Demanda por soluções consensuais surpreende e TCU quer ampliar equipe
Presidente do Tribunal de Contas da União concedeu entrevista ao SBT News
Guilherme Resck
A procura pelo trabalho da Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos (SecexConsenso) do Tribunal de Contas da União (TCU), por parte dos ministérios, surpreendeu a Corte e, agora, o presidente, ministro Bruno Dantas, trabalha para ampliar a equipe da área.
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"O nosso diferencial é exatamente uma mediação técnica. É a nossa capacidade de buscar soluções dentro da lei, soluções que contemplem o interesse público. Nós não queremos fazer um acordo de qualquer jeito, a qualquer custo, queremos acordos que sejam benéficos para a sociedade brasileira", complementou o ministro, em entrevista concedida ao SBT News nesta 5ª feira (22.jun).
A SecexConsenso foi criada em janeiro deste ano. A resolução consensual de conflitos é uma das prioridades da gestão de Bruno Dantas. A secretaria tem a competência de desenvolver, propor, sistematizar e avaliar propostas para a solução acordada de controvérsias no Brasil.
"Quando eu assumi a presidência do TCU, em dezembro do ano passado, eu já tinha acumulado aqui oito anos de história na Corte, e a gente tinha uma compreensão de que era preciso reinventar um tipo de atuação do tribunal, que durante muito tempo foi importante, mas que gerou uma certa paralisia dos órgãos e das agências federais", afirmou o presidente do tribunal, respondendo sobre qual a importância da SecexConsenso.
"Eu me refiro especificamente há uma hipertrofia dos órgãos de controle, Tribunal de Contas, Ministério Público, que se por um lado é importante para combater a corrupção, para combater os desvios, por outro, acaba levando para uma vala comum os bons gestores. E esses bons gestores precisam de espaço, de liberdade para propor soluções criativas que atendam adequadamente o interesse público na qualidade dos serviços que são prestados à população", prosseguiu.
Durante muito tempo, segundo o ministro, falou-se no país de "apagão das canetas, fenôneno que se dá quando um gestor público, um presidente de agência, um diretor de agência reguladora deixa de tomar uma decisão importante para a população, com medo de lá na frente ser responsabilizado por um órgão de controle". É observando esse cenário que o TCU resolveu criar a SecexConsenso.
"A gente considerou que o tribunal deveria, sim, manter atuação zelando pela legalidade, buscando a condenação dos que se distanciam da aplicação da lei, mas também ter um espaço de diálogo com prefeitos, com governadores, com ministro de Estado, com agências reguladoras, para encontrar muitas vezes um ponto de equilíbrio entre o que os auditores consideram como o mais acertado e o que o ministro, por exemplo, considera mais acertado para política pública".
No dia 7 de junho, o TCU homologou o primeiro acordo de solução consensual desde a implementação da SecexConsenso. O processo refere-se a um contrato do setor de energia. "Esse caso é muito interessante porque ele significa um impacto nas contas de energia de todos os brasileiros de 0,5%", fala Bruno Dantas.
"O brasileiro pode imaginar 'poxa, mas a minha conta de energia vai baixar em 0,5%, isso é muito pouco', mas isso diz respeito a um único contrato que o Governo Federal tinha assinado com algumas empresas geradoras de energia termelétrica no auge da crise energética, em 2020, 2021, quando o governo tinha medo de um apagão", acrescenta.
De acordo com o ministro, o TCU fez um acordo que possibilitou a flexibilização do contrato que impactava R$ 250 milhões por mês nas contas de luz dos brasileiros.
O Tribunal de Contas da União funciona, num caso como esse, como um mediador técnico. São colocadas duas equipes para atuar, sendo uma para construir o acordo e a outra trata-se daquela que fiscalizaria o caso se o processo chegasse ao tribunal. "Esta equipe vai colocando os problemas que a proposta de acordo teria e aí vai se chegando a um meio termo dentro da Constituição e das leis conforme uma fórmula equilibrada que atenda o interesse público", explica Bruno Dantas.
"Eu gosto de dizer muito que é óbvio que o Estado representa todos nós, mas muitas vezes, quando se fala de contratos com empresas privadas, o interesse do Estado, quando é levado a ferro e fogo, isso leva uma judicialização. É o que nós chamamos de risco jurídico. E aquilo pode passar anos no Judiciário, gerando prejuízo, porque a população simplesmente não vai receber aquele serviço como foi contratado".
Outros casos
Segundo o presidente do TCU, quando a SecexConsenso foi idealizada, a Corte imaginava "que ela começaria devagar, para ir se estabelecendo. E aí, com o tempo, os governos iriam se apercebendo de que essa é uma boa ferramenta". Porém, "o que aconteceu foi que essa secretaria virou uma 'coqueluche', e todos os ministros do governo tem demandas para essa nova secretaria".
A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) encaminhou dois casos a ela, sendo um do Aeroporto Internacional de Belo Horizonte, em Confins, e outro do Aeroporto Internacional de Cuiabá. "Pedindo a nossa mediação para a reformulação do contrato", fala Bruno Dantas. A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), por sua vez, enviou duas circunstâncias envolvendo ferrovias, em que há uma necessidade de repactuação do caderno de investimento delas.
Existem ainda quatro casos do Ministério dos Transportes "na iminência" de serem enviados para a secretaria, referentes a rodovias, "que estão em condições lamentáveis", ressalta. Outros dois casos de aeroportos -- o de Viracopos, em Campinas (SP), e o do Galeão, no Rio de Janeiro -- deverão ir para a SecexConsenso em breve. "O aeroporto do Galeão é a porta de entrada para turistas estrangeiros e para cargas internacionais no estado do Rio de Janeiro. Hoje, praticamente toda o transporte internacional de passageiros e transporte internacional de cargas vai para São Paulo e para Viracopos. E isso, claro, acaba enfraquecendo o Rio de Janeiro como um ator nacional", afirma o ministro.
Atuação internacional
O Tribunal de Contas da União tem "uma atuação internacional muito forte", de acordo com Bruno Dantas. "O Brasil foi eleito e o TCU foram eleitos no ano passado, em novembro, na assembleia geral da Organização Internacional das Instituições Superiores de Controle, presidente dessa organização que congrega 195 países do mundo e que tem status de órgão consultivo da ONU. Isso mostra o prestígio do Brasil, isso mostra a qualidade técnica dos auditores federais de controle externo do Brasil, isso mostra o quanto a comunidade internacional nos tem alta conta", completa.
Como exemplo de trabalho do TCU que é referência internacional, o presidente da Corte cita o desenvolvimento, em curso, de uma auditoria global nas políticas de combate às mudanças climáticas. "Nós estamos desenvolvendo uma plataforma eletrônica em conjunto com outros 19 países, que aí envolve Estados Unidos, Finlândia, Canadá, Reino Unido, Noruega, Indonésia, Quênia, Marrocos, são muitos países, são 20 países no mundo, em todos os continentes, e nós a estamos desenvolvendo para que o cidadãos no mundo inteiro possam comparar a performance dos seus países em temas relacionados ao combate às mudanças climáticas", detalha.
Chamada ClimateScanner, ela conterá dados dos governos das diversas nações auditados pelos Tribunais de Contas do mundo todo. O desejo dos participantes do projeto é lançar a plataforma-piloto na COP 28, em Dubai, em novembro deste ano. Depois, será estendido para os outros países.
Confira a íntegra da entrevista: