Centro do Crime: Golpistas vendem marmitas que Prefeitura distribui de graça na Cracolândia
Dinheiro público destinado para assistência social acaba desviado por pessoas que se aproveitam da fragilidade dos dependentes do crack
O penúltimo episódio da série do SBT Brasil “Centro do Crime”, exibido nesta sexta-feira (15), revela como ações pagas com o dinheiro público para ajudar dependentes químicos da Cracolândia são aproveitadas por golpistas.
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Além disso, os repórteres Fábio Diamante e Robinson Cerantula mostram que o problema social na região central de São Paulo se estende além do fluxo de drogas.
Comida pública
ONGs, igrejas e voluntários são proibidos de entregar refeições para o público da região por decisão de um dos secretários da gestão municipal. Segundo um funcionário da Prefeitura ouvido pelo SBT, a alegação é evitar desperdício alimentar.
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Quem passa nas ruas enquanto a limpeza pública recolhe os objetos dos dependentes químicos percebe a quantidade de comida deixada no local.
Por meio da Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania, a gestão municipal fornece 500 marmitas no almoço e 700 no jantar, com custo de R$ 10 por unidade aos cofres públicos. As refeições são distribuídas gratuitamente para moradores em situação de rua e dependentes químicos.
Modus Operandi
Quando a van da Prefeitura com o alimento se aproxima do local, ainda antes de estacionar, a fila dos dependentes químicos se forma. Do outro lado, um homem com uma mochila de entregador se posiciona para aplicar o golpe.
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Em seu bolso, há dezenas de moedas de moeda de R$ 1 que serão entregues aos usuários de droga em troca das marmitas – dinheiro que, em seguida, será gasto em pedras de crack.
Com a mochila cheia de quentinhas, o homem entra em um prédio da região e sai com a bolsa aparentemente mais vazia.
Na sequência, o golpista para em uma das esquinas mais movimentadas do centro de São Paulo e começa a vender as refeições – que foram distribuídas de graça pela Prefeitura – e passa a arrecadar R$ 160 por dia, quase R$ 5 mil por mês, mesmo ao lado de uma delegacia.
A equipe de reportagem questionou o homem, que diz se chamar Maurício. Perguntado sobre a origem das marmitas, o golpista mentiu e afirmou que ele mesmo havia preparado as refeições.
Quando ele percebeu que os repórteres já sabiam que o alimento era distribuído pela Prefeitura, Maurício admitiu:
“Se você chegar lá e perguntar para qualquer usuário, você não vão ver eu pegar uma marmita. Eu não pego fila, eu não pego uma. Eu fico ali no meu cantinho, levo meu dinheiro. Eles vêm e eu pago 1 real pra eles”, confessa Maurício.
O que diz a Prefeitura
A Prefeitura de São Paulo enviou uma nota sobre o caso flagrado pela reportagem do SBT Brasil.
"Ao contrário do que sugere a reportagem, mesmo sem a participação de agentes públicos, a Prefeitura de São Paulo desconhece qualquer esquema relacionado à venda de marmitas por parte de terceiros. A Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS) segue o procedimento determinado, que é a entrega de uma marmita por pessoa de forma gratuita.
A distribuição momentânea de alimentação faz parte da estratégia de orientação para que as pessoas se alimentem em refeitórios, espaços organizados onde, além de comer, possam ter acesso ao tratamento e apoio social. Os agentes do Serviço Especializado em Abordagem Social (SEAS) orientam que as pessoas se alimentem em refeitórios dos diversos convênios municipais, como o Núcleo de Convivência Boticário (Rua do Boticário, 32) e o Bom Prato Refeitório (Rua Mauá, 66).
É importante destacar que um dos pressupostos dos agentes da SMADS/SEAS é estabelecer vínculos com os munícipes abordados no território atendido. Por conta disso, é comum que, como observado pela reportagem, os agentes conheçam as pessoas que permanecem na região. Esta criação de vínculo tem como objetivo tornar a abordagem social e os encaminhamentos mais eficazes."
Terceiro episódio
Na terceira reportagem da série, o SBT Brasil mostrou quem são os dependentes químicos da Cracolândia a partir de um censo inédito da Polícia Civil.
Veja: