Como funcionam as audiências de depoimentos na ação da trama golpista?
Supremo Tribunal Federal ouvirá 82 testemunhas; depoimentos servirão como prova dentro do processo em que Bolsonaro e sete aliados são réus

Paola Cuenca
O Supremo Tribunal Federal começa nesta segunda (19) as audiências para tomar depoimentos na ação penal movida contra os supostos autores intelectuais da tentativa de golpe de Estado, entre eles o ex-presidente Jair Bolsonaro. A oitiva de testemunhas faz parte da chamada instrução processual, que é a etapa destinada à produção de provas, tanto por parte da defesa quanto da acusação.
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Ao todo, foram indicadas 82 testemunhas para serem ouvidas. Seis foram listadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e, portanto, fazem parte da acusação. Setenta e quatro pessoas foram elencadas pelas defesas dos oito réus. Algumas testemunhas ainda são compartilhadas por mais de um réu, caso do senador Hamilton Mourão que foi chamado para participar das defesas de Jair Bolsonaro, Augusto Heleno, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto. Outras, como o ex-comandante do Exército general Freire Gomes, foram intimados para falar tanto pela acusação quanto pelas defesas de alguns réus.
Conforme calendário estabelecido pelo relator do caso, o ministro Alexandre de Moraes, as testemunhas de acusação serão ouvidas primeiro, seguidas pelas testemunhas elencadas pelo colaborador, o ex-ajudante de ordens da Presidência da República, tenente-coronel Mauro César Cid. Por fim, as testemunhas das defesas do demais réus. Os depoimentos estão previstos para acontecer entre os dias 19 de maio e 2 de junho por videoconferência.
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O advogado e professor de Processo Penal da Pontifícia Universidade Católica do Paraná Rafael Soares explica que todas as partes do processo podem fazer questionamentos às testemunhas, o que inclui o representante da PGR e os advogados de todos os réus.
"A partir de agora, cabe tanto à acusação quanto à defesa apontar quais são as provas que demonstram ou a culpa ou a inocência dos acusados. É um momento bastante importante no processo, porque haverá a discussão a respeito daquilo que está na denúncia e aquilo que está nas defesas apresentadas pelos réus", expõe o professor.
O processo será acompanhado e coordenado por um juiz auxiliar do gabinete de Moraes, que poderá questionar as testemunhas. O ministro não participa das audiências.
Soares ainda explica que não é incomum que mesmo indivíduos que já foram ouvidos pela Polícia Federal durante as investigações sejam chamados a dar novo depoimento na ação penal.
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"São situações distintas. Na Polícia Federal, o depoimento é conduzido só pelo delegado com a perspectiva do que ele pensa sobre o caso. O depoimento passa a ter validade como prova, que justifica uma condenação ou absolvição, a partir do momento em que é introduzido no processo. Ele ganha um peso diferente para o Supremo Tribunal Federal e por isso há essa necessidade de ouvir mais uma vez. E, certamente, serão depoimentos muito mais detalhados [em relação aos feitos pela PF]. Tanto defesa quanto acusação podem tentar desacreditar estes depoimentos", pondera.
Apesar da ação penal não tramitar em sigilo, as tomadas de depoimentos não serão transmitidas. A imprensa foi proibida de fazer registros em áudio e vídeo dos depoimentos. Jornalistas credenciados poderão acompanhar as oitivas por meio de um telão disponibilizado pelo STF em uma sala reservada. De acordo com o Tribunal, a medida é respaldada no artigo 210 do Código de Processo Penal e foi imposta para evitar que o depoimento de uma testemunha interfira no depoimento de outra.
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Durante a instrução processual, as partes também poderão apresentar novos documentos como provas, solicitar perícias de elementos colhidos pela investigação e incluir mais itens no processo que funcionem como provas de culpa ou inocência dos réus. Ao final desta etapa, será a vez de os réus serem interrogados.