Justiça decide que indulto de Bolsonaro a PM's condenados por massacre do Carandiru é constitucional
O indulto que livraria 74 policiais militares envolvidos no Massacre do Carandiru foi assinado em dezembro de 2022
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) decidiu, por maioria de votos, que o indulto concedido pelo então ex-presidente Jair Bolsonaro aos policiais militares condenados pelo massacre do Carandiru é constitucional. A votação ocorreu nesta quarta-feira (7).
Por 18 votos a 6, o entendimento da Justiça foi o de que o perdão concedido pelo chefe do Executivo é "discricionário". A ação corre em segredo de Justiça.
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"Na data de ontem (7), o Órgão Especial julgou o incidente de arguição de inconstitucionalidade criminal. Por maioria de votos (18x6), foi rejeitada a arguição e determinado que os autos retornem à 4ª Câmara Criminal do TJ-SP para conclusão do julgamento", diz o TJ-SP em nota.
O indulto que livraria 74 policiais militares envolvidos no Massacre do Carandiru, cujas penas somam mais de 600 anos de prisão, foi assinado em dezembro de 2022, poucos dias antes de Jair Bolsonaro encerrar seu mandato. No entanto, a medida foi suspensa por decisão da ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF).
O STF colocou o tema em pauta, mas ainda não chegou a uma decisão final. A Procuradoria Estadual criticou a iniciativa dos magistrados paulistas, classificando-a como "política".
O Massacre do Carandiru, ocorrido durante uma rebelião no presídio em 1992, resultou na morte de 111 detentos.
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Relembre o caso
Em outubro de 1992, policiais reprimiram uma rebelião prisional, resultando na morte de 111 detentos. Com penas que variavam entre 48 e 624 anos de prisão, 73 policiais foram condenados.
Pelo texto assinado por Bolsonaro, receberam o perdão da pena "agentes públicos que integram os órgãos de segurança pública de que trata o art. 144 da Constituição e que, no exercício de sua função ou em decorrência dela, tenham sido condenados, ainda que provisoriamente, por fato praticado há mais de trinta anos, contados da data de publicação deste Decreto, e não considerado hediondo no momento de sua prática".
Dessa forma, os envolvidos no caso seriam beneficiados, uma vez que o fato ocorreu há mais de 30 anos e, na época, homicídio não era considerado crime hediondo — classificação que só viria a ser aplicada a partir de 1994.
Em janeiro de 2023, a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) na ocasião, ministra Rosa Weber, decidiu suspender o decreto. No despacho, ela explicou que, para a concessão do indulto, vale a data em que o decreto foi assinado, e não a data em que os crimes foram cometidos.
"O indulto aos agentes públicos envolvidos no Massacre do Carandiru pode, em princípio, configurar transgressão às recomendações da Comissão, no sentido de exortar o Brasil à promoção da investigação, do processamento e da punição séria e eficaz dos responsáveis. No caso, a clementia principis, em juízo de estrita delibação, resultaria na extinção da punibilidade dos possíveis envolvidos e, consequentemente, no encerramento de todos os atos estatais voltados à apuração dos fatos, à identificação dos responsáveis e à aplicação das respectivas reprimendas", diz trecho da decisão da ministra.
Até hoje, nenhum dos envolvidos no caso foi preso. Em 2001, o comandante da PM na ocasião, Ubiratan Guimarães, foi condenado a 632 anos pela morte de 102 presos. Cinco anos depois, contudo, Guimarães foi eleito deputado, julgado novamente e absolvido. Ele foi assassinado no mesmo ano.
Posteriormente, em 2013 e 2014, outros cinco júris foram realizados, culminando na condenação de 74 policiais pelo homicídio de 77 detentos — com penas que variaram de 48 a 624 anos de reclusão. Em 2018, o Tribunal de Justiça de São Paulo anulou as condenações, mas a decisão foi revertida no ano passado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Atualmente, 69 dos envolvidos estão vivos e todos respondem em liberdade.
Massacre do Carandiru
O Massacre do Carandiru foi um dos episódios mais violentos da história do sistema penitenciário brasileiro. Ocorreu em 2 de outubro de 1992, no Pavilhão 9 da Casa de Detenção de São Paulo, popularmente conhecida como Carandiru. A ação resultou na morte de 111 detentos e envolveu uma intervenção da Polícia Militar para conter uma rebelião que havia começado entre os presos.
Na época, a Casa de Detenção de São Paulo, parte do Complexo Penitenciário do Carandiru, era a maior prisão da América Latina e abrigava cerca de 8 mil detentos, bem acima de sua capacidade.
Uma briga entre detentos no Pavilhão 9 evoluiu para uma rebelião. A direção da prisão chamou a PM para controlar a situação. Cerca de 300 policiais, sob o comando do coronel Ubiratan Guimarães, invadiram o pavilhão. A ação da PM foi extremamente violenta e desproporcional.
Os policiais abriram fogo contra os detentos, muitos dos quais estavam desarmados e sem oferecer resistência.
As investigações posteriores revelaram que a maioria dos presos foi morta por tiros, muitos deles à queima-roupa, e que não houve baixas entre os policiais, o que levantou suspeitas de execuções sumárias.