Mercado de trabalho nos Estados Unidos indica nova alta de juros
Relatório de geração de empregos aponta 315 mil novas vagas criadas em agosto; desemprego fica maior
O número que fechou a semana deixou abertos as possibilidades e os questionamentos sobre a política econômica dos Estados Unidos. Mais especificamente, sobre os prognósticos para a taxa de juros, decidida pelo Federal Reserve (FED), o Banco Central americano. A próxima reunião sobre os juros é agora, em setembro.
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Trata-se do relatório sobre geração de empregos do mês de agosto, o payroll. O documento do Departamento do Trabalho apontou criação de 315 mil vagas no país, resultado acima do esperado pelo mercado (em média, a expectativa era por 300 mil postos). O indicador excetua o setor agrícola. Mas outro componente do índice chamou até mais atenção do que o número macro em si: a taxa de desemprego subiu de 3,5% para 3,7%.
Passo a passo
O que a princípio poderia ser considerado extremamente favorável -- afinal, está se falando em geração de empregos depois inclusive da paradeira puxada pela pandemia, o que "só pode ser bom" --, na ótica do meio financeiro é passível de alguma contestação. Os analistas do mercado enxergam na força da economia, que permite criar postos de trabalho, um sinal de que diante de atividade intensa não há praticamente chance de que o Fed não aumente os juros no encontro de 21 de setembro, para segurar a inflação crescente. Até ser vista como a providência devida diante da ameaça dos preços, tudo bem. O nó da questão é que a mesma elevação de juros pode ser que -- e é muito provável que -- reduza também o giro da própria vida econômica, e isso não é bom. "Tudo vai depender dos dados até a reunião", analisa Tatiana Nogueira, economista da XP. E faz mesmo sentido. O principal indicador da inflação nos Estados Unidos, o índice de preços ao consumidor, CPI numa tradução livre, sai no meio do mês. E dessa combinação de índices vai depender a calibragem da subida de juros que os economistas já consideram inevitável. O que se busca responder é se a alta será de 0,5 ou 0,75 ponto percentual.
Passo à frente
Já o número a maior do desemprego (avanço de 3,5% para 3,7%), que também surpreendeu, carece de uma olhar mais a fundo. A primeira impressão é sempre negativa, diante de um indicador que mexe com a vida de muita gente e, igualmente, com a economia do país. No caso deste dado divulgado "dentro" do payroll , vale uma observação em particular. Até por força da plenitude da pandemia, muita gente simplesmente havia deixado de procurar emprego. O fenômeno no Brasil também é conhecido, sob o nome de o grupo dos "desalentados": aqueles que desanimaram de tanto procurar emprego sem encontrar que se retiraram da procura. "O dado do desemprego não é essencialmente ruim", pontua Danny Rappaport, sócio da Investport Multi Family Office. "O que está se passando não é, em grande medida, gente que foi mandada embora, que perdeu emprego. É que muita gente está voltando a buscar, confiando numa economia mais forte e em melhora das condições de vida." Por esse ponto de vista, o economista não tem dúvidas em apontar que o indicador, neste cenário, é uma sinalização positiva.
" A volta de mais gente a procurar trabalho vai também reduzir a pressão sobre os salários, o que implica menor pressão sobre os preços, menos inflação. É como se com o tempo fossemos voltando ao normal", diz Danny Rappaport, sócio da Investport.
Equilíbrio distante
O cruzamento dos pontos de vista revela-se apropriado. A questão chave é, afinal, equilíbrio, calibragem, tomada de decisão e consequências. Se o mercado de trabalho aponta ambiente positivo, há que se atentar para a massa de salários que não está, ainda, totalmente em linha com o objetivo de conter a alta de preços. De outro lado, o timing tem de ser ajustado a todo tempo. "O efeito dos juros sobre a economia é sempre defasado", rememora Tatiana Nogueira. Como que a dizer "os resultados das recentes puxadas nos juros podem não ter sido sentidos totalmente até agora". E exagerar na dose pode prolongar a desaceleração econômica por mais tempo e de forma mais intensa do que o suportável.
Por ora, as sinalizações são mesmo dúbias. É só olhar a geração de empregos nos Estados Unidos em julho (528 mil postos) e a atual, de agosto (315 mil postos). É um tombo. Mas um tombo para cima.
Traduzindo o pacote de números e sinalizações, as bolsas americanas que ensaiaram uma alta até certo ponto por encontrar uma "ideia de desaceleração" no mercado de trabalho, que ajudaria a frear a alta de juros, fecharam no vermelho ao dar como mais concreta a possibilidade de aumento de 0,75pp pelo Fed. No fechamento, Dow Jones -1,07%; S&P 500 -1,07%; e Nasdaq -1,31%. No Brasil o Ibovespa também oscilou, mas no final dos trabalhos descolou dos EUA pra subir 0,42% aos 110.864 pontos. Dólar em queda de 1,02% cotado a R$ 5,185 para venda.