Crise humanitária em Gaza: Palestinos desabrigados buscam comida e lutam por sobrevivência
Novos ataques de Israel dificultam situação de quem já estava deslocado; Irlanda, Espanha e Noruega reconhecem formalmente o Estado Palestino
O exército israelense declarou nesta terça-feira (28) que uma investigação inicial sobre o ataque aéreo que provocou um incêndio em um campo de refugiados em Rafah, no sul da Faixa de Gaza, concluiu que o fogo foi causado por uma explosão secundária.
Um oficial militar, sob condição de anonimato, informou que foram disparadas pelas forças israelenses duas munições de 17 quilos, tendo como alvos dois militantes seniores do Hamas. Segundo o oficial, as munições seriam pequenas demais para iniciar um incêndio por conta própria. A hipótese é que armas estivessem armazenadas na área, o que poderia ter causado uma segunda explosão.
Oficiais de saúde palestinos relataram a morte de pelo menos 45 pessoas no ataque de domingo (26), cerca da metade mulheres e crianças. O incêndio também pode ter sido alimentado por combustível, botijões de gás de cozinha ou outros materiais presentes no campo de refugiados densamente povoado.
Novos ataques nesta terça, na mesma área de Tel al-Sultan, em Rafah, resultaram na morte de pelo menos 16 palestinos, conforme informações da Defesa Civil Palestina e do Crescente Vermelho Palestino. Moradores locais relataram uma intensificação dos combates na cidade, que era considerada um último refúgio no território de Gaza.
Desde o início de maio, uma incursão israelense forçou quase 1 milhão de pessoas a fugirem de Rafah, muitas das quais já haviam se deslocado de outras cidades em Gaza devido ao conflito entre Israel e Hamas. Atualmente, essas pessoas buscam abrigo em acampamentos de tendas e outras áreas devastadas pela guerra.
Crise humanitária em Gaza
As consequências da ofensiva israelense em Rafah têm sido devastadoras, com centenas de milhares de palestinos fugindo da cidade e se espalhando por áreas mais seguras. As famílias, muitas já deslocadas várias vezes durante os oito meses de conflito, agora vivem em condições precárias em campos de tendas que se estendem por mais de 16 quilômetros ao longo da costa de Gaza.
Em meio à crise, famílias cavam trincheiras para usar como banheiros, enquanto pais procuram comida e água. Crianças vasculham o lixo em busca de materiais para que suas mães possam cozinhar.
"A situação é trágica. Você tem 20 pessoas na tenda, sem água limpa, sem eletricidade. Nós não temos nada", relata Mohammad Abu Radwan, um professor que vive em uma tenda com sua família.
Abu Radwan fugiu de Rafah em 6 de maio, quando os bombardeios se aproximaram da casa onde estava abrigado. Ele e outras três famílias pagaram US$ 1.000 (cerca de R$ 5.150 na cotação de hoje) por carros de burro para se deslocarem para os arredores de Khan Younis. Lá, levaram um dia vivendo ao ar livre antes de conseguirem montar uma tenda improvisada.
A situação é agravada pela escassez de alimentos, combustível e outros suprimentos. O número de caminhões com ajuda humanitária que chegam a Gaza caiu drasticamente, segundo a ONU. A entrada de combustível também diminuiu, afetando hospitais, padarias, bombas de água e caminhões de ajuda.
As autoridades israelenses têm permitido a entrada de mais caminhões comerciais, resultando em maior disponibilidade de frutas e vegetais nos mercados, mas muitos palestinos desabrigados não podem pagar por esses itens. Com salários atrasados e economias esgotadas, muitos recorrem a trocas no mercado negro para obter dinheiro.
Trabalhadores humanitários relatam dificuldades em distribuir os suprimentos disponíveis devido à falta de combustível para os caminhões. A Mercy Corps destacou que a maioria das famílias precisa comprar materiais para construir suas próprias tendas, o que pode custar até US$ 500 (aproximadamente R$ 2.575).
As condições nos campos de refugiados são difíceis. A zona humanitária declarada por Israel, centrada em Muwasi, carece de cozinhas, mercados de alimentos e hospitais. A área tem poucos recursos hídricos ou sistemas de esgoto, resultando em surtos de doenças gastrointestinais e de pele.
A ofensiva de Israel em Rafah, iniciada após o ataque do Hamas em 7 de outubro, visa a destruir o grupo militante, mas causou a morte de cerca de 36.000 pessoas, segundo o Ministério da Saúde de Gaza. No ataque mais recente a um campo de tendas em Rafah, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu reconheceu um "erro trágico".
Com a expansão dos combates, as condições de vida nos campos de refugiados se deterioram rapidamente. As fotos de satélite mostram novos campos de tendas densamente ocupados ao longo da costa. A vida nesses campos é uma luta constante pela sobrevivência.
A situação humanitária em Gaza continua a se deteriorar, com apelos por mais ajuda internacional e soluções sustentáveis para os milhares de desabrigados.
Irlanda, Noruega e Espanha reconhecem oficialmente o Estado Palestino
Em um movimento coordenado para pressionar Israel a suavizar sua resposta ao ataque do Hamas do ano passado, Espanha, Noruega e Irlanda reconheceram formalmente o Estado palestino nesta terça-feira (28). Israel condenou a decisão, afirmando que não terá impacto imediato na guerra em Gaza.
O primeiro-ministro espanhol Pedro Sánchez anunciou a decisão em um discurso televisionado, descrevendo-a como uma medida histórica para ajudar israelenses e palestinos a alcançar a paz. O ministro das Relações Exteriores de Israel, Israel Katz, criticou a Espanha, acusando o governo de Sánchez de ser cúmplice de incitação ao genocídio contra judeus e crimes de guerra.
Após a formalização da decisão conjunta previamente anunciada, a bandeira palestina foi hasteada em Dublin, na sede do parlamento irlandês. O governo irlandês anunciou o reconhecimento oficial do Estado palestino e a criação de uma embaixada da Irlanda em Ramala, na Cisjordânia.
O primeiro-ministro irlandês Simon Harris destacou que a medida visa "manter viva a esperança" e apelou ao premiê israelense Benjamin Netanyahu para "ouvir o mundo e conter a catástrofe humanitária" em Gaza. Com essa decisão, a Irlanda estabelecerá relações diplomáticas plenas com a Palestina e nomeará um embaixador irlandês para Ramala.
A Noruega também oficializou nesta terça-feira o reconhecimento da Palestina como Estado. O ministro das Relações Exteriores, Espen Barth Eide, afirmou em comunicado que "a Noruega tem sido, há mais de 30 anos, um dos países que mais tem lutado por um Estado palestino. Hoje, quando se reconhece oficialmente a Palestina como Estado, é um dia memorável na relação entre os dois países."
O Conselho de Ministros da Espanha também aprovou o reconhecimento formal da Palestina como Estado. A porta-voz do governo espanhol, Pilar Alegría, e o ministro das Relações Exteriores, Jose Manuel Albares, destacaram a importância histórica da decisão.
Albares afirmou que "hoje é um dia que fica gravado na história da Espanha, um dia em que o nosso país diz que perante o sofrimento não é possível a indiferença e que é possível a paz, a solidariedade, o compromisso e a confiança na humanidade."
Ele defendeu que a decisão é uma questão de justiça para o povo palestino e uma via para garantir a segurança de Israel e a paz na região.
As decisões da Irlanda, Noruega e Espanha se somam à de mais de 140 países que já reconheceram a Palestina como Estado. No entanto, nenhuma das principais potências ocidentais o fez. A adesão de três países europeus ao grupo representa uma vitória para os esforços palestinos na opinião pública mundial e pode pressionar França e Alemanha a reconsiderarem suas posições. Anteriormente, apenas sete dos 27 membros da União Europeia (UE) reconheciam oficialmente o Estado palestino.