O que separa a vacina contra a covid-19 do braço dos africanos?
Entenda os empecilhos que envolvem a baixa taxa de imunização do continente
Fernanda Bastos
Uma nova variante, classificada de "preocupação" pela Organização das Nações Unidas (ONU), foi descoberta na África do Sul nesta 6ª feira (26.nov). Cientistas sul africanos detectaram mais de 30 mutações no vírus e até agora foram confirmados 77 casos na África do Sul, quatro em Botsuana e um em Hong Kong. O medo inundou não só o continente africano e o mundo, mas também a economia mundial. Pela manhã, ações de companhias aéreas e petróleo sofreram baixa superior a 4%.
O continente africano vacinou completamente cerca de 6.66% da população contra a covid-19 e 9.89% com a primeira dose, segundo dados do Centro Africano de Controle e Prevenção de Doenças (Africa CDC). Os países Eritreia, na parte oriental do continente, e Burundi, na África Central, não receberam até a data de hoje (26/11) nenhuma dose de vacina contra o coronavírus. Poucas doses disponíveis, falta de solidariedade da comunidade internacional e dificuldades logísticas são alguns dos motivos que separam a vacina da covid-19 do braço dos africanos, segundo especialista ao SBT News.
"Os países africanos foram abandonados pelo resto do mundo", destacou o diretor geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, em mais um de seus apelos para que países ricos não distribuam a dose de reforço da vacina. O prometido pelo consórcio Covax Facility -- programa criado em 2020 pela Organização das Nações Unidas (ONU) para a distribuição de vacinas para países de baixa renda -- era a entrega de 66 milhões de doses de imunizantes para o continente africano, no entanto, só foram entregues 19 milhões. Inclusive, cinco países da África não receberam nenhuma dose do consórcio.
Mamadou Sow, chefe da delegação do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) para a região sul da África, explicou que a falta de solidariedade da comunidade internacional prejudicou a vacinação no continente. "Quando se trata da vacina há diferentes tipos de coisa acontecendo no mundo. Há egoísmo de outros países. Governos que compram mais vacinas do que o necessário para a sua população. A África do Sul pagou três vezes mais do que alguns países ricos para obter vacinas", disse. A falta de acesso adequado para a compra das doses pelas nações do continente africano e restrições às exportações de vacinas e seus componentes foram dois fatores destacados por Mamadou.
Conflitos armados
Consequências da colonização do continente africano são sentidas até os dias de hoje e impactaram na distribuição das vacinas na região. Os conflitos armados são parte do problema de acesso aos imunizantes e se concentram na região sul do continente. "Sul da África era o bloco mais conflituoso. No norte de Moçambique, a insurgência que abarcou todo o norte, impactou a vida de milhares de pessoas, um milhão de pessoas estão deslocadas. Hospitais foram queimados e destruídos. No resto dos países do sul da África não há guerras, mas há situações caóticas de violência", disse Mamadou.
Além disso, a falta de logística na área da saúde em muitos países acaba sendo consequência dos conflitos armados. "A covid-19 afetou também países que estão em conflitos armados na África. Imagina pedir distanciamento social em um campo de refugiados, imagina lavar as mãos onde falta água para beber. Quando se tem um conflito armado, as economias dos países já estão abaladas. Estamos falando de países que tem um médico para cada 35 mil pessoas, ou países que metade das instalações de saúde estão destruídas", explicou o chefe da delegação do CICV na região.
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