Em um mês, Bahia registrou mais mortes do que dez estados brasileiros em 2022
Bahia lidera o índice de violência em ações policiais no país há quatro anos; foram mais de 60 casos apenas em setembro
A onda de violência relacionada a ações policiais na Bahia ultrapassou dezenas de casos no mês de setembro. Até o fim desta semana, foram 68 registros de mortes ligadas a policiais -- durante operações ou em situações de conflito. O número dos últimos 30 dias supera o registrado durante todo o ano de 2022 em dez estados brasileiros, de acordo com comparação com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
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Entre as unidades da federação estão locais em diferentes regiões do país, como Alagoas, que registrou 50 mortes ligadas a policiais no ano passado, Distrito Federal (25), Paraíba (51), Santa Catarina (44) e Mato Grosso do Sul (45).
A lista ainda contempla os estados do Acre (19), Piauí (38), Rondônia (18), Roraima (10) e Tocantins (26). No mesmo período, a Bahia registrou 1.464 mortes ligadas a ações de policiais militares e civis. A população nos dez estados soma os 27,6 milhões de habitantes, frente aos 14 milhões da Bahia, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O sociólogo Arthur Trindade, professor da Universidade de Brasília (UnB) e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, destaca que entre as 50 cidades mais violentas no país, 19 são baianas, e atrela o problema a uma conduta deliberada da polícia no estado. "Há um cheque em branco para a polícia, onde a política de segurança vira a atividade policial. O que é um erro", diz.
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Entre pesquisadores, há também a avaliação de que o problema se dá nas vertentes econômica e social, ligado à organizações criminosas. "O que está acontecendo em Salvador e no estado da Bahia é uma atuação muito forte do crime organizado e uma incapacidade da polícia e da Secretaria de Segurança do estado da Bahia de fazer esse enfrentamento contra o crime organizado ao mesmo tempo em que precisa preservar vidas humanas", avalia Fernando Nascimento dos Santos, professor e pesquisador em direitos humanos e cidadania na UnB.
Santos ainda destaca que a população em comunidades periféricas -- que abrigam quase a totalidade das mortes na Bahia -- são as que mais sofrem com a conduta das forças de segurança. "A população brasileira pobre e negra acaba sendo duplamente vitimizada. Pelo clima organizado que se instala em comunidades pobres e pela atuação seletiva da polícia, quase sempre direcionada para esse perfil da população. E isso, numa perspectiva de direitos humanos, precisa ser repensado", diz.
Caminho para solução
Como forma de combate ao problema, especialistas em segurança consideram a necessidade em acionar órgãos ligados à justiça e à esfera federal. Para o cientista político, André Rodrigues, que coordena o Laboratório de Estudos sobre Política e Violência da UFF (Universidade Federal Fluminense), é preciso estabelecer diretrizes diretas à forças de segurança.
"Tem que ter recados claros para enquadrar as polícias. Com participação do Ministério Público, da Justiça, efetivamente. Corregedorias, substituição de comandos, renovação do efetivo policial e retirada de policiais criminosos da rua", considera.
Uma ação unificada é também apresentada como o caminho para o cientista político Paulo Niccoli Ramirez, da ESPM: "É preciso uma ação mais coordenada. As polícias usam a violência herdadas da própria ditadura de militar. A ação permanece violenta, mas é preciso atuar sem discursos políticos engajados para que esse quadro seja revertifdo".
A reportagem entrou em contato com a Secretaria de Segurança Pública do estado da Bahia para posicionamento e maiores informações relacionadas às mortes de setembro, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem. O Ministério da Justiça também não respondeu aos questionamentos de ações a âmbito federal para apoio ao estado.