conteúdo barato tende a gerar rejeição. O diferencial passa a ser curadoria, autoria, atrito saudável e sensibilidade humana como diferenciais competitivos. Usar IA para eficiência sem abrir mão de identidade, emoção e ética.

Nike aposta em newsletters e conteúdos aprofundados no Substack | Thiago Prudencio/SOPA Images/Getty Images
Nike aposta em newsletters e conteúdos aprofundados no Substack | Thiago Prudencio/SOPA Images/Getty Images

3. Trad Lives: o retorno às raízes, à terra e à espiritualidade

Em um cenário de instabilidade econômica, geopolítica e climática, cresce o desejo por certeza, pertencimento e ritmos mais previsíveis. O relatório aponta para um movimento de reancoragem cultural. Consumidores buscam estabilidade emocional e sentido por meio da natureza, do local, da espiritualidade e de valores tradicionais. O campo, as pequenas cidades e os rituais cotidianos ganham novo status aspiracional.

Esse retorno ao “tradicional” não é conservador no sentido clássico: ele convive com tecnologia, inovação e estética contemporânea. Trata-se menos de rejeitar o progresso e mais de reconstruir pertencimento, ritmo e propósito.

A busca pelo campo

75% dos entrevistados globais dizem querer passar mais tempo na natureza. No Reino Unido, a National Trust registrou alta de 39% entre membros de 18 a 25 anos.

Espiritualidade e valores

64% se dizem atraídos por valores e modos de vida tradicionais, e 52% afirmam explorar mais a espiritualidade à medida que a vida parece mais incerta. No Brasil, 82% se dizem atraídos por mais tempo ao ar livre e 68% exploram espiritualidade.

O hiperlocal

A aspiração se desloca para perto. 58% preferem explorar partes desconhecidas do próprio país a viajar para o exterior.

Exemplos de marcas e ações

Sweetgreen: apoio a jovens agricultores e estética ligada ao campo.

Spotify (BloomBeats): identidade visual generativa inspirada em flores e elementos naturais.

Pandora e De Beers: joias reposicionadas como talismãs e objetos de significado.

Walmart Canadá: parcerias com fazendas urbanas e produção hiperlocal.

Museus e centros culturais: exposições focadas em solo, fungos e natureza como temas centrais.

Oportunidade para marcas

Criar pausas e experiências que tragam sensação de aterramento. Trabalhar espiritualidade, natureza e tradição com cuidado cultural e autenticidade. Produtos e experiências baseados em rituais, origem, território, fermentação e vida local ganham relevância. Pensar além dos grandes centros urbanos.

Pandora Talisman: coleção inspirada em moedas antigas | Pandora/Divulgação
Pandora Talisman: coleção inspirada em moedas antigas | Pandora/Divulgação

4. Alone Together: a crise da conexão e os novos 'terceiros lugares'

Alone Together parte do paradoxo da hiperconectividade: nunca estivemos tão conectados digitalmente — e tão sozinhos. A solidão se torna um fenômeno estrutural. O macrotema aponta para o enfraquecimento dos espaços tradicionais de socialização, como bares, clubes e pubs, e o surgimento de novos formatos de encontro, mais inclusivos e menos centrados em álcool, consumo excessivo ou performance social.

Nesse cenário fragmentado, criadores, comunidades de interesse e marcas passam a funcionar como infraestrutura social, ajudando pessoas a se encontrarem, mesmo que “sozinhas juntas”.

A solidão em números

63% dos consumidores globais dizem passar muito tempo sozinhos. Outros 38% se declaram frequentemente solitários — índice que chega a 46% no Brasil e a 50% entre a Geração Z. Além disso, 50% afirmam não conhecer seus vizinhos.

O declínio do pub

37% evitam álcool e têm dificuldade de socializar em bares tradicionais; entre a Geração Z, o número sobe para 50%.

Novas formas de socializar

Crescem clubes de corrida, leitura silenciosa, cerâmica, xadrez e raves diurnas movidas a café, em resposta à busca por encontros menos centrados em álcool e com menor pressão social. Metade dos consumidores (50%) afirma ter interesse em formas alternativas de socialização presencial, enquanto 53% dizem valorizar marcas que se conectam de maneira relevante às comunidades das quais fazem parte.

Exemplos de marcas e ações

Silent Book Club: encontros presenciais sem obrigação de interação.

Asahi (Sumadori): bares inclusivos para quem bebe e quem não bebe.

Skittles + Meetup: apoio a comunidades LGBTQIA+ por meio de encontros reais.

Lush: parcerias com coletivos focados em experiências offline.

Cafés, clubes de xadrez, cerâmica e knitting: retomados como espaços sociais.

Oportunidade para marcas

As marcas podem atuar como facilitadoras de encontros, e não apenas como patrocinadoras, assumindo o papel de infraestrutura social. Ao criar ou apoiar novos third spaces (terceiros espaços), ajudam a preencher o vazio deixado pelo declínio da vida noturna tradicional e a reconstruir laços comunitários. A oportunidade está em desenvolver experiências sociais de baixo atrito e baixa pressão, investir em comunidades reais — e não apenas audiências digitais — e compreender os creators como conectores culturais, mais do que simples canais de mídia.

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