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Prefeito de São Paulo não proibiu hidroxicloroquina e usou azitromicina no tratamento da covid-19

FALSO: Ao contrário do que afirmam publicações nas redes sociais, a prefeitura de São Paulo nunca proibiu o uso de cloroquina, nem de sua forma menos tóxica, a hidroxicloroquina

Prefeito de São Paulo não proibiu hidroxicloroquina e usou azitromicina no tratamento da covid-19
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Conteúdo verificado: Texto compartilhado por Facebook e Twitter acusando o prefeito de São Paulo, Bruno Covas, de deixar `muita gente morrer a (sic) míngua` ao `proibir a Hidroxicloroquina` e depois `confessar à mídia que fez uso do remédio que negou ao povo?`

Uma publicação com informações falsas sobre o prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), viralizou no Twitter e no Facebook esta semana. Um dos perfis é de uma usuária que usa o apelido de `Tubaína Paschoal` e uma foto da deputada estadual Janaína Paschoal (PSL-SP). No post, ela afirma que Covas `deixou muita gente morrer a (sic) míngua ao proibir a hidroxicloroquina`, mas que o prefeito teria usado o medicamento para tratar a covid-19 quando foi infectado. A outra postagem, com o mesmo texto, é de uma conta que usa a foto, o nome e se descreve como uma `homenagem` ao general reformado Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional do Planalto, no Facebook.

Nenhuma das informações é verdadeira. A prefeitura de São Paulo nunca proibiu o uso de cloroquina, nem de sua forma menos tóxica, a hidroxicloroquina. O protocolo de atendimento de covid-19 no município, anunciado em 9 de abril, recomenda que o uso do medicamento seja feito com prescrição médica e consentimento do paciente ou da família. Uma recomendação técnica da Secretaria Municipal da Saúde, publicada em 17 de junho, lembra que ainda não existe um medicamento específico para o tratamento da covid-19. E, como não há evidências científicas que justifiquem o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina contra o novo coronavírus, o uso deve ser evitado em pacientes com sintomas leves.

Bruno Covas, de 40 anos, anunciou que estava com covid-19 no dia 13 de junho. O prefeito, que trata um câncer no sistema digestivo, recebeu o diagnóstico depois de um exame de rotina. Em sua conta oficial no Instagram, afirmou que não teve sintomas como febre, dor ou falta de ar e que passaria dez dias isolado, trabalhando de casa. No dia 15, Covas publicou um vídeo em que esclareceu que, mesmo assintomático, estava tomando o antibiótico azitromicina por recomendação médica. `Remédio não é de esquerda ou de direita. Lamento que alguns queiram politizar a escolha do medicamento`, disse. No dia 24, mais uma vez numa mensagem gravada, Covas anunciou que estava recuperado e voltaria ao trabalho presencialmente na prefeitura.

Como verificamos?

Entramos em contato com a assessoria de imprensa da prefeitura de São Paulo para saber sobre o estado de saúde do Bruno Covas, como tinha sido feito o tratamento contra a covid-19 e se ele tinha tomado hidroxicloroquina. Por telefone, fomos informados que os detalhes do tratamento são de caráter pessoal do prefeito. E recebemos a sugestão de buscar as informações nas redes sociais de Bruno Covas. Ele publicou vídeos com atualizações ao longo dos dez dias de isolamento domiciliar.

Buscamos mais informações e documentos técnicos no site da Secretaria Municipal da Saúde, que segue recomendações da Secretaria Estadual da Saúde e do Ministério da Saúde.

Em seguida, levantamos quais foram os primeiros estudos a sugerir o uso de cloroquina e hidroxicloroquina em pacientes com a covid-19 e que revisões foram feitas sobre eles. Também consultamos documentos da Casa Branca e do Ministério da Saúde para explicar como a droga passou a ser adotada nos Estados Unidos e no Brasil. Buscamos também o posicionamento de entidades médicas sobre o uso do medicamento no país. Procuramos ainda informações sobre os status atuais de estudos sobre uso da droga para tratar a covid-19 conduzidos pela Organização Mundial da Saúde, governo do Reino Unido e pela autoridade sanitária americana.

Por fim, tentamos localizar os autores das publicações no Twitter e no Facebook. Ambos são perfis sem autoria declarada e não verificados. Por isso, não recebem mensagens privadas de desconhecidos. O contato com o perfil Tubaína Paschoal foi tentado por mensagem aberta e não houve resposta de nenhum dos dois até o fechamento desta reportagem. Já a página de homenagem a Augusto Heleno disponibiliza um e-mail e um telefone com prefixo 88, da região de Juazeiro do Norte, no interior do Ceará. Tentamos contato, mas o número estava desligado.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 26 de junho de 2020.

Verificação

O prefeito da capital paulista anunciou que estava com covid-19 no dia 13 de junho. Em um vídeo publicado no Instagram, Bruno Covas disse que depois de quatro testes negativos, dessa vez o resultado foi positivo. `A orientação do meu médico, já que eu não tenho nenhum sintoma, é ficar dentro de casa`, contou. Covas faz tratamento para um câncer no sistema digestivo desde outubro de 2019 e, por isso, faz parte do grupo de risco para novo coronavírus.

Ao longo de dez dias, o prefeito se manteve em isolamento domiciliar, trabalhando a distância. No dia 15, mais uma vez em vídeo, Covas esclareceu que permanecia sem febre, sem dor e sem falta de ar e que, por recomendação médica, estava tomando o antibiótico azitromicina. `Medicação a gente toma aquela prescrita pelo médico. Não se trata de remédio de esquerda nem direita. É lamentável ter que politizar a questão do remédio no país, isso não contribui em nada`, lamentou.

A azitromicina é um medicamento eficaz para o combate a bactérias, e não tem ação documentada contra vírus, como SARS-CoV-2. Associada à hidroxicloroquina, a droga é prescrita, de forma experimental, a pacientes infectados com o novo coronavírus. No caso do prefeito, somente a azitromicina pode servir para evitar infecções bacterianas oportunistas, já que Covas tem o sistema imunológico prejudicado por causa do tratamento contra o câncer. Nesta verificação, publicada pelo Comprova no dia 25 de junho, o médico Erich Vinícius de Paula explica que é difícil ter certeza que junto com o vírus não haja uma infecção bacteriana associada, mas alerta: `É muito importante entender que o antibiótico não é direcionado para tratar do vírus`.

Uso de cloroquina não é proibido

`Até o momento, não há vacina nem medicamento antiviral específico para prevenir ou tratar a covid-19`, explica a Organização Pan-Americana de Saúde, braço da Organização Mundial de Saúde (OMS) para as Américas. Uma das drogas em estudo é a cloroquina, usada para o tratamento de malária e doenças autoimunes como o lúpus (leia mais abaixo).

O texto verificado afirma que o prefeito proibiu a hidroxicloroquina na cidade. Essa informação é falsa. Em 9 de abril, Covas anunciou que a cloroquina passaria a fazer parte do protocolo de atendimento de pacientes diagnosticados com covid-19 no município. `Ainda não é possível ser uma política pública, pois não temos ainda pesquisas concluídas, mas havendo prescrição do médico e a concordância do paciente, a Secretaria Municipal de Saúde passou a integrar esse [a cloroquina] medicamento no protocolo de tratamento da covid-19`, afirmou Covas. Uma recomendação técnica foi publicada em 17 de junho, sugerindo uma `análise criteriosa do quadro clínico, o monitoramento do paciente, da resposta em relação à terapêutica selecionada e as reações adversas`. A prefeitura segue uma orientação da Secretaria Estadual da Saúde de São Paulo, para que a droga não seja prescrita para pacientes com casos leves. E, assim como sugere o Ministério da Saúde, a indicação deve ser feita por um médico com autorização do pacientes ou da família.

Cloroquina: o que dizem estudos e autoridades?

A cloroquina já havia sido considerada para tratamento de infecções de coronavírus após as epidemias de SARS e MERS. Mas, na época, não foram feitos testes clínicos em humanos para confirmar a eficácia da droga.

Em março deste ano, após a covid-19 ter sido declarada uma pandemia pela OMS, um estudo conduzido por médicos do Sul da França se tornou viral ao sugerir que a cloroquina poderia ser usada como tratamento para o SARS-CoV-2, o novo tipo de coronavírus descoberto no final do ano passado. Esse estudo foi alvo de diversas críticas e seus resultados foram questionados e considerados anedóticos, ou seja, se tratavam de casos isolados, sem comprovação científica. Mais tarde, em um comunicado, a International Society of Antimicrobial Chemotherapy e a Elsevier, responsáveis pela revista que publicou o artigo, reconheceram a existência de questionamentos quanto ao conteúdo e anunciaram um novo processo de revisão independente.

Em 19 de março, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tratou do medicamento como uma `mudança de jogo` no tratamento da covid-19 e disse que aprovaria o uso dele no país. Dois dias depois, o presidente brasileiro Jair Bolsonaro anunciou que o laboratório do Exército aumentaria a produção de cloroquina.

No dia 25 de março, o Ministério da Saúde emitiu uma nota técnica autorizando o uso da cloroquina para tratar pacientes com casos graves de covid-19. Em 20 de maio, o governo brasileiro passou a orientar o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no `tratamento medicamentoso precoce` de pacientes com covid-19, incluindo pessoas com sintomas leves da doença na lista das que podem ser tratadas com a substância. Porém, o próprio Ministério da Saúde afirma no documento que `ainda não há meta-análises de ensaios clínicos multicêntricos, controlados, cegos e randomizados que comprovem o benefício inequívoco dessas medicações para o tratamento da covid-19`.

Dois dias depois, a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) emitiu uma nota em que `não recomenda o uso da Cloroquina e Hidroxicloroquina associada, ou não, a Azitromicina, enquanto não houver evidências científicas definitivas acerca do seu emprego`. O texto também orienta que, para os pacientes que optarem pelo tratamento, `sejam realizados eletrocardiogramas`, de modo a acompanhar possíveis complicações cardíacas.

A Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas (Sobrac) também emitiu uma nota ressaltando a `ausência de evidências que apontem claramente o benefício do uso deste esquema terapêutico`. A Sobrac recomenda o monitoramento dos pacientes que façam uso do medicamento para `prevenir a manifestação de eventos arrítmicos potencialmente fatais que podem ocorrer devido a efeitos adversos de um destes fármacos ou da associação entre eles ou com outros fármacos que também possam predispor a distúrbios elétricos cardíacos`.

No dia 5 de junho, pesquisadores do Recovery, estudo clínico conduzido no Reino Unido para encontrar medicamentos para tratar a infecção pelo novo coronavírus, afirmaram não haver benefício no uso da hidroxicloroquina em pessoas com covid-19. Dez dias depois, a Food and Drug Administration (FDA), autoridade sanitária americana, revogou a autorização para um uso emergencial da cloroquina e da hidroxicloroquina para o tratamento da doença nos Estados Unidos. A organização alegou que, após o resultado de estudos, é improvável que os medicamentos sejam efetivos no tratamento da covid-19. `Além disso, à luz de eventos adversos cardíacos graves e contínuos e de outros efeitos colaterais sérios, os benefícios conhecidos e potenciais de cloroquina e hidroxicloroquina não superam mais os riscos conhecidos e potenciais para o uso autorizado`, afirmou ainda.

A Organização Mundial da Saúde também avaliou o uso da hidroxicloroquina como um dos medicamentos para o tratamento da covid-19 através do estudo clínico Solidariedade, que já recrutou pacientes em 35 países. Mas decidiu encerrar os testes com a hidroxicloroquina no dia 17 de junho por não ter sido capaz de identificar redução no número de óbitos entre os pacientes que fizeram uso da droga.

Por que investigamos?

O Projeto Comprova verifica conteúdos sobre a covid-19 que tenham grande alcance em redes sociais e grupos de mensagem. A desinformação é perigosa em uma pandemia, pois pode custar vidas. Nesse caso, o texto que acusa o prefeito de São Paulo de tomar proibir a hidroxicloroquina ? causando assim a morte de cidadãos ? e depois tomar o medicamento teve 11,7 mil interações (8,1 mil curtidas e 3,7 mil compartilhamentos) até o dia 26 de junho em postagem no Twitter, feita por uma conta que usa a foto da deputada estadual Janaína Paschoal (PSL-SP) e se descreve como uma página de `sátira` e paródia`. Mas o conteúdo postado por ela costuma ser de apoio ao presidente Jair Bolsonaro e a suas políticas de governo. As críticas ficam para políticos de esquerda ou que não fazem parte da base de apoio de Bolsonaro, como o ex-governador Ciro Gomes (PDT), o prefeito de Salvador ACM Neto (DEM) e, como no caso do post verificado, o prefeito Bruno Covas (PSDB). A publicação também engana ao dizer que Covas tomou hidroxicloroquina para tratar covid-19, estimulando o uso de uma droga que não tem eficácia comprovada cientificamente.

O conteúdo falso também repercutiu no Facebook. A postagem com o mesmo texto e a mesma foto de Covas foi publicado por um perfil que usa o nome e a foto do general reformado Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. De acordo com dados da plataforma Crowdtangle, a publicação teve ainda mais alcance, 25 mil visualizações até o dia 26, quando foi marcada como conteúdo falso pelo Facebook e, em seguida, apagada pelo autor. Neste caso a desinformação é ainda mais perigosa, porque atribui a mensagem falsamente a uma autoridade do governo federal.

Falso para o Comprova é todo conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

A agência Aos Fatos também concluiu que o conteúdo dessas postagens é falso.

Investigação e verificação

SBT, Estadão e Sistema Jornal do Commercio participaram desta investigação e a sua verificação, pelo processo de crosscheck, foi realizada pelos veículos Nexo, Folha e Gazeta do Sul.

Projeto Comprova

Esta reportagem foi elaborada por jornalistas do Projeto Comprova, grupo formado por 28 veículos de imprensa brasileiros, para combater a desinformação. Em 2018, o Comprova monitorou e desmentiu boatos e rumores relacionados à eleição presidencial. A edição de 2019 foi dedicada a combater a desinformação sobre políticas públicas. Agora, na terceira fase, o Comprova vai retomar o monitoramento e a verificação de conteúdos suspeitos sobre políticas públicas do governo federal e eleições municipais, além de continuar investigando boatos sobre a pandemia de covid-19. O SBT faz parte dessa aliança.

Desconfiou da informação recebida? Envie sua denúncia, dúvida ou boato pelo WhatsApp 11 97795 0022.

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