"Vício: o preço da compulsão" mostra epidemia de fentanil nos Estados Unidos
Série do SBT Brasil mostra como medicamentos controlados se transformaram em drogas baratas e letais, afetando famosos e moradores de rua em Los Angeles
Thiago Ferreira
Cleide Klock
Os vícios e as overdoses são parte de um cenário real na terra do cinema. Um drama protagonizado por anônimos e famosos.
Em Hollywood, foi assim na década de 1960, com Marilyn Monroe e Judy Garland, vítimas do abuso de remédios contra insônia e ansiedade. Anos mais tarde, o mesmo aconteceu com os reis do rock e do pop. Elvis Presley e Michael Jackson também tiveram as vidas interrompidas como consequência do uso excessivo de medicamentos controlados.
A história se repete a todo momento, e o que muda são as substâncias. Matthew Perry, o eterno Chandler de Friends, morreu por efeitos de cetamina - usada para tratar depressão e ansiedade -, fatal em altas doses.
A crise sanitária atual se deve, em grande parte, ao fentanil, um opioide utilizado para tratar dor. Sintético, barato, até cinquenta vezes mais potente que a heroína e cem vezes mais forte que a morfina. Foi esse remédio que, há quase dez anos, levou Prince, o rei do funk-pop. Recentemente, outras celebridades também foram vítimas da substância ou de misturas com o opioide.
A mesma droga que atinge celebridades devasta as ruas de Los Angeles. Não aparece nas manchetes, mas ali a realidade é ainda mais brutal, cruel e visível. A Skid Row concentra o maior número de usuários de drogas e moradores em situação de rua dos Estados Unidos. São cinquenta quarteirões no centro da cidade, onde uma multidão enfrenta pobreza extrema, saúde mental frágil e acesso fácil a drogas baratas e perigosas.
Georgia trabalha diretamente com essa comunidade no projeto The Midnight Mission. Ela explica que qualquer pessoa vivendo sem um travesseiro, um banheiro ou um teto pode sofrer transtornos mentais. No começo, recusar as drogas é mais fácil, mas depois de alguns meses vivendo sem nada, tudo muda.
Apesar de ter sido criado como anestésico nos anos 1960, o fentanil ilegal começou a se espalhar clandestinamente há cerca de doze anos. Em uma primeira onda, houve apreensões de fentanil fabricado ilegalmente na China, que chegava aos Estados Unidos por encomendas online. A partir de 2016, a produção migrou para laboratórios no México, com substâncias importadas dos chineses, e passou a ser transportada pelas rotas terrestres.
Nesse período, o número de mortes explodiu, e o opioide se tornou o principal responsável por overdoses no país. Estimativas apontam que, de 2019 a 2024, mais de trezentas e cinquenta mil pessoas morreram vítimas do fentanil ou de misturas com a droga.
Desde que voltou ao poder, Donald Trump tem travado uma guerra retórica e diplomática com chineses e mexicanos, alegando que o combate à droga exige pressão direta sobre quem fabrica e faz a substância chegar a lugares como a Skid Row.
Em Los Angeles, o trabalho das ONGs faz grande diferença. É um dos pilares de uma mudança importante: o foco está na redução de danos. Amelia e o pastor Blue integram o projeto Blue Hollywood. Eles distribuem material descartável para o uso seguro de entorpecentes, como seringas e cachimbos.
O trabalho pode parecer controverso, mas eles explicam que não estão ali para julgar nem incentivar o uso. Já viram muitas pessoas morrerem sozinhas em suas tendas porque compartilharam substâncias e acessórios, ou porque não conseguiram reverter overdoses.
Os resultados de medidas como essa começaram a aparecer. O número de mortes por overdoses caiu 22% no último ano na região metropolitana de Los Angeles, a maior queda anual já registrada. As autoridades atribuem o avanço ao aumento do acesso à naloxona, spray nasal capaz de reverter overdoses por opioides, que se tornou essencial no combate às mortes.
O The Midnight Mission oferece um programa de recuperação que dura cerca de um ano, gratuito e apoiado pelo governo da Califórnia. Trezentas pessoas vivem ali — agora com teto — bem às margens da Skid Row. Ali, usuários em tratamento encontraram uma comunidade, oportunidades e uma verdadeira escola para reconstruir a própria trajetória.









