Covid longa: tire suas dúvidas sobre os efeitos prolongados do coronavírus na saúde
Estudo internacional com participação brasileira mostra que vírus da Covid-19 pode atingir todos os órgãos de uma pessoa que já foi infectada. Saiba como cuidar
A pandemia da Covid-19, encerrada oficialmente no dia 5 de maio de 2023 pela Organização Mundial da Saúde (OMS), alterou não só a vida de todos durante as fases mais agudas – com isolamento e uso de máscara – mas trouxe efeitos a longo prazo para muitas pessoas. Isso porque, para uma proporção relevante dos pacientes, a covid alterou condições de saúde para além do prazo comum da infecção. Eles desenvolveram a chamada covid longa.
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Em levantamento feito pelo Google Trends, é possível verificar que o interesse de busca pelo termo teve um pico em fevereiro de 2022, mas se mantém relativamente elevado, com algumas oscilações ao longo do tempo.
Covid longa pode afetar todos órgãos, diz estudo
Um estudo sobre o tema, que contou com pesquisadores brasileiros e foi publicado em 2023 na Science Translational Medicine, descobriu que a infecção pelo SARS-CoV-2 pode prejudicar a função das mitocôndrias em diversos tecidos do organismo e a supressão dos genes (um mecanismo capaz de silenciar, quando necessário, a expressão dos genes). Isso significa que ele pode criar um efeito global e prolongado em todos os órgãos da pessoa infectada.
Um dos integrantes do levantamento, o professor do Instituto de Biologia da Universidade de Campinas (Unicamp), Pedro Moraes-Vieira, disse à Agência Fapesp que, neste trabalho, foi verificado que o processo inflamatório na Covid-19 não ocorre apenas nas células do sistema imune ou no pulmão, como inicialmente se pensava.
"A disfunção mitocondrial pode ocorrer em todo o organismo e, entre as consequências, está o aumento da resposta inflamatória em pacientes graves”, disse
O que é Covid longa?
A pesquisadora em Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Margareth Portela, define a covid longa como os sintomas experimentados a partir de quatro semanas depois de se recuperarem dos estágios iniciais da infecção. É o mesmo critério adotado pelo Ministério da Saúde.
"A Covid-19 mudou a vida de algumas pessoas. Uma pessoa entrevistada pela pesquisa relatou que antes fazia duas faxinas por dia e agora não consegue mais pegar o ônibus para ir trabalhar pela fadiga", disse.
Sintomas
Portela, que está coordenando um estudo com 651 pacientes de Covid-19 que foram hospitalizados no Rio de Janeiro, elencou 6 sintomas principais, dentre os 30 pesquisados pela equipe. Ela ressalta que, nos questionários aplicados durante a pesquisa, houve pessoas que relataram que sintomas já existentes pioraram e outros passaram a existir após a covid.
- Fadiga;
- Mal-estar após esforço (Post-exertional malaise);
- Dor nas juntas;
- Comprometimento cognitivo - Problemas de memória e concentração (chamados de “névoa mental”);
- Ansiedade;
- Sensação de formigamento nos braços e pernas.
A pesquisadora disse que alguns pacientes também relataram disfunção erétil e mudanças no ciclo menstrual, mesmo que esses pontos não estivessem listados no questionário. A Biblioteca Virtual de Saúde da Fiocruz também levanta outros sintomas:
- Falta de ar ou dificuldade para respirar;
- Tosse persistente;
- Dor no peito;
- Palpitações no coração;
- Dificuldades na fala;
- Tontura ao se levantar;
- Depressão;
- Diarreia;
- Dor no estômago;
- Problemas do sono.
Como é feito o diagnóstico?
Pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o primeiro passo é procurar serviço de atenção primária de saúde em Unidades Básicas de Saúde (UBS's) e Unidades de Saúde da Família (USF). O diagnóstico é feito pelo histórico clínico do paciente, atendimento médico especializado, exames laboratoriais e de imagem, além de alguns testes, como os cognitivos. Margareth ressalta que a doença ainda é muito invisibilizada, o que dificulta diagnosticar a condição. "Para saber se você tem covid longa, é preciso descartar todas as outras opções possíveis", explica.
Como tratar?
Margareth ressalta que o ideal é ter uma abordagem multidisciplinar entre as especialidades médicas que possam fazer o tratamento. A fisioterapia também pode ser indicada, dependendo do caso. A especialista alerta que o exercício físico, em alguns casos, é potencialmente nocivo para recuperação do paciente. A própria Fiocruz inaugurou em 2023 o Centro de Covid Longa que faz monitoramento, avaliação multidisciplinar e reabilitação de indivíduos com sintomas persistentes. Além dele, outras universidades e centros de saúde, tanto públicos quanto privados, oferecem o serviço.
Ainda não há remédios específicos para condição, no entanto, o pesquisador da Unicamp explica que os tratamentos podem envolver a "restauração da função mitocondrial". "É justamente nesse ponto que vamos focar nos próximos estudos”, afirma.