Ministério Público mira na "cadeia de comando" de golpistas do 8/01
Autoridades, militares e políticos são alvos de denúncias a serem enviadas ao STF
Ricardo Brandt
Nas últimas semanas, a equipe do Ministério Público Federal (MPF) que atua nos processos contra os golpistas do 8 de janeiro tem aprofundado as análises de provas, levantamento de dados, cruzamento de informações sobre a participação de autoridades, políticos, militares, entre outros, para início de uma nova fase de denúncias criminais ao Supremo Tribunal Federal (STF).
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Desde que entregou as 1,3 mil primeiras acusações formais, contra os golpistas que participaram das invasões e depredações nos prédios dos Três Poderes, no 8/1, ou que estavam acampados na frente dos quartéis do Exército, a equipe do MPF trabalha nas denúncias contra as autoridades omissas e contra os financiadores.
O objetivo é identificar e buscar a punição da "cadeia de comando" dos atos golpistas. Nessas frentes de investigação, estão figuras conhecidas como o ex-ministro da Justiça do governo Jair Bolsonaro (PL) e então secretário de Segurança do Distrito Federal (DF) no dia dos crimes, Anderson Torres, o ex-comandante da Polícia Militar (PM) do DF Fábio Vieira, o ex-secretário interino de Segurança do DF Fernando Oliveira, entre outros.
"Vamos agora buscar a culpabilidade, principalmente, da cadeia de comando dos atos do 8 de janeiro. Onde está esse comando, de onde isso surgiu?", afirmou o subprocurador-geral da República Carlos Frederico Santos, coordenador do grupo de trabalho montado pela Procuradoria Geral da República (PGR) para os processos do 8/1.
"Para que possamos buscar responsabilizar aquelas pessoas que estão por trás dessa situação toda, ou se omitindo, ou financiando aquele ato do dia 8."
Autoridades
O núcleo das autoridades que tiveram participação por ação ou omissão nos atos e na segurança da Esplanada dos Ministérios é o próximo a ser denunciado. Na sequência, virão as acusações contra os financiadores. Ambas, fases consideradas mais complexa das quatro, pela PGR, por envolver quebras de sigilos, rastreamento do dinheiro, políticos, etc.
No grupo de autoridades, o MPF analisa, entre outros, o papel dos agentes de segurança que atuaram, ou deixaram de atuar, no 8/1 e nos acampamentos golpistas, em frente aos quartéis.
O papel dos militares do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), entre eles, o ex-ministro general Gonçalves Dias - segurança pessoal e braço direito do presidente, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), também está sob análise nesta etapa, segundo apurou o SBT News.
"Temos que saber por que a Polícia Militar e a Inteligência não funcionaram. Se elas tivessem funcionado, não teria ocorrido dia 8", Carlos Frederico Santos, subprocurador-geral da República.
A equipe da PGR vai apontar nas acusações se o "apagão da segurança e da inteligência" no 8/1 e nos dias que o antecederam, possibilitando a tomada do Planalto, do Congresso e do Supremo pelos golpistas, apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, foi o provocado - portanto, intencional - ou fruto de mal planejamento ou por inoperância estrutural.
Ações penais
As denúncias criminais do MPF são os pedidos de abertura de processo penal na Justiça, que tornam os investigados nos inquéritos em réus.
O MPF apresentou, no primeiro pacote, 1.390 acusações contra os golpistas que estavam em Brasília, no dia 8 de janeiro, e os que foram presos no dia seguinte, nos acampamentos nos quartéis, em Brasília e em outros estados. Eles integram os dois primeiros núcleos alvos das denúncias.
O MPF dividiu os golpistas em quatro núcleos de atuação nos crimes: os executores das invasões e depredações; os incitadores e autores intelectuais (a maioria deles, de acampados próximos dos QGs do Exército); os financiadores; e as autoridades que agiram por omissão ou ação.
Nas denúncias já entregues ao STF, em março ainda, a PGR já havia pedido que o GSI entregasse as imagens dos circuitos internos do Planalto para os processos. O que foi retido até o fim de abril, quando parte do conteúdo foi revelado.
Um dos ex-integrantes do GSI alvo das investigações está na lista de testemunhas pedidas pela PGR para serem ouvidas, como parte das testemunhas de acusaçãos contra os autores das invasões e depredações no 8/1. José Eduardo Natale de Paula Pereira, que aparece nos vídeos que eram guardados a sete chaves pelo Planalto interagindo e entregando água aos golpistas, foi arrolado em março nos processos por sua atuação na prisão dos alvos.
O STF tem analisado os pedidos de abertura de ação penal no Plenário Virtual, em que os ministros votam pela internet.
Foram abertos até agora 100 processos penais e outros 200 devem ser abertos. A maioria dos ministros votou pela conversão desse segundo pacote de 200 denúncias. A sessão, iniciada no dia 25, vai terminar às 23h59 de hoje.
Nesta 4ª feira (3.mai), começa a sessão virtual de análise do terceiro pacote de denúncias contra mais 250 golpistas. Todos esses casos são de integrantes dos núcleos de executores e incitadores e autores intelectuais.
Golpistas de 8/1 presos:
- 2.151 pessoas presas em flagrante entre os dias 8 e 9 de janeiro
- 293 estão presos atualmente (81 mulheres e 212 homens)
A PGR afirma nas denúncias que os golpistas agiram "em conjunto e unidade de desígnios".
"Os denunciados teriam se associado, de forma armada, com o objetivo de praticar crimes contra o Estado Democrático de Direito; tentado, com violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos Poderes Constitucionais; tentado, com violência ou grave ameaça, depor o governo legitimamente constituído; destruído e concorrido para a destruição, inutilização ou deterioração de patrimônio da União, com violência ou grave ameaça e emprego de substância inflamável, gerando prejuízo; e, deteriorado e concorrido para a deterioração de bens especialmente protegidos por ato administrativo."
Réus
São militares, lideranças políticas, partidários, empresários, agricultores, professores, donas de casa. A lista dos primeiros réus dos processos do Supremo Tribunal Federal (STF) contra os atos envolvidos no 8 de janeiro é longa e variada.
Com base nos elementos de provas apresentados pelo MPF e as defesas, a fase de instrução da ação penal terá novas diligências para levantamento de provas, oitiva de testemunhas, tanto de defesa, como da acusação, e dos réus, perícias, quebras de sigilos, entre outras.
Os relatórios da Polícia Legislativa do Senado, os relatórios do Ministério da Justiça, da Polícia Federal, da Secretaria de Segurança do DF, documento do Iphan sobre os danos ao patrimônio histórico, dados de veículos, entre outros, sobre o 8/1, os boletins de prisão em flagrante, ficha de antepassados, embasam as acusações.
No seu voto, Moraes destacou que "os crimes devem ser rigorosamente apurados e seus responsáveis, todos eles", punidos. No caso dos executores, o MPF pediu penas que podem chegar a 30 anos de prisão, segundo Carlos Frederico.
Defesas
As defesas têm apresentado suas considerações iniciais nos processos do STF. Além de negar a existência de provas de autoria dos crimes contra seus réus, a maioria contesta a competência do Supremo para julgar os processos, entre outras coisas.
Argumentos que ganharam força com os votos dos ministros André Mendonça e Kassio Nunes Marques, nos primeiros processos, que foram contra o entendimento do relator, Alexandre de Moraes - seguido pela maioria. Ambos contestaram a competência do STF e apontaram a primeira instância como esfera natural para os julgamentos.
Ambos também apontaram a falta de provas contra os denunciados que não estiveram no 8/1 nas invasões aos prédios dos Três Poderes, em Brasília. Nunes foi contra a abertura de ação penal contra os 50 primeiros acusados do Inquérito 4921, contra os incitadores e autores intelectuais.