Chuvas fortes não são mais evento imprevisível, diz especialista em futuro das cidades
Para Caio Esteves, cidades do RS precisarão ser reconstruídas em modelo adaptado ao clima extremo
A tragédia climática que deixou 161 mortos e afetou mais de 90% dos municípios do Rio Grande do Sul até esta quarta-feira (22) foi classificada como "imprevisível" por diversas autoridades locais. Mas Caio Esteves, urbanista especializado em futuro das cidades e autor do livro "Lugares futuros", eventos climáticos extremos não são mais imprevisíveis no Brasil.
"O histórico desses eventos precisa ser observado para criar formas de preparação para as cidades. Temos, inclusive, de olhar para novos eventos, que ainda não aconteceram", disse ao SBT News. Para o especialista, chuvas, inundações e secas, por exemplo, são previsíveis pela recorrência com que afetam o país.
O que se sabia
Como revelou o SBT Brasil, documentos da prefeitura de Porto Alegre, uma das cidades mais afetadas pelas cheias, mostraram que técnicos alertavam para a urgência da manutenção do sistema anti cheias da capital em 2018.
Em novembro de 2023, quando estado atravessou chuvas e inundações intensas, novamente surgiram alertas sobre os cuidados com a estrutura, que existe desde a década de 1970.
O cenário gaúcho é ainda pior atualmente. Há mais de 450 mil pessoas fora de suas residências, que ficam em áreas ainda afetadas pelas cheias. Especialistas apontam que boa parte das cidades afetadas podem ter de mudar de lugar diante do risco de novas chuvas fortes nos próximos anos.
"Precisamos entender como será a transição dos abrigos improvisados para os temporários e, de fato, a reconstrução das cidades [depois disso]", afirmou Caio Esteves. Para o urbanista, o cenário impõe a necessidade de um planejamento cauteloso para as novas moradias e comunidades, independentemente de onde elas forem construídas.
"Reconstruir as cidades nos moldes que elas eram antes dos impactos climáticos não faz sentido. Elas precisam ser mais adaptáveis a situações extremas, inclusive aquelas que ainda são imprevisíveis. Devem ser planejadas de forma mais adaptável ao clima"
Mudanças são percebidas
Nove a cada dez brasileiros disseram reconhecer os impactos das alterações climáticas, segundo uma pesquisa realizada pela PwC Brasil e pelo Instituto Locomotiva entre 26 de março e 10 de abril -- antes da tragédia gaúcha, portanto. Foram 1.500 entrevistados.
Para 80% deles, as chuvas fortes têm sido mais habituais nos últimos anos em suas cidades. Além disso, 18% disseram que suas casas já foram invadidas por enchentes.
Antes localizados ou imprevisíveis, os problemas derivados do clima se tornam cada vez mais uma preocupação nacional, como revelam os brasileiros.
A partir de agora, a formulação de políticas públicas deve partir do conhecimento obtido das tragédias que já aconteceram, segundo Esteves:
"Temos informações sólidas sobre eventos extremos passados. Precisamos olhar para elas de forma muito cuidadosa"