Frente ampla de Lula não dá garantia de apoio no Congresso
Para especialistas, apesar de presidente trazer Centrão para Esplanada, ainda há riscos à governabilidade
A reunião ministerial convocada para alinhar os discursos do governo, na última 6ª feira (6.jan), marcou o fim da primeira semana de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na presidência da República. Na Esplanada escolhida pelo petista, é possível perceber a estratégia para construir uma frente ampla e atrair a ala mais ao centro da política. Dos 37 ministros, dois são do União Brasil, três são do PSD e outros três, do MDB. Essa configuração, porém, pode não ser suficiente para garantir apoio ao governo no Congresso Nacional.
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"A bancada de esquerda no Congresso não tem nem de longe o número de votos necessários para aprovar leis, muito menos emendas constitucionais. Lula sabe disso. Então, é inevitável a tentativa de atrair o Centrão para o governo, para garantir que ele tenha manobra para aprovar seus projetos no Legislativo", avalia Caio Barbosa, doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP).
"A indicação de ministro de determinado partido significa que Lula espera algo em troca. Além do bom desempenho na pasta, o governo quer votos do partido nas pautas do Congresso", pontua.
Acordos
Ao fim da reunião desta 6ª, Lula afirmou que algumas indicações do alto escalão foram resultado de "acordo político". "Não adianta a gente ter o governo mais tecnicamente formado em Harvard e não ter votos na Câmara dos Deputados", revelou o presidente.
Concessões fazem parte da necessidade de governabilidade, mas sempre há riscos, explica Barbosa. Um exemplo disso é a escolha da ministra do Turismo, Daniela Carneiro, do União Brasil, que é acusada de ter ligação com milicianos. "É provável que surjam outros casos problemáticos em outros lugares, eventualmente até de corrupção, o que certamente causaria um forte abalo no governo, dado todo o estigma que o PT tem com essa questão", ressalta o cientista político.
Outro lado
A sensação na base aliada de Lula é de que, embora esteja no governo, o União pode trair os desejos da esquerda. Tal cenário está espelhado na disputa à presidencia do Senado, na qual os aliados do governo esperam reconduzir Rodrigo Pacheco (PSD). No entanto, o PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), vai lançar a candidatura de Rogério Marinho. O líder da legenda, Carlos Portinho, afirmou que tem dialogado para ter o apoio da bancada do União.
"Se olhar o perfil dos senadores eleitos pelo União, tem gente muito qualificada, muito competente e mais alinhada às propostas liberais e com a nossa posição de centro-direita", disse Portinho, ao SBT News.
Para Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotivas, tudo vai depender da capacidade do presidente Lula de manter os partidos aliados na base e de manter a negociação partidária. "O desafio principal está numa relação mais próxima com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira. Isso se dá porque ele [Lira] não se sente inteiramente contemplado nessa composição ministerial", diz.
"Lula com certeza está entre os presidentes com a maior habilidade de negociação com o Congresso Nacional, como o seu histórico mostrou. De fato o Centrão provoca uma negociação constante pra isso, mas mostrou também que tem condições de aprovar as principais reformas necessárias, inclusive aprovou agora a PEC da Transição", pontua Meirelles.