Grande produtor de tecnologia, por que o Japão é resistente à modernização?
País produz muita tecnologia exportada mundo afora e internamente se prende às tradições e aos equipamentos considerados obsoletos no Ocidente
Cido Coelho
O Japão, que possui a quarta maior economia do mundo, perdendo o posto para a Alemanha, no começo de 2024, tem forte apego às suas tradições. Mesmo com suas evidentes e impressionantes conquistas tecnológicas, o país mantém internamente o uso de tecnologias ultrapassadas.
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Segundo o relatório do banco Santander, publicado em 2023, o país tem uma indústria robusta, sendo o terceiro maior produtor mundial de automóveis, com a líder Toyota, e a terceira maior fabricante de navios em 2022.
O setor dos serviços representa cerca de 69,9% do PIB, soma de todas as riquezas do país, e empregam mais de 73% da mão de obra.
Finanças, seguros e o mercado imobiliário se destacam, assim como as tecnologias de informação e os serviços digitais.
No entanto, internamente o cenário é outro. Segundo o jornal The Japan Times, há uma escassez crítica de habilidades digitais, onde há forte resistência às mudanças e uma tendência à aversão ao risco para adotar novas tecnologias, políticas e processos.
Queda na competitividade
Segundo o Ranking de Competitividade Digital Mundial de 2023, do Institute for Management Development (IMD), o Japão está na posição 32 entre as 64 economias, onde o Brasil está na 57ª posição, no ranking de competitividade que tem a capacidade de adotar e explorar novas tecnologias digitais para fazer a transformação econômica e nos negócios e na sociedade.
Este é o pior desempenho japonês desde que a lista foi anunciada pela primeira vez em 2017, ficando bem distante dos seus vizinhos asiáticos Coreia do Sul (6º), Taiwan (9º) e China (19º).
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Isso se reflete na escassez de mão de obra de mais de 11 milhões de trabalhadores, principalmente entre os profissionais digitais, que tem apenas 1 milhão de trabalhadores ativos nesta área, atrasando a transformação digital do Japão.
O governo japonês estima que o país tem necessidade de 2,3 milhões de trabalhadores até 2026, para atender a demanda de serviços em nuvem, análise de big data e outras tecnologias.
Hanko, fax, máquina de escrever...
O governo venceu o desafio dos disquetes, mas ainda enfrenta outras resistências dos seus funcionários, como o uso da máquina de escrever e a recusa do armazenamento em nuvem nos sistemas administrativos.
Em 2020, o Japão deixou de exigir o selo pessoal hanko, que é um carimbo esculpido que pode ser usado em qualquer situação em que um indivíduo ou um indivíduo em nome de uma empresa possa usar uma assinatura.
O carimbo é como uma autenticação da pessoa, um selo pessoal, e na sociedade japonesa é bem comum seu uso para assinatura de contratos, realização de operações bancárias em uma agência bancária, até mesmo para receber uma encomenda e entre outras finalidades.
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O editorial do jornal The Japan Times, publicado, em fevereiro deste ano, definiu por "ritmo glacial" o fim dos carimbos hanko no país.
"O sucesso da transformação digital depende da incorporação profunda da tecnologia em todas as dimensões da vida diária. Isso exige confiança na segurança, e integridade desses produtos e nas informações que eles transmitem e usam", diz a publicação japonesa.
Além disso, muitos locais de trabalho no Japão optaram por usar aparelhos de fax em vez de e-mails. O governo tentou remover os aparelhos de fax em 2021, mas não conseguiu devido à resistência dos funcionários.
Formação de profissionais e a participação de mulheres
Outra dificuldade está também no baixo número na formação de profissionais de ciência, tecnologia, matemática e engenharia (STEM) e na dificuldade de atrair trabalhadores digitais de outros países, devido à demora de até seis meses na emissão de vistos.
No entanto, o país adotou aos poucos a estratégia de atrair trabalhadoras, em um ambiente dominado por homens, para assumir os postos de trabalho na área de digital, e vem estimulando as mulheres a participar da força de trabalho do país, aumentando de 63% para 74% entre 2012 e 2022.