CFM tentará derrubar liminar de Moraes sobre aborto em caso de estupro
O ministro suspendeu, nesta sexta (17), uma resolução do Conselho Federal de Medicina que impedia a paralisação do coração do feto
O Conselho Federal de Medicina (CFM) anunciou nesta sexta-feira (17) que vai tentar derrubar a liminar de Alexandre de Moraes que suspendeu restrição ao aborto em casos de estupro. A entidade discorda da decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e critica o fato de não ter sido chamada a se manifestar nos autos.
“O CFM já prepara manifestação para se contrapor à liminar concedida nesta sexta-feira (17) pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendendo os efeitos da Resolução 2.378/2024, que normatiza o uso da assistolia fetal em casos de aborto legal”, declarou o conselho, em nota.
“A autarquia estranha que a decisão do ministro tenha sido tomada sem ter sido chamada a se manifestar previamente. Para o CFM, as justificativas que serão encaminhadas, após ser devidamente intimado e cientificado da íntegra da decisão, serão suficientes para o convencimento dos ministros do STF sobre a legalidade de sua resolução”, conclui o CFM.
Pedido do PSOL
Moraes suspendeu a Resolução 2.378/2024, do CFM, atendendo a um pedido do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). Na Arguição De Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1.141, o partido solicitou a suspensão liminar (provisória e emergencial) da resolução, o que foi prontamente atendido por Moraes.
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Além da suspensão provisória, o partido pede, no mérito, a declaração de inconstitucionalidade da resolução. O PSOL alega que a resolução do CFM proíbe “sem justificativa clínica, ética ou legal, e pela via ilegítima, um procedimento crucial para a garantia do aborto em gestações acima de 20 semanas, decorrentes de estupro”.
“Abuso de poder”
Para Moraes, a lei que autorizou o aborto em caso de estupro não criou ressalvas em relação à forma como a gravidez pode ser interrompida. Além disso, segundo o ministro, houve “abuso de poder” por parte do CFM na elaboração da resolução. Por fim, afirmou Moraes, a concessão da liminar se justifica pelo “risco da demora” entre mulheres que se encontram na situação abordada na ação do PSOL.
Embora não tenha ouvido o CFM antes da liminar, Moraes abriu prazo para a entidade se manifestar. “Comunique-se ao Conselho Federal de Medicina para ciência e cumprimento imediato desta decisão, solicitando-lhe informações, no prazo de dez dias”, determinou o ministro. “Após esse prazo, dê-se vista ao advogado-geral da União e ao procurador-geral da República, sucessivamente, no prazo de cinco dias, para a devida manifestação definitiva sobre a controvérsia”, finalizou Moraes, na liminar.r
Feticídio por administração de drogas
Na resolução suspensa por Moraes, o CFM proibiu médicos de realizarem a chamada “assistolia fetal”. De acordo com a própria resolução, esse procedimento de “feticídio” consiste em “ato médico que provoca óbito antes do procedimento de interrupção de gravidez, induzido por administração de drogas no feto”. Essas drogas, esclarece o CFM, são injetadas no líquido amniótico, no corpo ou diretamente no coração do feto.
Efeitos colaterais
Ao expor os motivos da proibição, o CFM diz que o procedimento, em si, é seguro, mas há riscos de complicações como infecção materna, internação hospitalar e nascimento com vida em situações não planejadas. O conselho menciona treze estudos científicos para embasar a proibição, entre eles um de 2020 que “evidenciou taxa mais alta de eventos adversos maternos graves em pacientes recebendo drogas feticidas do que naquelas situações em que as mulheres não receberam tais medicamentos”.
Falta de evidências científicas
Segundo o CFM, “embora os defensores da assistolia fetal digam que ela é fundamental para uma melhor satisfação materna”, não há evidências científicas nesse sentido. Para o conselho, ainda que o aborto em casos de estupro seja permitido em lei, o “o procedimento de assistolia fetal é profundamente antiético e perigoso em termos profissionais”, exceto “em situações muito específicas” relacionadas a riscos de morte para a mãe.
Legislação brasileira e internacional
A proibição teve também argumentos jurídicos. O CFM cita, entre outros dispositivos, “o direito inviolável à vida”, previsto no artigo 5º da Constituição Federal. Menciona ainda a Declaração de Genebra, adotada em 1948 pela Associação Médica Mundial, segundo a qual “será mantido o máximo respeito pela vida humana, promovendo a honra e as nobres tradições da profissão médica, evitando o uso dos conhecimentos médicos para violar os direitos humanos”.
A proibição
Após a exposição de todos esses argumentos, o CFM finaliza a resolução com uma ordem expressa à classe médica:
“É vedado ao médico a realização do procedimento de assistolia fetal, ato médico que ocasiona o feticídio, previamente aos procedimentos de interrupção da gravidez nos casos de aborto previsto em lei, ou seja, feto oriundo de estupro, quando houver probabilidade de sobrevida do feto em idade gestacional acima de 22 semanas”.