Liz Truss é eleita a nova primeira-ministra do Reino Unido
O processo durou dois meses; Liz ocupava o cargo de ministra de Relações Exteriores
Londres - Era julho deste ano, quando Liz Truss apareceu em um debate na TV com um blazer escuro e uma camisa branca com laços. Não demorou muito para que milhares nas redes sociais notassem a semelhança com a roupa usada por Margaret Thatcher em um famoso discurso em rede nacional na década de 1980. Não era uma coincidência. Nos últimos anos, a nova primeira-ministra do Reino Unido vem usando fotos e citações para se comparar com a famosa dama de ferro.
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Se Margareth Tatcher não é unanimidade entre os britânicos, ainda é muito querida entre os membros do Partido Conservador que deram a Truss a vitória numa disputa interna com o ex-ministro da Economia, Rishi Sunak. A atual ministra das Relações Exteriores teve 81.326 mil votos, contra 60.399 mil do concorrente. A eleição era pela liderança do Partido Conservador, que atualmente tem o comando do governo. Isso quer dizer que o líder eleito também será o primeiro-ministro.
Antes dela, Boris Johnson e Theresa May também tinham chegado ao poder de forma indireta, depois da renúncia de seus antecessores. Ambos, no entanto, convocaram eleições gerais e se mantiveram no poder com o voto popular.
Liz Truss não sinalizou essa possibilidade. Se decidir seguir os passos de May e Johnson, ela veria os Trabalhistas voltarem a Downing Street, depois de 12 anos. As pesquisas apontam a oposição favorita com média de 10 pontos a mais que os Conservadores.
Metamorfose ambulante
As próximas eleições gerais terão que ocorrer até janeiro de 2025. Liz Truss tem 2 anos e 4 meses pra reveter essa tendência. Aos integrantes do partido e à bancada conservadora na Casa dos Comuns, ela já mostrou que sabe se adaptar. A nova premiê britânica cresceu em uma casa com pais que ela definiu como "de esquerda", mas acabou virando Liberal Democrata e terminou no Partido Conservador.
Mary Elizabeth Truss nasceu em Oxford, em 1975. Mudou-se com a família para a Escócia e depois para Leeds, na Inglaterra pra voltar à terra natal pra cursar a universidade de Filosofia, Economia e Política, na famosa e disputada Universidade de Oxford, onde se forma boa parte da elite inglesa.
Ainda adolescente, participou ao lado da mãe de manifestações públicas pelo desarmamento nuclear. Agora, como primeira-ministra, vai comandar o quinto maior arsenal do planeta. Aos 19 anos, quando ainda fazia parte dos Liberais Democratas, fez um discurso na conferência do partido defendendo a abolição da monarquia. Aos 47, reverenciou a Rainha Elizabeth II que, formalmente, tem que apontá-la como chefe do governo. A monarca é a chefe de Estado.
Nas última semanas, também veio à tona um trecho de um livro em que ela escreveu juntamente com outros 3 colegas parlamentares do Partido Conservador. Em capítulo atribuído a ela, há uma frase em que os britânicos são descritos como "um dos trabalhadores mais preguiçosos do mundo". Liz Truss negou ter sido a autora.
Brexit
Na campanha para o prebiscito que decidiu pela saída da União Europeia, Truss, já no partido Conservador, fez campanha para que o Reino Unido continuasse no bloco. Afirmou que o divórcio "seria um desastre". Recentemente, mudou de ideia e agora é um fervorosa defensora das "inúmeras oportunidades trazidas pelo Brexit".
"Eu estava equivocada", ela disse. Se entre os membros do Partido Conservador, a saída da UE ainda tem apoio majoritário, 52% do público britânico acreditam que foi a decisão errada, segundo pesquisa publicada em julho pelo instituto NatCen Social Research.
Amigos x inimigos
Em outro aceno para o público interno, respondeu a uma pergunta sobre o presidente francês e afirmou que "não sabe se ele é um amigo ou um inimigo do Reino Unido". Dias depois, Emmanuel Macron respondeu: "É muito sério quando um líder britânico tem dúvidas sobre a amizade entre nossos países. A França vai continuar sendo uma aliada do Reino Unido, com e apesar de seus líderes".
Na mesma estratégia de agradar àqueles que garantiram a sua eleição, Truss disse que a chefe de governo da Escócia, Nicola Sturgeon, gosta de chamar a atenção e "deveria ser ignorada". O Partido Nacional Escocês, liderado por Sturgeon, tem a maioria das constituintes escocesas e defende um novo plebiscito pra decidir se deixa de fazer parte do Reino Unido.
Brasil
O Reino Unido é apenas o vigésimo na lista de maiores parceiros comerciais do Brasil. A nova primeira-ministra é uma defensora dos acordos de comércio que agora o Reino Unido pode firmar com outros países sem depender da União Europeia. Maior economia da América Latina, o Brasil está entre as prioridades.
Foi sob o comando de Truss no Ministério das Relações Exteriores e já depois da renúncia de Boris Johnson, em que ela desponatava como favorita pra assumir o governo, que o Reino Unido fez uma rara manifestação pública sobre a crise política no Brasil. A Embaixada britânica em Brasília divulgou uma nota em que demonstrou apoio ao sistema eleitoral brasileiro por "por sua celeridade e eficiência".
Futuro
Liz Truss vai herdar um governo que perdeu não apenas em aprovação, mas em credibilidade, depois dos sucessivos escândalos protagonizados por Boris Johnson. Ao contrário do seu antecessor que surfava nas promessas do Brexit, ela agora terá de encarar a realidade do divórcio que começa a bater à porta.
Além disso, há a crise de energia, que praticamente dobrou o preço das tarifas de gás no Reino Unido. Controlar o aumento do custo de vida e a inflação que acaba de ultrapassar 10% será o primeiro grande desafio de Liz Truss. Em paralelo, ela precisará manter o tom elevado contra Putin, não só no discurso, mas em ajuda concreta à Ucrânia.
Ela não quer ser comparada a Boris Johnson e percebida como aquela que diminuiu os esforços contra a Rússia. Johnson foi o líder mais próximo a Voldomyr Zelenskyy. Virou nome de rua em Kiev, mas deixa o governo "entre os mais escandalosos primeiros-ministros do século", segundo o historiador Anthony Seldon, biógrafo dos premiês britânicos desde Margaret Thatcher.
Liz Truss tem experiência em vários setores do governo e em diferentes governos. Teve habilidade política pra fazer parte do time dos últimos 3 primeiros-ministros. Já ocupou os Ministérios da Justiça, do Tesouro, Comércio Internacional e Relações Internacionais. Desde a era David Cameron, ela já tinha destaque no partido. Mas vai enfrentar tempos e circunstâncias bem diferentes dos seus antecessores e de Margaret Thatcher, cujos valores sugere incorporar. O mundo e principalmente os britânicos estão prontos pra julgá-la.,