Entrevista: Emmanuel Zagury Tourinho
Reitor da Universidade Federal do Pará (UFPA)
Fernando Jordão
De que modo os cortes afetam a UFPA?
As universidades todas vêm sofrendo cortes orçamentários há 5 anos. Já reduzimos as despesas que poderíamos reduzir, estamos trabalhando sem as condições suficientes. Esse novo corte acentua demais a precarização, tudo o que a universidade realiza será prejudicado. A gente trabalha sempre com a perspectiva de não suspender as atividades, porque prestamos serviços à sociedade em várias áreas. Mas tudo isso que realizamos depende da infraestrutura que temos, de espaços adequados para as nossas atividades, do suporte dos serviços de limpeza, vigilância, energia elétrica... Tudo isso é difícil de pagar se você tem um corte. Trabalharemos até o limite para não suspender, mas não podemos garantir e, o que pudermos manter, manteremos sob condições muito precárias. Haverá uma precarização, o sistema como todo será afetado.
Quanto a universidade perdeu em dinheiro?
Perdemos, em valores nominais (desconsiderando a inflação), 20% do recurso de custeio e 92% do recurso de investimento de 2015 para cá. Em valores, tínhamos um orçamento de investimento que era de, aproximadamente, R$ 62 milhões por ano e hoje é de R$ 4,5 milhões. Isso acontece em um momento em que a universidade continua crescendo -- em número de vagas e em projetos de pesquisa. É uma situação que, obviamente, caminha para inviabilizar as instituições, porque você não tem como sustentar essas atividades todas com a redução de um orçamento que já não era suficiente. As universidades não apenas cresceram, como foram avaliadas por vários processos e todos atestam que as universidades públicas têm a qualidade mais elevada, oferecem a formação de maior qualidade e é uma qualidade que todo ano avança. Noventa por cento da ciência nacional é feita nas universidades públicas e não existe a menor chance de o país sair da crise que está sem ciência e tecnologia.
Há a possibilidade de as atividades serem interrompidas? Quando?
Não é uma questão de uma data. Elas, desde agora, já estão prejudicadas. Na medida que temos menos recursos, já estamos cortando manutenção, suspendendo contratos que faríamos de aquisição de insumos e de equipamentos, deixando de apoiar iniciativas novas na universidade, de projetos que atenderiam a população, já estão sendo afetadas desde agora. Vamos avançar para uma situação cada vez mais precária. Não sabemos dizer quando chegará um ponto que o ensino, que é a principal atividade da universidade, terá que ser paralisado, mas esperamos que não aconteça. Até onde vai conseguir reduzir e até quando consegue manter atividade é difícil dizer, mas certamente não estaremos funcionando com as condições que seriam necessárias.
Com essa redução no orçamento é possível retomar o ensino presencial?
Impossível. Porque nós precisamos de recursos para adaptar os espaços, para prepará-los, de uma outra conservação. A higienização, neste momento de pandemia, é justamente algo que precisaríamos fazer. Como eu garanto as condições tendo que cortar o contrato de limpeza?
Qual a sua avaliação sobre esses cortes?
Essa decisão está relacionada a um projeto de nação. Se você quer um projeto com desenvolvimento, com economia forte, com cidadania, com qualidade de vida para a população, no lugar de cortar você aumenta o investimento. É o que fez a Alemanha, a China, é o que estão fazendo os Estado Unidos. Se você sacrifica a educação, a ciência e a tecnologia, está com um projeto de nação que sacrifica esse futuro de desenvolvimento, de cidadania, de qualidade de vida. Não tem meias palavras para isso. Não existe nenhuma nação no mundo que consiga garantir qualidade de vida sem investimento em ciência, educação e tecnologia. E na crise elas aumentam esse investimento. Estamos fazendo o contrário. E não é por uma questão fortuita. É uma decisão. É um projeto que nos reserva um futuro muito ruim. É preciso que o governo compreenda. Para um futuro melhor, é necessário garantir o orçamento para as instituições.