Governadores adotam cautela com PEC, mas mantêm aberto diálogo na segurança pública
Lula recebeu governadores no Palácio do Planalto para debater segurança pública e apresentar PEC sobre o tema
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se reuniu, nesta quinta-feira (31), com 18 governadores no Palácio do Planalto para tratar de segurança pública e apresentar uma proposta de emenda à constituição (PEC) sobre o tema.
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O encontro não teve uma definição e foi marcado por cautela sobre a PEC apresentada pelo ministro Ricardo Lewandowski, mas com a manutenção do diálogo aberto para o debate sobre a segurança pública no Brasil.
Além de ouvir a PEC do governo federal, os governadores fizeram diversas sugestões de melhoria para a segurança pública. As propostas foram variadas, devido às necessidades de cada estado. O tom do encontro foi ameno, com poucas ponderações acima do tom político da conversa, sejam elas positivas, como do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ou negativas, como do governador Ronaldo Caiado (União).
Foi um consenso entre os chefes Executivos estaduais uma revisão nas audiências de custódia para "criminosos habituais", que foram presos mais de uma vez pela polícia pelos mesmos crimes, como furto ou roubo.
Segundo relatos dos governadores, algumas dessas pessoas chegaram a ser presas mais de 30 vezes, mas poucos dias depois, acabavam soltas após as audiências.
"A nossa proposta é que a habitualidade seja um requisito para prisão preventiva. Depois de um número de vezes da pessoa presa, não se possa soltar em audiência de custódia alguém cometeu o mesmo crime", disse o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, um dos representantes estaduais com maiores problemas no setor.
"[...] a audiência de custódia, que tem ganhos e perdas [...] prendemos um criminoso, não com 40g ou 50g, mas com 850kg de cocaína e ele foi solto na audiência. A gente precisa coibir a liberação de criminosos em audiência de custódia quando eles são reincidentes, quando há habitualidade daquilo que tira a paz do cidadão nas ruas, como roubo de celular. A gente chega a prender o mesmo ladrão de celular 35 vezes e ele vai para a rua. Aí dá a sensação que o Jerônimo (governador petista da Bahia) falou aqui, que a gente está enxugando gelo", disse o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).
A PEC
Sobre a PEC apresentada por Lewandowski, os governadores mostraram cautela com o ponto que tratava de uma maior participação do governo federal na segurança pública, por um temor de que a União pudesse invadir a competência dos governadores de cuidar da segurança pública.
Em linhas gerais, o aumenta as responsabilidades da União na segurança pública, cria elementos para uma maior integração das polícias, além de prever a criação de uma polícia ostensiva federal em substituição à Polícia Rodoviária Federal (PRF), dando-lhe poderes parecidos aos das polícias militares estaduais. A PEC também prevê reforçar o Sistema Único de Segurança Pública (Susp). De modo geral, os governadores não viram maiores problemas no estabelecimento da polícia ostensiva.
"Estamos nos restringindo à atuação das nossas forças que são as forças federais. Em substituição à PRF, nós pretendemos criar uma Polícia Ostensiva Federal, dando vazão à sua vocação para que realize o policiamento, não só em rodovias, mas em ferrovias e hidrovias federais. É preciso também que tenhamos policiamento nessas vias e modais importantes para a economia brasileira. Onde passam as mercadorias, passam drogas, armas e tráfico de pessoas", disse.
Críticas de Caiado
O governador de Goiás, Ronaldo Caiado, confrontou o presidente Lula não apenas sobre a PEC, mas sobre o debate sobre a instalação de câmeras nas fardas de policiais militares. Caiado disse que não iria, "de maneira nenhuma" colocar câmeras na sua PM. Ele afirmou ainda que "acabou" com o roubo de carros em Goiás, o que, posteriormente rendeu resposta irônica do presidente.
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Reposta positiva de Tarcísio
O governador Tarcísio de Freitas afirmou que a PEC "não é um produto pronto", mas entendeu a reunião como um momento para o governo ouvir os governadores.
"Tenho certeza que hoje se inicia um start para estabelecer um grande grupo de trabalho e estabelecer uma série de propostas que possam ser analisadas em complemento e podem nos ajudar principalmente na questão da lavagem de dinheiro e dos negócios 'lícitos' usados pelo crime organizado", declarou Tarcísio.
Outro consenso da reunião, entre governadores e o presidente Lula tratou do avanço do crime organizado em negócios e atuações legalizadas, a fim de lavar dinheiro e de ter influência dentro dos poderes.
"Logo, logo, o crime organizado vai estar participando de concurso, indicando juiz, procurador, político, indicando candidato. E essa é uma coisa que é quase incontrolável, se a gente não montar um pacto federativo que envolva todos os poderes, que estão envolvidos direta e indiretamente nisso", disse o presidente Lula.
Pamonha para Caiado
Após Caiado ter dito que resolveu uma série de problemas na segurança pública de Goiás, Lula ironizou o governador goiano em sua fala de encerramento da reunião.
“O dado concreto é que é uma situação muito complicada. Tive o prazer de conhecer hoje o único estado que não tem problema de segurança, que é o estado de Goiás”, disse Lula, ao final da reunião com governadores.
“Nem sempre o estado quer que o governo federal auxilie. Não é todo crime que acontece no estado que a gente pode mandar a Polícia Federal, as pessoas não querem, elas são donas. Queremos unificar procedimentos, informações. Imagina se todos nós tivéssemos a metodologia do Caiado, teríamos muito mais informações”, acrescentou.
Após as respostas, Lula terminou a reunião em tom de bom humor, mas mais uma vez se dirigindo à Caiado, ao perguntar se ele tinha experimentado uma pamonha que estava sendo servida durante a conversa no Palácio do Planalto.
“Acho que nunca um presidente deu tanta comida para os governadores como eu dei nessa reunião", brincou Lula. "Eu não sei, Caiado, se chegou para você um pedaço de pamonha, mas a que eu comi aqui veio ontem à noite de Goiás, e o famoso empadão de Goiás", acrescentou.